O Cine Grandiose participou do Olhar de Cinema 2016, a quinta edição do Festival de Cinema de Curitiba. De 08 a 16 de Junho foram assistidos 16 filmes de várias mostras diferentes. O evento trouxe mais de 90 filmes estrangeiros, nacionais, longas e curtas, em sua maioria de produção independente. Numa tentativa de facilitar o acesso às análises, esta página reúne os filmes assistidos e os separa por mostra.
Filme de Abertura
Operation Avalanche (Operação Avalanche)
Matt Johnson apresenta seu olhar singular sobre uma das maiores teorias da conspiração de todos os tempos, mexendo com o espectador sem nunca se limitar a uma coisa só. Não é um filme simplesmente cômico, nem uma obra que usa seus visuais estilizados para compensar uma história ruim, é um verdadeiro Mockumentary que combina fatos e ficção sem nunca deixar de ser interessante.
Filme de Encerramento
Kollektivet (A Comunidade)
Uma ótima escolha para o encerramento do festival, “A Comunidade” apresenta a idéia que todos já tiveram ao menos uma vez na vida: morar junto, ou ao menos perto, de seus amigos. Curiosamente, a visão do diretor dinamarquês Thomas Vinterberg não mostra tendenciosidade num assunto que cai facilmente nas graças de quem assiste. Divertido e até melancólico, este filme apresenta um ponto de vista moderado sobre o que é viver com muita gente na mesma casa. E claro, sem deixar o entretenimento de lado.
Mostra Competitiva
El Viento Sabe que Vuelvo a Casa (O Vento Sabe que Volto à Casa)
A premissa deste longa pode confundir um pouco os interessados: é um documentário sobre um projeto de ficção baseado em outro documentário que nunca saiu do papel. José Luís Torre Leiva acompanha outro cineasta, Ignacio Agüero, na construção de uma história de romance complicado pela tradição. Embora seja rico em conteúdo cultural e estético, este longa-metragem decepciona por apresentar um olhar monótono e pouco instigante, ficando bem abaixo do assunto que escolheu estudar.
La Última Tierra (A Última Terra)
Este era um dos filmes mais aguardados e comentados pelo que pude notar. Particularmente, achei a proposta interessante e foi um dos poucos da Mostra Competitiva que me chamou a atenção de verdade. No fim, tanto ânimo foi por nada quando o resultado foi uma grande decepção, um dos piores filmes do festival com certa folga. É uma história tão rasa que pode ser resumida do início ao fim pela sinopse, sem desenvolver nada em cima das duas linhas de texto que o descrevem.
Olhar Retrospectivo: Luís Sérgio Person
Cassy Jones – O Magnífico Sedutor
Efetivamente, esta é uma comédia romântica brasileira feita nos Anos 70. O que isso quer dizer? Muita coisa. Por um lado é interessante ver o Brasil naquela época, especialmente porque Paulo José, ator popular na época, interpreta um personagem que supostamente é um magnífico sedutor. Ele não tem cara nem estilo de um James Bond, mas tratando de uma comédia acredito que seja uma decisão bem válida para divertir quem assiste.
São Paulo, Sociedade Anônima
Depois de me decepcionar levemente com a romântica havia ficado um pouco menos empolgado por “São Paulo S/A”. Entretanto, isso até foi bom, pois assim tive uma surpresa ainda mais agradável com o longa-metragem de estréia de Person. A trilha sonora com corais imponentes pode até indicar algo épico, mas não se engane: esta é uma história sobre assuntos bem banais. O que também não significa algo negativo, uma vez que este é um dos melhores filmes brasileiros já feitos.
Olhares Clássicos
Amarcord
Um bom exemplo de filme que pode ser chamado de aleatório, fora do comum e até sem sentido. Não é bem o caso. Um olhar mais profundo revela que há algo ligando a excentricidade de cenas engraçadinhas com o regime fascista e até com a paixão de Fellini pela mulher. E não é a trilha sonora maravilhosa de Nino Rota, embora na pior das hipóteses ela dê conta de entreter o espectador com canções de muito bom gosto.
Meghe Dhaka Tara (The Cloud-Capped Star)
O fato deste longa ser indiano, em preto e branco, um musical e da Década de 60 pode matar a vontade de muitos espectadores de ver “Meghe Dhaka Tara”. Parece a combinação certa para um filme chato. O que não se espera é que esta seja uma história potente sobre injustiça e o senso de dever, que no fim com certeza causará uma impressão diferente do que as características iniciais sugerem.
