Chega o décimo segundo longa do Universo Cinematográfico Marvel e com ele o fim da segunda fase dos filmes. Os planos iniciais continham Edgar Wright como diretor e roteirista de “Ant-Man”, que também foi responsável por “Shaun of the Dead”, mas desacordos criativos acabaram tirando-o do projeto após quase 10 anos de envolvimento. No seu lugar foi colocado Peyton Reed, diretor de “Separados pelo Casamento”, um substituto criticado e que possivelmente causou muitos dos problemas vistos aqui.
Em vez de usar a figura de Hank Pym, o Homem-Formiga original e o mais conhecido, esta obra usa Scott Lang como o homem detrás da máscara, a segunda pessoa a usar o nome do herói nos quadrinhos. Aqui, Pym (Michael Douglas) já é um homem velho, tendo usado a roupa de Homem-Formiga décadas antes e trancado a mesma depois que mostram interesse em usar o traje para fins militares. Após isolar Hank Pym de sua própria empresa, este mesmo assistente segue com seu projeto e chega perto de replicar o traje de encolhimento. Para impedir o progresso do projeto, uma figura questionável entra em jogo: um mestre ladrão recém libertado da prisão chamado Scott Lang (Paul Rudd).
Característica comum de filmes que passam pelas mãos de muita gente, não ter uma identidade bem definida é o tipo de coisa que passa despercebida quando os envolvidos não possuem estilos notavelmente únicos. Entretanto, quando um dos responsáveis pela gênese da obra é alguém detentor de um humor tão singular como Edgar Wright, fica difícil não notar os vários momentos em que sua influência mostra-se presente. E quando o resto do conteúdo é tão inferior que se limita à simples reprodução de idéias, perceber a inferência dos cineastas ligados ao projeto torna-se explícito o bastante para separar sequências e trechos inteiros uns dos outros. Em “Ant-Man”, todas as fofocas e curiosidades dos bastidores mostram sinais e influência no produto final.
Existem três tipos de entonação evidentes em “Ant-Man”: o humor tipicamente Wrightiano, com direito a toda a imprevisibilidade e criatividade excepcional; um dramalhão piegas, apelando para discursos moralistas e motivadores com frequência; e o típico humor característico de todos os filmes da Marvel até o momento. O problema é que esta mistura nem de longe chega a parecer minimamente natural, pois é muito claro onde uma entonação começa e outra termina, como se uma junção de tais abordagens sequer fosse pretendida. Ao contrário de”Guardiões da Galáxia“, que abraça o humor completamente e não sente vergonha de sua decisão, ou de um “Homem de Ferro”, que faz do humor parte do desenvolvimento de seus personagens, este filme falha em encontrar um meio termo, pois existem tantos pólos influentes que um equilíbrio entre todos chega a ser abstrato. Balançam vários galhos sem saber o que fazer com todos os tipos de frutas que caem.
Enquanto aspectos como o drama e humor acabam afetados por esta má administração de entonações, algo que acaba saindo ileso é a ação diferenciada de “Ant-Man”. Um aspecto que normalmente não costuma desapontar nos filmes da Marvel, a ação costuma ser um dos pontos fortes, algo que mais de uma vez salvou longas-metragens de um desempenho inferior, como acontece em “Avengers: Age of Ultron“. Mudar isso seria uma manobra arriscada, pois substituir algo tão central para as obras do estúdio poderia facilmente resultar em catástrofe. Esta obra faz justamente isso e, por incrível que pareça, o resultado é agradável e uma revigorante mudança do padrão de sempre. Não chega a ser uma regra, porém mesmo as piores cenas de ação seguem o mesmo padrão das boas, ao contrário do novo estilo visto aqui.
“Ant-Man” substitui as explosões frequentes, os vôos em alta velocidade e os escudos voando por uma série de sequências de ação que exploram o poder de encolhimento do Homem-Formiga. Nestas cenas, há uma interessante abordagem de como o herói se adapta a seus poderes novos, com lugares cotidianos sendo revisitados de um ponto de vista diferente; algo como uma variação do herói ganhando todos os poderes de uma vez e tentando se ajustar a eles atrapalhadamente. Em uma sequência, o herói interage com formigas em um formigueiro usando seu poder telepático, por exemplo; enquanto em outra, Scott Lang se vê correndo em um disco de vinil para fugir de uma agulha, apenas para ser sugado por um aspirador de pó e perseguido por um rato. Descritas, estas cenas parecem bobeira, mas de uma forma esperta acabam resultando em sequências de aventura atípicas e totalmente empolgantes.
Sendo um bom filme no final das contas, o principal problema se dá por conta da inconsistência de estilo. As diversas trocas de roteirista e diretor deixam sua marca em “Ant-Man” e isto pode ser visto através de cenas muito divergentes, que não deviam pertencer a uma mesma obra. No meio de um tiroteio entre o humor Marvel, o dramalhão desnecessário e o humor genial está a concepção original de Edgar Wright para esta obra, a qual sem dúvida seria surpreendente, mas infelizmente não sobrevive sem sofrer as máculas de tantas mudanças.