Em pleno trajeto entre países, o ônibus espacial Moonraker sofre um acidente. Entretanto, apenas os destroços da aeronave que fazia o transporte são encontrados, o que levanta suspeitas sobre um possível sequestro. James Bond (Roger Moore) é enviado para investigar a situação e determinar o que aconteceu de fato. Começando com Hugo Drax (Michael Lonsdale), o milionário responsável pela fabricação dos ônibus espaciais, Bond logo começa a notar que há muito mais por trás do comportamento peculiar e hostil de Drax. Mal sabe o agente que sua investigação o levará ao redor do mundo e até fora dele .
James Bond passou por várias fases antes de chegar neste ponto: explorou a cultura japonesa em “You Only Live Twice, entrou na onda dos filmes chineses de artes marciais em “The Man with the Golden Gun” e emprestou vários elementos da cultura negra em “Live and Let Die”. No entanto, nenhum dos absurdos resultantes de misturar um agente secreto em serviço de Sua Majestade com elementos de outros mundos chegou tão longe quanto “Moonraker”. Isso levando em conta que se fala de elementos sobrenaturais, transformações étnicas e brigas contra lutadores de sumô e de karatê, com direito a quimono e tudo mais. Dessa vez, os produtores gastaram quase o dobro do orçamento de qualquer filme anterior para levar 007 para o espaço. Sim.
E por mais que pareça um absurdo sem tamanho para os fãs, que nunca deixaram de criticar o filme por sua fantasia extrema e fora de lugar num universo de espiões, foi uma aposta certeira para os produtores: “Moonraker” foi o filme que mais arrecadou na bilheteria até ser superado por “GoldenEye” em 1995. Mesmo assim, não é o simples fato do espaço sideral fazer parte da história ou mesmo a intenção incrivelmente óbvia de pegar carona no sucesso de “Star Wars” que deu origem a tantas críticas. O filme tem sua cota de problemas que justificam e muito seu tratamento como um dos piores da série, embora isso não signifique que a experiência seja falha do começo ao fim ou que ela não seja divertida. Com todos seus defeitos, não há como reclamar do fator entretenimento, de uma narrativa bem servida de cenas de ação, dos famosos apetrechos ou do Design de Produção de Ken Adam, que retorna pela última vez em um de seus melhores trabalhos.
No mínimo, não se pode reclamar da ambição estratosférica de “Moonraker” no quesito de criatividade visual. Querer enfiar tantos elementos diferentes e novos em uma mesma história permite que alguns dos locais de filmagem mais belos da série marquem presença, indo dos canais de Veneza até as ruas do Rio de Janeiro e a floresta amazônica. Bonitos por si, os cenários ainda por cima são otimizados pela competência de Ken Adam na criação dos lugares icônicos escondidos por trás do que já se conhece. Numa mansão estilo chateau francês, uma estação de treinamento para astronautas como as que se vêem na NASA; entre as vias de água e os prédios antiquíssimos, um laboratório sem nenhuma semelhança com a arquitetura secular do lado de fora. Mais que isso, toda a ida ao espaço é feita em grande estilo, com uniformes padronizados para os membros da estação espacial e um design geral que evita muito bem qualquer semelhança com a obra de George Lucas. Por fim, efeitos especiais complementam a eficiente direção de cena de Lewis Gilbert, também retornando pela terceira e última vez.
De fato existem muitas coisas boas a serem encontradas. A própria sequência pré-créditos é facilmente uma das melhores da série, na qual todo um sistema de cinematografia profissional foi criado junto de paraquedistas olímpicos para possibilitar que as cenas fossem gravadas em queda livre. E “Moonraker” não para por aí, pois existe uma outra leva de cenas boas que poderiam muito bem ter tornado o longa um sucessor mais que digno de “The Spy Who Loved Me“. Melhorando até mesmo as brigas corpo-a-corpo, o filme aproveita bem a variedade de lugares visitados para, em cada um, introduzir alguma grande sequência de ação. Surpreendentemente, o próprio Brasil rende ótimas cenas no Pão de Açúcar, uma ótima perseguição na Amazônia e, claro, alguns clichês absurdos sobre sexo, carnaval e samba. Mas a maior surpresa foi ver que o tal espaço sideral não é introduzido de graça, pois mostra um esforço visível da direção em criar sequências que usam as singularidades deste local para trazer um tipo de ação nunca vista antes na série. Absurdo? Sim, mas ao menos a equipe se empenha em extrair algo bom dali.
Mas por trás de praticamente todos os sucessos há um grande e evidente porém: todo grande começo termina com algo infeliz. “Moonraker” adota repetida e consistentemente a filosofia de concluir mal seus grande momentos. Por conta do humor, mais intenso que em qualquer outro dos filmes de Roger Moore, o longa sofre por jogar no lixo momentos que teriam sido tão melhores sem gracinhas. Pior do que o muito ocasional grito de Tarzan ou o apitinho de deslizar, sua presença constante é um péssimo casamento com alguns elementos bem absurdos por si, especialmente quando se tenta usar a comédia como um tipo de muleta para eles. É como se o filme se desse uma carta branca para fazer o que quiser, apenas para usar a desculpa de que tudo é uma brincadeira e de que a entonação é leve.
A própria sequência pré-créditos é um exemplo perfeito do modelo seguido várias vezes na sequência. Não posso enfatizar o bastante o quanto acho-a uma introdução perfeita, com fotografia e coreografia em queda livre e as trilhas de John Barry fazendo toda aquela situação apertada ser inesquecível e excitante. Seria perfeita se não fosse, é claro, a infeliz conclusão, que já transforma Jaws (Richard Kiel) em um capanga trapalhão que sempre está fazendo besteiras, sem quase nada de seu apelo ameaçador e invencível de antes. Infelizmente, a repetição deste ciclo é constante conforme novos absurdos e bobeiras aparecem. Quem reclama da fantasia de palhaço em “Octopussy” precisa rever “Moonraker” e Bond usando smoking em pleno carnaval, no bondinho e ainda trocando-o por um poncho e chapéu de caubói ao tema de “Sete Homens e Um Destino“. A não ser que uma viagem não anunciada tenha sido feita ao México, isso não faz sentido algum.
Para completar, tenho tanta certeza de que Lois Chiles é uma das Bondgirls mais bonitas quanto tenho de que ela é uma atriz bem fraca. Denise Richards é bem convincente como cientista nuclear perto de Chiles como Holly Goodhead, uma cientista e astronauta que não convence como tal nem mesmo acerta o tom de suas cenas. Ela é mais outro elemento em uma porção de erros que se esforçam para minar as grandes conquistas de “Moonraker”, as quais não são poucas. Sem o apoio excessivo no humor bobão, talvez este pudesse ser um filme ainda mais surpreendentemente melhor, considerando viagens espaciais e todo o resto. Felizmente, “For Your Eyes Only” voltou aos básicos com uma das melhores história de 007.