Já falei isso uma vez, sempre fui receoso com o plano da Legendary Pictures de direcionar o Monster-Verse desde o começo para um embate entre Godzilla e King Kong. Ou melhor, só Kong. A única vez que isso havia sido feito foi em 1962 com “Kingu Kongu tai Gojira“, a primeira grande decepção que tive ao maratonar todos os filmes japoneses. O fato de “Kong: Skull Island” não ter sido dos melhores também não ajudou muito a criar empolgação. Surpreendentemente, “Godzilla vs. Kong” se mostrou um filme muito melhor que sua contraparte japonesa e trouxe uma história completamente maluca de ficção científica absurdista com algumas das melhores cenas de briga de kaiju. Então é claro que uma continuação aconteceria eventualmente, o que leva até “Godzilla x Kong: The New Empire”, uma nova história protagonizando os dois gigantes.
Após seu embate inicial, os titãs são separados. Godzilla se mantém na superfície, defendendo a civilização humana dos Titãs adormecidos ao redor do globo. Já Kong fica encarregado de cuidar da Terra Oca, cuja natureza primitiva permite espaço para se exercitar, caçar e viver da melhor forma que um animal de seu tamanho conseguiria. A vivência para ele é solitária, no entanto. Longe de Jia (Kaylee Hottle), a única pessoa com quem conseguia conversa, o gorila sente o peso de ser o último de sua espécie. Isto é, até que um abalo sísmico abre uma passagem para uma área não mapeada da Terra Oca, onde existem outros como ele liderados por um primata com sede de poder e conquista.
É difícil não me empolgar para um filme de Godzilla depois de ter visto todos os filmes menos a trilogia do Netflix. Com “Godzilla Minus One” e sua aclamação universal que até o levou a ganhar um Oscar de Melhores Efeitos Especiais, havia até esquecido que “Godzilla x Kong: The New Empire” estava para ser lançado nos próximos meses. Por outro lado, não é como se a campanha de publicidade tivesse sido muito bem sucedida em criar empolgação pelo filme como conseguiram com os anteriores. Parecia que essa era de fato uma continuação do embate anterior com Kong no sentido ruim da palavra, tanto que o nome é quase exatamente o mesmo de antes com apenas um subtítulo a mais. Há um pouco de tom de reciclagem, mas isso era mais um pré-conceito meu sem embasamento nenhum em alguma evidência.
Também não vi trailer algo, pois se tivesse visto talvez percebesse uma coisa que me incomodou eventualmente. O pôster já era indicativo disso: a dupla é colocada lado a lado correndo em direção à câmera. Godzilla correndo? Pois é, um monstro de 120 metros e sabe-se lá quantas toneladas de peso correndo, pulando e se movimentando rapidamente como se não fosse um esforço homérico. Faz mais sentido Kong ser assim, e foi essa uma das vantagens estabelecidas em “Godzilla vs. Kong” para compensar pelo seu tamanho e força menores. Sinto que “Godzilla x Kong: The New Empire” se entrega a um sentimento de bagunça, quebrando algumas regras e convenções criadas antes em prol de um entretenimento mais básico e simplificado. É como o pessoal que gosta de imaginar crossovers esdrúxulos e pensar em quão legal seria ver Darth Vader montado num dragão lutando contra o Batman num Megazord.
Uma comparação injustamente exagerada, claro, mas ainda assim sinto que algumas coisas precisam ser preservadas porque é possível pensar em entretenimento dentro de alguns conformes que transmitem credibilidade ao universo fantasioso. Por exemplo, ninguém vai reclamar do oceano inteiro ter pelo menos 100 metros de profundidade em qualquer ponto para comportar Godzilla mergulhando e nadando. Por outro lado, quebrar regras de física e permitir que um lagarto gigante faça o que quiser apesar de seu tamanho é uma saída muito fácil. É como escrever uma história do Batman em que ele mata um bandido ou outro arbitrariamente porque era conveniente naquele momento. Não é a pior coisa que “Godzilla x Kong: The New Empire” poderia ter feito, considerando as várias possibilidades de fracasso.
“Godzilla x Kong: The New Empire” tenta fazer jus ao ditado de maior, mais intenso e melhor — ou algo assim, seja lá como o ditado original for. Mais batalhas, mais monstros, mais ação e um Godzilla renovado. Bem, às vezes essa fórmula funciona, aqui acho que não tanto. Parece que muito do que fazia os anteriores melhores é sacrificado em prol de algum tipo de ação ou cena fantástica. É até estranho porque a única parte que se beneficia disso é a trama humana, que continua sendo mediana, mas aqui ao menos tem um papel abertamente secundário. Seria uma oportunidade perfeita para dar mais palco aos monstros e deixar que as lutas durem mais tempo como muitos pedem. Ao invés disso, há mais lutas sem o mesmo impacto; impacto esse que também faz falta em algumas das ideias e do tom em geral. Parece que tudo é mais leve e mais simples, as soluções para os problemas são fáceis e até o filme ser mais colorido e saturado reforça essa atmosfera de falta de consequência real.
Mas falando dessa forma até parece que detestei “Godzilla x Kong: The New Empire”. O núcleo humano estar mais de lado faz a diferença por finalmente não estar ali por muito tempo para fazer o espectador torcer o nariz, então é algo a menos para incomodar. Há até uma sequência inteira feita especialmente para o Brasil quando, de todos os lugares do mundo, os kaijus caem em Copacabana para destruir o Rio de Janeiro inteiro. Em horas como essa, quando a obra finalmente parece engrenar e trazer as lutas tão aguardadas, ela entrega. Nem todas são perfeitas, algumas possuem uma direção confusa que complica situar-se no que está acontecendo e, sim, ver a escala dos monstros desmerecida em prol de golpes mais rápidos e movimentos de luta absurdos é um pouco estranho. Ainda é um bom entretenimento, longe de ser uma porcaria ou ruim como vários dos filmes japoneses antigos, mas talvez a filosofia de antes devesse ter sido mais conservada.