Diretor da obra prima do terror conhecida como “O Exorcista”, William Friedkin teve sucesso em outros gêneros antes de chegar em no Terror propriamente dito. Antes de chegar em seu filme sobre possessão demoníaca, Friedkin se aventurou na investigação policial com “The French Connection”, amplamente considerado um dos melhores de seu gênero. Talvez o impacto cultural e a importância para o cinema da época tenha sido um fator decisivo na opinião de muitos espectadores, pois se tratando de qualidade este longa-metragem deixa a desejar consideravelmente; ainda mais quando um adjetivo como “obra-prima” é tão frequentemente atribuído.
Ansioso por um caso grande, o detetive Jimmy “Popeye” Doyle (Gene Hackman) sente que um está por vir quando nota movimentações suspeitas em um dos bares que frequenta. Algumas figuras de índole duvidosa se reúnem em uma mesma mesa desse bar, e Popeye sabe que nada de bom pode sair daquele evento. Quase implorando para seus superiores por recursos para montar uma investigação, o detetive finalmente consegue o que precisa e parte para o ataque junto de seu parceiro Buddy Russo (Roy Scheider).
Sendo um longa-metragem menos puxado para a ação e mais para uma obra de suspense, algo de um caráter mais lento, este filme não foca tanto em elementos pelos quais o gênero policial é conhecido, mas sim em coisas como a investigação em si e o procedimento que antecede a ação. Isso significa que menos chumbo voa pelos ares, enquanto mais suspeitos são seguidos pela cidade; mais discussões sobre o caso acontecem que uma execução dos planos em si. Enquanto não existe problema inerente com um ritmo lento e pouca ação na tela, esquema que funciona perfeitamente bem em um seriado com 30 vezes a duração deste filme como “The Wire“, pode-se dizer que um pouco mais de agito no enredo não faria mal algum. Não que a estrutura deste filme devesse ser mudada para algo diferente, pois uma obra não deve ser considerada pior por não fazer o que o espectador faria; entretanto, pelo ritmo ser mais lento, um cuidado maior faria a diferença e provavelmente evitaria que a experiência fosse tão cansativa como acaba sendo em diversos momentos. Tratando de uma investigação, um certo tempo deve ser dedicado aos estágios do processo investigativo para criar um desenvolvimento imersivo; o problema é que a maioria destes estágios mostra-se um tanto desinteressante, com algumas poucas exceções criando uma experiência de qualidade.
Se por um lado este longa acerta ao apresentar uma complexa sequência de perseguição a pé, utilizando uma dinâmica que realça os sucessos da direção de William Friedkin; por outro temos tediosas sequências onde pouco realmente acontece, como quando os policiais simplesmente esperam no carro algo acontecer. O pecado não se dá exclusivamente por uma falta de ação, mas sim por uma certa inutilidade de tais cenas para o próprio enredo. Existe coesão entre o que se pretende atingir e a natureza do evento em questão, o que não significa que o resultado será um produto cinematográfico de qualidade. Fica claro para o espectador que aquilo faz parte do trabalho dos policiais, e aspectos como montagem e direção mais que fazem sua parte para complementar tecnicamente o que seriam cenas descartáveis; a questão é que sequências simples como diálogos acabam ficando um pouco apagadas frente a outras extremamente mais complexas. Como pode ser visto na sequência de perseguição citada anteriormente, a disposição dos elementos e a inteligente troca de pontos de vista constroem bem demais tal cena para não criar um contraste prejudicial por consequência.
O que fez a fama desta obra, entretanto, não foi uma cena calma bem executada; a popularidade se deu por causa de uma extremamente agitada, que talvez seja uma indicação que o caminho para o sucesso estaria em cenas deste caráter. Curiosamente, o diretor relatou em entrevista que não tinha autorização da prefeitura para gravar tal cena, então ele simplesmente montou a câmera e saiu rodando pelas ruas em alta velocidade. O resultado não poderia ter sido melhor, com as mudanças de perspectiva mostrando-se presentes novamente e fazendo bonito. A dupla de protagonistas também não deixa a desejar, entregando interpretações sólidas e criando outro exemplo de dupla policial incomum. Seguir um padrão de colocar duas figuras heterogêneas, normalmente um policial malvadão e outro coração leve, nunca foi novidade para ninguém, porém o que se atinge aqui oferece variação o bastante para não ser considerado clichê. Um oficial cabeça dura, impulsivo e violento é a figura interpretada por Gene Hackman, no maior estilo Tony Soprano; o ator encaixa tão bem em seu papel que facilmente poderia ter encorpado o chefe da Máfia de Nova Jérsei, caso “The Sopranos” tivesse sido lançada na década de 70. Ao seu lado está o personagem de Roy Scheider, uma figura menos expansiva para opor a personalidade forte de seu parceiro, e que por consequência acaba ficando um pouco em segundo plano. O que muda um pouco a situação é que em vez de usar qualidades opostas para combater uma inimigo em comum, eles se preocupam mais em se bicar entre si no que se refere ao procedimento policial.
Os acertos de “The French Connection” não estão nem um pouco abaixo do que era esperado após tantos elogios, enquanto as falhas são tão explícitas que nem parecem pertencer ao mesmo material que as sequências excelentes. Talvez com uma abordagem diferente a qualidade deste longa-metragem poderia ser um tanto superior, ainda mais se o ritmo lento fosse melhor administrado para criar um suspense mais impactante do que foi. De qualquer forma, o que é oferecido aqui está longe de ser ruim e entrega alguns bons momentos, além de uma mais que icônica cena de perseguição.