Já havia ouvido falar de “Mrs. Miniver” algumas vezes antes de finalmente decidir assistir. O incentivo final foi o documentário “Five Came Back”, que fala de cinco diretores da Hollywood Clássica enviados para registrar a Segunda Guerra Mundial. Um deles era William Wyler, que dirigiu esse longa-metragem em 1941 e foi para a guerra servir como major em 1942, sem conseguir voltar a tempo para receber seu Oscar de Melhor Diretor em 1943. Somando a história de Wyler na guerra, os prêmios recebidos e os trechos usados no documentário, já era mais que suficiente para me convencer a assistir.
Os Miniver são uma família pacata de um vilarejo nas redondezas de Londres. Sua vida é tranqüila: uma casa grande com dois filhos pequenos correndo pelos cantos e saída direto para o Rio Thames. Kay Miniver (Greer Garson) e seu marido Clement (Walter Pidgeon) vivem em serenidade até serem surpreendidos pelo anúncio da guerra contra a Alemanha. Justo quando seu filho mais velho Vin (Richard Ney) chega de sua temporada estudando em Oxford, eles têm de se preparar para o pior enquanto o amor aflora entre o rapaz e a neta de uma respeitada dama.
“Mrs. Miniver” é um filme muito bom, mas gostaria de poder dizer que ele é melhor. Em outras palavras, esperava que ele fosse melhor. A idéia inicial que tive foi um tanto mais positiva porque o documentário espertamente escolheu as melhores cenas e deixou todo o resto das partes mornas de fora. Seus 134 minutos não são um indicativo imediato de uma duração obscena, ao contrário de uma mais longa que poderia correr o risco de se arrastar em algum ponto e minar a experiência como um todo. No entanto, a impressão é que o filme é longo, talvez mais do que deveria e com certeza fornecendo menos entretenimento para manter o espectador engajado nessas mais de duas horas sobre civis sobrevivendo à guerra.
Com isso, algumas idéias surgem sobre a execução dessa premissa. A localização desses civis influencia diretamente, por exemplo. Falar de alemães no final da guerra traz outro cenário e outra história diferentes de poloneses no começo do conflito. E quanto aos ingleses? A Inglaterra sofreu no início com a expansão alemã no território francês e os eventuais ataques aéreos que acabaram atingindo também as residências civis que deveriam estar fora dos alvos. Aqueles que achavam estar a salvo em sua ilha isolada do continente passaram a temer pela sua vida, originando um conflito dentro de casa diferente desses em outros lugares. Uma família de classe média com filhos pequenos e grandes, barco no cais e uma futura nora tem de encaixar em sua rotina a sobrevivência aos bombardeios. Como isso funciona, antes ou depois do chá das cinco?
Faz-se necessário estabelecer, como em qualquer caso, o status anterior às mudanças proporcionadas pelo enredo e depois vê-lo chegar em um outro status na conclusão, ou seja, como era o cotidiano antes das bombas caírem do céu e forçarem os civis aos abrigos para depois mostrar o impacto disso. “Mrs. Miniver” apresenta como era a vida de compras no final da tarde e jantares em família para que o espectador entenda o que está em risco, o que todos podem perder se uma bomba cair aqui em vez de ali. Faz sentido. Também é fonte das partes chatas porque parece que tempo demais é gasto mostrando o estilo britânico de ser, o que não é o material mais empolgante de todos. É interessante descobrir o que move tal personagem e o que ele faz nos dias comuns, pois assim nasce a tal humanidade, mas há formas e formas de fazer isso e sinto que essa não é a melhor delas.
Até alguma coisa começar a acontecer de fato, são quase 45 minutos de compras, jantares, bailes, conversas, missas e outros eventos comuns. Já nasce o estigma de narrativa arrastada contra o qual o resto do filme luta e consegue superar a fim de evitar um saldo medíocre. A idéia central do roteiro, mesmo com problemas de execução e de ritmo, se exalta por casar o seguimento da vida comum junto com a guerra em progresso. Como a Inglaterra não foi invadida de fato, não houve destruição generalizada, ruas virando zona de guerra, assassinato e estupro, diferente de outros países da Europa continental, logo havia espaço para manter a normalidade em certo nível. Tudo acontece ao mesmo tempo, as dificuldades se empilham conforme se perde o equilíbrio entre o temor de guerra e a manutenção da rotina.
O mesmo filho que chega da universidade também tem de se alistar na força aérea ao mesmo tempo que se apaixona por uma garota local e tem de lidar com a pressão de lidar com seu amor ansioso e frágil. A família teme pelas bombas por ter crianças pequenas em casa e o marido é chamado para fazer sua parte pela nação em uma interessantíssima conexão com os eventos mostrados em “Dunkirk”. Clem Miniver sai com seu barco para ajudar para ajudar a evacuar as tropas britânicas em uma das mais interessantes seqüências da obra, representando bem a mensagem central sobre essa ser uma guerra de todos, soldados e civis juntos para superar as tribulações de tempos soturnos. “Mrs. Miniver” apresenta a vida e o conflito da família comum durante a guerra, como a mãe, o pai e todos os filhos têm papéis e adversidades específicas a serem superadas.
Essa mensagem é comunicada com clareza e eficiência, guardando espaço para uma inversão inesperada no clímax por contrariar o esperado desde muito antes conforme “Mrs. Miniver” se mostrava uma história de poucas surpresas. Performances exímias sem exceção fortalecem muito uma obra que conta com alguns pontos bem altos e vários mais modestos pesando contra a narrativa. São os longos momentos quando Kay vai para a cidade e compra um chapéu novo, conversa com o Sr. Ballard na estação e depois com sua família quando chega em casa, cenas não tão engajantes contra outras excelentes como o discurso do padre ao final. Talvez com apenas um pouco mais de energia e menos apego à figura da dona de casa e seu cenário, “Mrs. Miniver” poderia perder sua mácula de ser moroso. Tal apego é condizente com o título e a atuação de Greer Garson é competente, mas não multifacetada o suficiente para internalizar e refletir o sofrimento de todas as pessoas ao seu redor e, assim, justificar tanto destaque.