Curiosamente, 2015 foi um ano morno em sua grande maioria. Muitas das obras lançadas tinham qualidade considerável, embora a maioria fosse esquecível, de certa forma. Foi só em 2016 que as coisas melhoraram, quando vários filmes do fim de 2015 foram lançados no começo do ano. De todos os estúdios, a Disney com certeza foi a mais agressiva: dois filmes da Marvel, “Avengers: Age of Ultron” e “Ant-Man“; um remake de animação clássica, “Cinderela“; duas animações da Pixar, “Inside Out” e “The Good Dinosaur”; e a cereja do bolo, o muito antecipado “Star Wars: The Force Awakens“.
Outros filmes aguardados incluem “The Hateful Eight“, o tal oitavo filme de Quentin Tarantino, “Terminator: Genisys” com o terrível retorno de Arnold a seu papel clássico e até mesmo a ressurreição indesejada — e agora eternamente odiada — do “Quarteto Fantástico“. No entanto, a real surpresa veio de obras que não tiveram muita atenção antes do lançamento: “Jurassic World” não está entre os melhores do ano, mas quebrou recordes de bilheteria; “Mad Max: Fury Road” retornou após 30 anos de limbo e impressionou a todos; enquanto “Creed” colocou Stallone de volta em seu chapéu de feltro e renovou uma franquia clássica. Alguns destes e outros estão aqui nos 15 Melhores Filmes originalmente lançados em 2015.
15. Trumbo (Trumbo – Lista Negra)
Bryan Cranston é um daqueles atores que depois de explodir com uma obra tipo “Breaking Bad” faz o espectador se perguntar: onde diabos esse cara esteve todos esses anos? Só depois dos 50 anos ele trouxe seu talento absurdo aos olhos do mundo e quase aos 60 recebeu sua primeira indicação ao Oscar. Infelizmente ela veio no mesmo ano em que Leonardo DiCaprio era o favorito. Dos outros atores indicados, Cranston era com certeza o que mais merecia. Seu personagem aqui é Dalton Trumbo, um roteirista da era de ouro de Hollywood que passa a ser perseguido por suas crenças políticas. Além de uma interpretação sensacional, “Trumbo” chama a atenção por contar uma história bem real, citando nomes, filmes e datas enquanto fala de um período negro do cinema americano. Ainda que não se iguale à genialidade sugerida de Dalton Trumbo, o filme certamente fica entre os melhores do ano.
14. The Revenant (O Regresso)
Msemo estando um pouco longe do posto de melhor filme do ano, “The Revenant” é facilmente um dos mais comentados, se não o mais. Afinal de contas, esse é o filme que sucedeu “Birdman“, o vencedor do grande prêmio do ano passado. Mas não foram os Oscars, o diretor Alejandro G. Iñarritu ou o cinegrafista Emmanuel Lubezki que geraram tanto alvoroço. Leonardo DiCaprio estava na linha de frente como o protagonista, entregando outra de suas atuações sérias na esperança de ganhar seu tão desejado Oscar. Neste quesito, devo dizer que não achei que o prêmio foi desmerecido, DiCaprio realmente está muito bem no papel. Da parte técnica menos ainda pode ser falado, pois quadro após quadro ela falha em decepcionar quando as imagens de Lubezki capturam a beleza natural dos cenários de azul e branco. Minha única crítica seria em relação à história, que por vezes parece um tanto arrastada e insuficiente para um filme longo como esse. Talvez com uma melhora nessa parte “The Revenant” poderia ter sido um dos melhores filmes da história.
13. In the Heart of the Sea (No Coração do Mar)
Este é provavelmente o filme mais subestimado do ano. Lançado relativamente pouco tempo antes de “Star Wars: The Force Awakens“, “In the Heart of the Sea” pode ser muito bem confundido com mais uma adaptação moderna do conto clássico de Moby Dick, mas na verdade as coisas são um pouco diferentes. No Século 19, uma baleia afundou um navio chamado Essex, evento que rendeu alguns frutos: o relato dos dois marinheiros sobreviventes resultou no livro “In the Heart of the Sea”; e o náufrago em si inspirou o livro “Moby-Dick”. Enquanto algumas opiniões apontaram o filme como sem foco, que se propõe a muito e faz pouco, eu achei que nele há uma história bem completa, que oferece mais do que é sugerido pela sinopse. Não é apenas uma caça à baleia, é como uma grande viagem que tem outras coisas relevantes além do trajeto.
