A terceira e aguardada parte final da história dos Guardiões da Galáxia chega depois de uma dose modesta de drama de bastidores que fizeram as pessoas pensarem que talvez o terceiro filme pudesse ser ainda pior que o segundo por cair nas mãos de algum outro diretor genérico que talvez fizesse um trabalho formular e seguro. Com James Gunn demitido do projeto poucos meses após o “Volume 2” por conta de piadas bizarras em seu Twitter, o destino da série ficou incerto até um pedido de desculpas e a repercussão popular na internet fazer a Disney voltar atrás em sua decisão e chamar o diretor de volta. E que bom que isso aconteceu, pois foi assim que nasceu o melhor da trilogia e um dos melhores da Marvel pós-“Avengers: Endgame“: “Guardians of the Galaxy Vol. 3”.
A equipe de heróis mais improvável de todas agora tem uma casa: Knowhere. Tranquilos em sua base de operações, seguindo a vida tranquila pós-ameaça universal de Thanos, mas ainda com a dor da perda de Gamora (Zoe Saldana) pelas mãos de seu pai, que na verdade está morta, mas não está. Mesmo com a Gamora original estando morta houve certa confusão que acabou deixando a Gamora de outro universo para trás, só que essa possui uma personalidade completamente diferente, uma que com certeza nunca cogitou namorar Peter Quill (Chris Pratt) e ser uma Guardiã da Galáxia. Então tudo dá errado e começa uma nova aventura espacial ao estilo Guardiões.
Tudo começa com um ataque aleatório e há muito tempo em preparo por um dos muitos que se irritaram com os Guardiões ao longo dos anos. Um inimigo antigo prepara um agente para livrar o universo da equipe de uma vez por todas e no processo ele acaba ferindo Rocket gravemente, mas nada que um kit de primeiros-socorros não resolvesse, isto é, se não fosse por um código na programação de um dos vários dispositivos cibernéticos no corpo do guaxinim, algo feito para desativar seu funcionamento e acabar com sua vida em caso de uma emergência. Assim inicia a trama que pela primeira vez foca profundamente na história de Rocket Raccoon e sua origem.
Um filme de origem na suposta terceira e última parte da série? Pode fazer pouco sentido num primeiro momento e tal preocupação, sim, faz sentido porque “Guardians of the Galaxy Vol. 3” é uma conclusão de trilogia diferenciada e que não segue fórmulas ou beats emocionais típicos. Até mesmo o foco em um personagem só e na sua origem completa, até então só abordada muito sutilmente porque o próprio Rocket sempre foi muito privado sobre seu passado, é uma tendência esquisita de se escolher para uma conclusão. Se por um lado é um tipo de missão de resgate relativamente comum, por outro é uma ao estilo caótico e bagunçado de uma equipe que age sem plano, quase sem cérebro e muitas vezes demais com o coração. Tudo isso intercalado com fragmentos do passado que explicam muita coisa sem nenhum sinal de conveniência de roteiro, como o flashback que vem na hora perfeita para explicar algum mistério do presente. Se “Guardians of the Galaxy Vol. 3” pode ser definido brevemente, é como atípico.
E isso num universo como o da Marvel é sempre bem-vindo. Mesmo quando dá errado, é bom ver uma tentativa de mudança em vez de mais uma produção seguindo fórmulas linha por linha como acontece na maior parte dos casos e inclusive nos últimos filmes. “Guardians of the Galaxy Vol. 3” escolhe um favorito dos fãs e centra sua história nas suas dificuldades ao mesmo tempo que deixa para introduzir um personagem clássico das sagas cósmicas quando todo o resto está de saída e ele mesmo tem suas diferenças com o original do quadrinho. Em vez do personagem sério, sábio e centrado, temos uma versão Marvel e imbecilizada porque, bem, sempre se precisa de uma dose de humor. E é desse jeito estranho, quase aleatório, que “Guardians of the Galaxy Vol. 3” acaba se mostrando o mais equilibrado da trilogia em termos de tom. Há palhaçada e há drama, ação e bons diálogos, um pouco de tudo para criar uma experiência não perfeita, e sim que passa a impressão de certa profundidade raramente encontrada no gênero.
Tudo isso analisando em perspectiva, claro. Não é como se num contexto de cinema amplo “Guardians of the Galaxy Vol. 3” seja referência de drama bem escrito, por exemplo. O elogio de equilíbrio é válido e um ponto forte do filme, porém não é perfeito, como dito, pois o grande defeito de roteiro aqui é justamente ser um pouco sentimental e piegas demais em momentos que tenta tocar o coração do espectador. Isso e a insistência em querer incluir algum tipo de batalha de grande escala onde nem sempre há espaço para uma. É uma mania besta e claramente fora de lugar, que vem talvez mais por tendência e pressão do que por necessidade da história de fato. É como acontece em “Black Adam“, “Shazam! Fury of the Gods” e “Quantumania”: em algum momento o inimigo aparece com números grandes que colocam os heróis numa posição difícil, mas tudo dá certo porque alguém dá um jeito e mesmo se a batalha acontece não há consequência alguma.
E esse é o único grande problema mesmo, algo que ainda parece pequeno diante de todo o resto dos acertos. Como por exemplo, a obra ao mesmo tempo frustrar expectativas sobre certos eventos que todos esperavam e que simplesmente não aconteceram ou, ao menos, não exatamente do mesmo jeito. Foi complicado saber o que esperar de “Guardians of the Galaxy Vol. 3” por um momento porque o “Volume 2” decepcionou comparado ao primeiro e depois porque o próprio James Gunn foi demitido. Felizmente, a tendência de seus últimos trabalhos foi continuada aqui e esse se mostrou mais um acerto em seu repertório. Só fica em dúvida o futuro do Universo Marvel com mais uma equipe colocando um relativo ponto final em sua história.