Sayat Nova (A Cor da Romã)
Outra escolha curiosa, “A Cor da Romã” é um filme armênio sobre a história de um poeta através de uma experiência puramente audiovisual. Imagens complexas apresentam encenações e visuais fortes para ilustrar a vida do poeta. Cada cena é uma metáfora que caminha em direção a outra grande metáfora, um sentido para tanta estilização e criatividade, mas no fim o espectador fica esperando algo que nunca vem. Sem nunca chegar à superfície, uma imagem maior até tenta enganar que surgirá naquele emaranhado de atividade cerebral em forma de filme. Se a função da obra era ilustrar a mente do poeta Sayat Nova, então faltou ele pensar um pouco em qualidade antes de abraçar a abstração pura.
Ninotchka
Um forte candidato para melhor filme da seleção do festival, “Ninotchka” é engraçado, divertido e tem uma das personagens femininas mais icônicas do cinema. Interpretada por Greta Garbo, que antes era conhecida por seus dramas, a protagonista é uma verdadeira crítica viva e muito divertida ao comunismo e ao regime soviético da época. Antes esta era uma oposição ousada, hoje é isso e ainda melhor por ser aplicável a vários pensadores políticos de redes sociais, vistos frequentemente a cada novo escândalo.
Rekopis znaleziony w Saragossie (O Manuscrito de Saragoça)
Felizmente, para todo filme louco sem sentido há um filme louco com sentido. Este longa-metragem polonês pode ser uma experiência difícil de digerir por suas mais de 3 horas ou pelo idioma incomum, mas o que com certeza dá vários nós na cabeça é o roteiro com histórias dentro de histórias. A soma da duração com os toques surrealistas parece que vai derreter o cérebro do espectador com incontáveis distorções da realidade. Enquanto isso, a história dá várias voltas e alimenta tanto quem assiste como o protagonista com muita informação enganadora. Por fim, quando tudo se encaixa como uma história de várias camadas há satisfação para compensar toda a confusão de antes.
How Green Was My Valley (Como Era Verde Meu Vale)
Apesar de muita gente odiar esta obra de John Ford pelo simples — mas não tanto — fato de ter batido “Cidadão Kane” no Oscar de 1942, não é por falta de qualidade que a má reptuação surgiu. É um bom filme, sem dúvida, embora ache que o trabalho atemporal de Orson Welles merecia ter ganhado por seu impacto no Cinema e por ser melhor, no geral. Não só o prêmio principal mas também o de Melhor Direção, pois são aos mão de Welles que lapidam muitas das jóias encontradas. Pelo menos estes são alguns dos poucos pecados de “How Green Was My Valley”, que permanece uma demonstração do cinema de bom gosto.
Mouchette (Mouchette, a Virgem Possúida)
Mais do que um filme bom, “Mouchette” é uma lição interessante aos cineastas interessados em narrativas fora do comum. Isto é, contanto que estes não esperem encontrar aqui o melhor filme do mundo ou um roteiro que nada tem de tradicional. As regras são as mesmas, mas ocasionalmente o diretor Robert Bresson inova ao quebrar com a norma e ainda assim ser bem sucedido. O que há de mais interessante aqui, contudo, é como a visão de mundo obscura de Bresson é aplicada em algo que era pra ser inocente e puro como a protagonista.
Novos Olhares
Zud
Quando as pessoas saem da sessão de um filme de ficção falando que gostaram muito do documentário que viram, algo está errado. “Zud” tenta inovar sua história simples de várias maneiras e até tem sucesso em algumas, embora o saldo final não seja muito encantador. Sua proposta tinha potencial para entregar uma experiência diferente do que se vê frequentemente, até rendendo alguns resultados interessantes. O porém é que para cada inovação há um lado negativo. A situação fica complicada quando a ânsia por inovar afeta o bom julgamento, resultando em um filme pouco engajante, embora não exatamente ruim.
Akher Ayam El Medina (Nos Últimos Dias da Cidade)
Apresentando poucos contras, “Nos Últimos Dias da Cidade” se localiza na Cairo de tensões e conflitos políticos. O clima de instabilidade é constante e coloca todos os envolvidos andando no fio da navalha. O protagonista enfrenta problemas consigo mesmo e sua criatividade, com seus amigos e suas escolhas duvidosas e até com sua mãe doente. No fim das contas, esta obra é uma interessante aplicação de conceito em várias camadas diferentes, além de ser um filme egípcio surpreendentemente bom.
Foco: Matias Piñero
La Princesa de Francia (A Princesa da França)
Um dos 5 filmes de Matias Piñero é também interessante de sua própria maneira. Ele faz parte da tendência de estrelar um grupo de amigos envolvidos com Shakespeare de alguma forma, ilustrando isso com uma história bizarra com toques aqui e ali de surrealismo. Não funciona totalmente bem, mas ao menos sugere que o diretor tem potencial para boas idéias — como as melhores cenas mostram — faltando apenas desenvolver um pouco mais e polir esse talento.