12. Mission: Impossible – Rogue Nation (Missão: Impossível – Nação Secreta)
Esta foi outra surpresa, especialmente depois que o tão comentado “Mission: Impossible – Ghost Protocol” não passou de um filme de ação comum. Algumas cenas muito boas aqui e ali, efeitos especiais fracos e não muita empolgação fizeram o filme deixar a desejar. Fiquei surpreendido quando “Mission: Impossible – Rogue Nation” reciclou a história de seu predecessor, de certa forma, e entregou um resultado muito melhor. Tom Cruise parece estar mais em forma e as cenas de ação voltam ao básico; trocando escaladas em prédios e perseguições em tempestades de areia por motocicletas em alta velocidade e cenas que apostam no suspense. Mais do que isso, finalmente apresentam uma personagem feminina que é mais do que um rosto bonito. Sua beleza é acompanhada de mistério, o qual é usado muito bem pelo roteiro para incrementar uma história praticamente reciclada. Esse e outros motivos fazem de “Rogue Nation” um dos melhores filmes de ação do ano.
11. Inside Out (Divertida Mente)
Depois de uma série de filmes que plantaram a semente da discórdia na audiência, muitos acharam que a Pixar estava perdendo a mão. “Carros 2” foi a continuação para um filme que nem era muito amado, “Valente” não causou um impacto muito grande e “Universidade Monstros” também passou sem chamar a atenção. Então veio “Divertida Mente” para compensar toda a falta de comoção de seus predecessores com uma história aparentemente simples, mas recheada de profundidade. A princípio é outra história estilo “Osmose Jones” que mostra a mente humana funcionando de forma fantasiosa, com pessoinhas responsáveis pelas funções biológicas. No entanto, aprofundam isso de uma forma que tinha chance de ter dado errado: bebendo diretamente da fonte da psicologia. A Pixar muito bem ter alegado licença poética e feito qualquer coisa, mas usa a teoria criativamente para entregar as mais diversas aventuras enquanto explora temas mais sérios como maturidade, relações familiares e até depressão. É um prato cheio para psicólogos e amantes do bom cinema.
10. Love
Se em alguma roda de conversa filmes controversos se tornam o assunto, provavelmente aquele tal filme sobre estupro será mencionado. Intenso e totalmente asqueroso, o longa de Gaspar Noe deu o que falar em seu lançamento e até hoje o faz. Deixando de lado a parte suja do sexo, Noe tenta amenizar os preconceitos ao chamar esta obra de “Love”. No entanto, tão logo que o filme começa, uma cena de sexo explícito surge, na qual o casal protagonista se masturba em sua cama com genitais a mostra. Nem posso dizer que audiências sensíveis vão se chocar porque acredito que poucos não questionarão seus próprios olhos. O sexo é tão visível quanto o sangue nos filmes de Tarantino e as explosões nos de Michael Bay, embora aqui haja um propósito para tanta profanidade. O roteiro é simples o bastante para transmitir uma mensagem: para o diretor, amor é sexo, e o sexo é a representação carnal, enérgica e intensa do que alguém sente por outra pessoa, ou seja, o amor.
9. The Walk (A Travessia)
Considerando o alarde feito por causa dos 30 anos de “De Volta para o Futuro”, além de 2015 ser o ano que Marty McFly chega no futuro, era de se imaginar que mais gente comentaria sobre “A Travessia”, também dirigido por Robert Zemeckis. Realmente não culpo muitos, eu mesmo não dei muita atenção para esta história do homem que cruzou as torres gêmeas em um cabo de aço. A premissa não é apenas desinteressante, ela parece ter todos os traços de um filme totalmente expositivo, que bajula os feitos do protagonista. A surpresa veio quando o resultado foi uma combinação de personagens carismáticos, uma história bem contada e um tom leve, muito similar àquele do próprio “De Volta para o Futuro”. Visuais extraordinários reproduzem o World Trade Center em toda sua glória, majestoso como era antes da tragédia de 2001; tornando o evento supostamente passável da premissa em um grande teatro de emoções, que vai além da óbvia vertigem e manipula o espectador com mistos de suspense e humor, dependendo da ocasião.
