“Ralph Breaks the Internet” não pareceu grande coisa em um primeiro momento. “Wreck-it Ralph” foi interessantezinho, uma animação da Disney sobre videogames e o mundo secreto dos fliperamas, tipo um “Toy Story” em que os personagens ganham vida própria fora de seus papéis nos jogos e podem encontrar o pessoal de outras máquinas. Nada genial ou muito original, vide o paralelo, mas que deixou as pessoas empolgadas por ver Bowser e Zangief juntos porque sim e Sonic no cinema muito antes de ele ter seu próprio filme. Para onde a seqüência poderia ir depois de atiçar os fãs com mil referências? Para a internet, é claro, o lugar em que há dois trilhões delas porque tudo está nela.
A vida tem sido tranqüila nos últimos seis anos para Detona Ralph e Vanellope van Schweetz. Trabalhar de dia em seus jogos, fazer alguma coisa depois disso e continuar a amizade que construíram quando ele ajudou a garota a descobrir que não era intrusa em seu jogo. Logo a rotina passa a virar uma mesmice chata para Vannelope, que encontra problemas quando o volante do fliperama quebra e a máquina corre risco de ser desligada. Ralph e Vanellope embarcam em uma aventura inimaginável quando descobrem a imensidão da internet numa tentativa de comprar um volante novo e salvar o jogo.
“Wreck-it Ralph” foi lançado em uma época em que “Ready Player One” ainda não era uma realidade e a reunião de alguns personagens famosos de séries completamente diferentes soava fantástica. Então o filme de Steven Spielberg elevou isso para o além com todas as referências a todas as obras da cultura popular em uma mesma história. Com um contexto futurista e o poder da internet alimentando o jogo em realidade virtual, era possível encontrar Chucky e Mechagodzilla junto com Hello Kitty e Christine, o carro assassino. Sentido? Zero. As regras da internet são mais perto do princípio de que não há regras do que o contrário. Sim, existem regras, termos de condições de uso e até a possibilidade de crimes cibernéticos em atos que quebrem a lei no contexto virtual, ao passo que a verdade é que nada impede ninguém de criar um perfil no Facebook chamado Anna L. Feesting com uma foto do Bob Esponja que só posta textos sobre política. Seguindo essa idéia de horizontes infinitos, “Ralph Breaks the Internet” inova ao transformar a rede mundial de computadores em um cenário palpável.
Enquanto o número de referências de “Ready Player One” permanece imbatível, “Ralph Breaks the Internet” traz como novidade a internet como um lugar de fato, uma cidade gigantesca em que se pode encontrar tudo e todos que estiverem conectados. A grande maioria das pessoas tem acesso à rede hoje em dia, mesmo os velhos e os que usam pontualmente, porém nem mesmo os que têm conta em Twitter, Facebook, Instagram, YouTube, LinkedIn, Pinterest, Tumblr e todo o resto costumam pensar sobre o assunto. O que há para se pensar? São sites e aplicativos com propostas e funções específicas. Pois é o que essa continuação faz pelo espectador ao não só pensar no assunto como o fazer de forma criativa, avatares dos usuários passeando pelas ruas enquanto um personagem tenta chamar a atenção para clicar em sua propaganda. E por que não sair do prédio do eBay e dar uma passadinha rápida num jogo online? Sei que é isso que vou fazer depois de terminar esse texto.
Assim como “Inside Out” trouxe uma representação cativante de como funciona a psiquê humana e criou uma metáfora para depressão infantil usando bonequinhos coloridos, bolinhas de gude brilhantes e minicidades, “Ralph Breaks the Internet” faz a mesma coisa e traz de volta tudo o que o espectador conhece em um novo formato. Trazendo um pouco do efeito “Jurassic Park” de introduzir algo já conhecido e repetir o efeito de maravilha da primeira vez, o filme usa desde as idéias mais bobas como um bichinho tentar completar todas as frases dos protagonistas para reinventar comicamente algo tão banal como a Pesquisa Google. E isso é só o começo. Tudo está na internet, logo tudo poderia estar em um filme como esse, até mesmo as Princesas Disney, que não são um site ou propriedade intelectual da internet, fazem uma participação especial que merece todos os elogios feitos no lançamento às suas cenas. Novamente, algo popular recebe uma cara nova e é reinventado para efeito cômico. O visual renovado por si já faz as cenas valerem, todo o resto é um agradável bônus.
O grosso da obra, por assim, dizer consiste em uma coleção de referências diversas e aventuras de caráter completamente diferente, todas unidas porque a internet engloba tudo. Caso contrário, seria fácil pensar que a história é muito episódica e desconexa por fazer um pouco de tudo. Se existe algum site com torrent de “La La Land”, então ele também pode fazer parte da história e inspirar uma seqüência musical inteira com os mesmos personagens de outra cena de ação envolvendo carros de corrida e armadilhas mortais. Mais do que isso, a trama traz Ralph no papel de pessoa de bem criando um problema gigante sem querer, ferindo as pessoas que ama sem intenção. Funciona bem para a continuação de uma história originalmente sobre um vilão querendo fazer o bem, por assim dizer.
Reutilizar elementos antigos só não funciona tão bem quando “Ralph Breaks the Internet” insiste em usar a medalha de biscoito do final do anterior para simbolizar a amizade em xeque de novo e de novo. Toda vez que algo tenso acontece, lá está ele tirando do bolso a bendita medalha e olhando para ela com cara tensa. Isso e o final bizarramente deprimido. Tudo bem, a história caminhou o tempo todo para aquele lugar e faz sentido dentro da mensagem geral, mas não precisava ser tão para baixo. Só a cena pós créditos dá uma animada, mas não sei se é certo considerá-la parte oficial da obra.