Exibido no Brasil pela primeira vez, este longa de José Luis Torre Leiva faz parte da Mostra Competitiva do 5º Olhar de Cinema. “El Viento Sabe que Vuelvo a Casa” me chamou a atenção por ser um filme que fala sobre cinema e, é claro, por se encaixar perfeitamente na agenda. Obras como “Sunset Blvd.” mostraram que os bastidores do cinema podem ser tão interessantes quanto a arte que sai deles, mas se tratando de um Documentário achei que este longa chileno poderia ser ainda melhor: acompanhar a jornada real de um cineasta fazendo seu trabalho poderia talvez ensinar uma coisa ou duas.
Em 1981, um casal de amantes some completamente da Ilha Meulin, Chile — o lugar onde viviam. Interessado pela história, o cineasta chileno Ignacio Agüero decide fazer um documentário sobre tal evento, porém a obra nunca sai do papel por algum motivo. Muitos anos depois ele prepara um projeto de ficção baseado nesta mesma idéia: um casal improvável que abandona as tradições de sua terra para seguir seus corações. “El Viento Sabe que Vuelvo a Casa” mostra o trajeto de Agüero, que busca mais informações para seu projeto com os habitantes daquela ilha.
Resumindo toda essa história: “El Viento Sabe que Vuelvo a Casa” é um Documentário sobre um projeto de filme de ficção que, por sua vez, é baseado em outro projeto de documentário abandonado. Tudo sobre o mesmo assunto. Por um lado, é evidente porque uma obra como essa pode ser apelativa. Muitos amantes de cinema têm um interesse que vai além do que é mostrado na tela, eles querem saber como fazer cinema para entender melhor sobre o assunto e talvez até produzir algo. Particularmente, este foi meu caso. Entrei sem saber bem o que esperar, mas de modo geral posso dizer que saí bem desapontado.
Não porque as imagens são feias e o assunto desinteressante, estes são os dois pontos mais fortes do filme. Se alguma coisa tem sucesso aqui, esta seria a fotografia do longa. Não conhecia aquela região insular do Chile e depois de “El Viento Sabe que Vuelvo a Casa” devo admitir que ela se tornou um destino desejável para uma viagem. O pôr do sol sobre uma colina de grama tão verde que a do vizinho jamais poderia ser igual é uma cena impressionante. Comum, porém impressionante. Sem deixar tanta beleza ficar à toa, o diretor amarra perfeitamente o sentimento bucólico daqueles ambientes naturais com o próprio tema de sua obra. A cultura da Ilha Meulin e de muitas outras ilhas próximas é rica e, de certa forma, rígida em seus costumes. Nada exagerado como dizer que os habitantes de lá são bárbaros por morar longe da civilização, contudo. A vida lá é algo como o contraste entre cidade grande e interior, ambos são um mesmo povo com tradições diferentes; a distância apenas dá força para a manutenção de crenças regionais. No entanto, não só a cultura das ilhas é diferente, há uma divisão entre eles mesmos: há o povo de cima, os descendentes de indígenas; e o de baixo, chamados de mestiços. O casal que fugiu tantos anos antes não podia ficar junto por serem de classes sociais diferentes. Estudando este fenômeno, Ignacio Agüero revela esta história e ainda mais.
Mas algo não parece certo. É ilógico exigir de um documentário as mesma experiência da ficção, embora eu aprecie e ache essencial que a obra em questão, independente do gênero, me prenda ao conteúdo que apresenta. Quando vejo um filme excelente costumo correr atrás de mais informações sobre ele, seja nos Extras do disco ou na própria internet. Entretanto, ver “El Viento Sabe que Vuelvo a Casa” é como assistir ao making of de um filme que nunca me chamou a atenção em primeiro lugar. Eu não conhecia a cultura das ilhas ou a história do casal para correr atrás de um filme como esse, então me cativar sobre tais assuntos tornou-se tarefa deste longa. No fim me senti bem informado, não instigado. O conteúdo estudado e o visual fazem sua parte enquanto a jornada de Agüero mostra que a produção de um filme nem sempre é tão atraente quanto a idéia que lhe deu base. Em suma, sua jornada consiste de dirigir um jipe por incontáveis estradas de chão e conversar com as pessoas, extraindo informação sem criar um papo necessariamente interessante no processo. Novamente, não por falta de conteúdo nas conversas, mas porque estabelecer um diálogo naturalmente não parece estar em suas habilidades sociais.
Decepcionante, “El Viento Sabe que Vuelvo a Casa” é um longa que tinha potencial para ser muitas coisas — uma aula de história, cultura e até de cinema — e acaba como uma experiência monótona e mal conduzida. O que é uma pena, uma vez que o assunto escolhido tem muito a dizer. Talvez o tal projeto de ficção faça jus a tanta riqueza cultural, isto é, se ele sair do papel. Enquanto isso fico na expectativa não correspondida deixada por esta obra.