8. The Martian (Perdido em Marte)
Toda vez que falo de “The Martian”, faço questão de mencionar como minhas expectativas não foram correspondidas, mas reviradas e deixadas de lado para que algo diferente, e talvez até melhor, entre em seu lugar. A reação emocional mais provável quando se fala na história de um homem deixado para trás em um planeta é a de solidão, depressão e talvez até loucura. Não, para este longa, a reação é humor e fazer vídeo-diários tirando sarro de sua própria situação. De todas suas qualidades, esta obra frequentemente se destaca por ser a suposta redenção de Ridley Scott depois de uma sequência de filmes fracos, embora o longa tenha por si qualidades o bastante para justificar qualquer alarde. O retorno de Dariusz Wolski, diretor de fotografia de “Prometheus”, garante visuais estupendos, ao passo que Matt Damon mostra estar confortável em seu papel quando fala com o espectador quase diretamente sem quebrar a imersão, assim tornando muito fácil engolir aquela situação com um sorriso no rosto.
7. Spotlight (Spotlight: Segredos Revelados)
Um dos filmes realmente sérios do ano, que, sem surpreender ninguém, foi indicado para o Oscar em várias categorias é também um tiro certeiro da Academia. Baseada em fatos reais, a trama acompanha a equipe investigativa Spotlight, do jornal Boston Globe, em sua procura por uma matéria grande. Eventualmente, são colocados no rastro de histórias antigas, que giram em torno do abuso infantil cometido por sacerdotes da Igreja Católica. É difícil colocar defeitos em “Spotlight”, ele é quase como o presente de Natal que todos desejam: o pacote é embrulhadinho, polido e bonito, com seu conteúdo sendo ainda melhor. A direção de Adam McKay trata uma grande história com a simplicidade de um dia no trabalho. Assim como seus personagens, o diretor não quer tornar seu filme um espetáculo, ele foge da megalomania como o elenco foge do sensacionalismo. No final das contas, o trabalho de McCarthy é uma direção compromissada com seu produto, não com emoções baratas e venda de ingressos. O elenco — bem interpretado, extenso e com personagens bem distintos uns dos outros — certamente ficaria orgulhoso.
6. The Hateful Eight (Os Oito Odiados)
Como quase todo filme de Quentin Tarantino, “The Hateful Eight” é um divisor de opiniões. É muito fácil achar gente que amou o filme, que odiou o filme, que considera o melhor do diretor ou que a fórmula Tarantinesca já está batida. No oitavo filme do diretor, oito figuras questionáveis ficam encurraladas numa cabana nas montanhas gélidas do Wyoming; receita que parece um “Reservoir Dogs” com um pouco de “Django Unchained”. Se perguntarem se a tal fórmula de Tarantino está presente — violência explícita e quase gratuita, diálogo afiado com uma porrada de palavrões — a resposta é sim, mas não desgastada como falam. Pelo espaço limitado, é de se imaginar que este longa depende muito dos diálogos para compensar certas limitações e faz exatamente isso; funcionando especialmente bem por equilibrar acidez, baixaria, humor e o plenamente ridículo sem quebrar a imersão, afinal de contas, o plano de fundo ainda é o Velho Oeste.
5. Ex Machina (Ex Machina: Instinto Artificial)
Não, “Ex Machina” não tem nada a ver com o termo deus ex machina, sua boa história evita coincidências e dá vida a um roteiro indicado ao Oscar. A estréia de Alex Garland, roteirista de “28 Days Later”, como diretor acompanha um programador que é convidado a passar a uma semana na casa de seu chefe, onde deve dar suas conclusões sobre o projeto mais recente dele: uma inteligência artificial super avançada. Contando com interpretações notáveis de Oscar Isaac, que mal parece o Poe Dameron de “Star Wars: The Force Awakens“, e Alicia Vikander, este longa os coloca em meio a uma série de questões existenciais num contexto moderno, utilizando elementos do cotidiano para tornar tudo aquilo mais palpável. Mas de tudo isso, o principal atrativo é a moralidade relativa e como ela está tão enraizada no roteiro que é impossível dizer quem é bom ou mau; o que também é apoiada pela direção de Garland e seu uso inteligente dos detalhes, supostamente secundários, da imagem.
4. Cobain: Montage of Heck
Devo admitir que raramente espero que um documentário entre em listas de melhores do ano quando os assisto. Com “Cobain: Montage of Heck” foi a mesma coisa. A surpresa veio quando a qualidade se mostrou muito superior ao esperado. O escopo deste documentário pega desde os dias de juventude de Kurt Cobain até sua morte, como a maioria das biografias por aí. Isso pode tornar esta obra pouco chamativa para muitos, mas, felizmente para os produtores, apresentação é a alma do negócio. Áudios de entrevista, nos quais Kurt Cobain reconta sua infância, são usados como plano de fundo para inúmeras sequências animadas, que ilustram suas palavras tão bem, e talvez melhor, do que vídeos daquela época poderiam fazer. Aliás, a quantidade de material disponível para a produção deste documentário é absurda, então resumir a parte boa a um ótimo desenho animado é uma falácia. Entrevistas com parceiros de banda, esposa, amigos e parentes dão novos pontos de vista sobre a vida do artista; reproduções de suas anotações obsessivas abrem uma janela direta para seus pensamentos; e frequentemente pode-se ouvir alguns sucessos do Nirvana tocando ao fundo. De todos os muitos filmes feitos sobre Kurt, acredito que este seja o mais completo deles. É difícil superar tanto material em um só lugar.
3. Room (O Quarto de Jack)
O famoso ditado “guarde o melhor para o final” foi, de certa forma, o que aconteceu com “Room” nos cinemas brasileiros, pois ele foi o último filme de 2015 a estrear por aqui. Aqui, a história é contada a partir dos olhos de Jack, o fruto de uma relação entre sua mãe e o sequestrador que a estupra toda noite em cativeiro. Só com sua premissa, “Room” já desperta emoções fortes no espectador, que fica sem saber o que pensar de toda aquela situação; filho e mãe vivendo há anos em um quarto fechado sob condições precárias. Quando chega a hora de desenvolver sua trama, este longa não desaponta nem um pouco. Pega toda a promessa inicial e transforma em uma verdadeira exploração dos limites do ser humano, sem se tornar excessivamente dramático — em parte porque Brie Larson mantém um moderado desequilíbrio — ou explícito na repugnância de partes do enredo. Um bem vindo tapa na cara da originalidade dos indicados ao Oscar.
2. Mad Max: Fury Road (Mad Max: Fury Road)
“Mad Max: Fury Road” pode não dar um tapa na cara potente como o de “Room”, mas certamente é a maior e melhor surpresa do ano. Em pleno 2015, muita gente não conhecia, não ligava ou tinha esquecido da série “Mad Max”. A idéia para uma continuação esteve no ar desde 1998; antes disso, ficou por muito tempo no inferno de desenvolvimento, passando de mãos em mãos sem chegar a lugar algum. Finalmente, em 2012 começaram a gravar “Fury Road” para um lançamento (atrasado) em 2015. Acredito que ninguém ainda tinha expectativa, mas todos se surpreenderam, pois este é de longe o melhor “Mad Max” da história. Todos os pontos positivos da primeira trilogia estão presentes, não como antes, mas totalmente turbinados. A mitologia é expandida para algo que faça sentido no geral, não apenas num filme só; as cenas de ação mal dão tempo para o espectador recuperar o fôlego, além de terem um design de produção excepcional e uma combinação de efeitos especiais práticos e digitais. Até mesmo uma protagonista bem desenvolvida marca presença. Sim, uma protagonista, pois é a personagem de Charlize Theron que realmente rouba a cena aqui. Quem sabe se Mel Gibson estivesse no elenco…
1. Creed (Creed: Nascido para Lutar)
Este filme é um exemplo parecido com o próprio “Mad Max: Fury Road“. Ninguém queria ou realmente esperava uma continuação depois de “Rocky Balboa” em 2006, mas de alguma forma deram a Apollo Creed um filho perdido. que, por coincidência, nasceu para lutar. Tudo indicava uma péssima continuação para enterrar a série “Rocky” pela segunda vez. Não dessa vez. “Creed” é o que toda ressurreição de franquia deveria fazer: pegar os aspectos clássicos, modernizá-los para uma época nova e conservar a identidade, tornando a obra acessível para mais gente. Exemplo disso é o próprio Stallone, que troca o lutador azarão por um mentor quase pai e ainda assim mantém o carisma de sua fala enrolada e voz grossa. Tudo que se espera de um “Rocky” está presente, somado a uma modernização na edição, na direção e na fotografia. O resultado são lutas intensas, cheias de baba com sangue voando e impactos ressonantes, que colocam o espectador direto para dentro dentro do ringue. É a mesma emoção de torcer por um filme como se a luta fosse gravada ao vivo em ângulos inéditos, uma cobertura exclusiva de um evento épico. Definitivamente o melhor da série e o melhor do ano.