Mesmo depois dos filmes da Marvel, Thor nunca foi considerado um dos maiores heróis da empresa. Sua popularidade aumentou, mas ele ainda está longe de alcançar os grandes. Se “Thor: The Dark World” servir de representante para alguma coisa, ele apenas mostra que acontece no cinema o mesmo que nos quadrinhos das histórias do deus nórdico não serem das melhores. Muito provavelmente o mais fraco do Universo Cinematográfico Marvel, ele continua a tendência do primeiro filme de não fazer favores pela imagem do herói, resultando em uma das experiências de super herói mais descartáveis dos últimos tempos.
Jane Foster (Natalie Portman) praticamente perde as esperanças de rever seu amado deus do trovão depois de dois anos sem notícias. Nesse tempo, Thor (Chris Hemsworth) se manteve ocupado trazendo a paz para os nove reinos, mas se vê voltando para a Terra quando Jane desaparece. Investigando uma anomalia dimensional, a garota é levada para o esconderijo de um poder antigo chamado Aether e acaba absorvendo sua essência, o que acorda um inimigo ancestral dos asgardianos. Tirar o poder de Jane pode matá-la, ao mesmo tempo que deixá-lo lá faz dela um alvo vivo para quem busca o Aether. Sem a ajuda de seu pai, Thor depende de Loki (Tom Hiddleston) para ter uma chance de salvar sua amada e o universo.
Um dos maiores problemas com os dois filmes de Thor até então é sua incapacidade de explorar bem os poderes do herói. Tudo bem, ele pode não estar entre os favoritos da Marvel, mas isso não muda o fato dele ser um dos mais poderosos, o bastante para rivalizar a força do Hulk. Suas capacidades dependem muito do roteirista, claro, o que não impede um mar de possibilidades num filme que pode transcender as páginas de uma história em quadrinhos. Como muitos blockbusters provam, ter ação desenfreada e efeitos especiais já não é mais o bastante para um resultado satisfatório. Num filme de super-herói, então, explorar criativamente os poderes dos envolvidos é uma parte importante da experiência. Diferente de “Homem-Formiga“, por exemplo, que aproveita as capacidades do protagonista para introduzí-lo e até para o humor, “Thor: The Dark World” mostra uma incrível insistência em usar as mesmas táticas falhas de antes.
Ele poderia invocar trovões, manipular o clima, rachar a terra ao meio e esmagar seus inimigos com as próprias mãos, mas prefere repetir a rotina de arremessar o Mjolnir para longe só para a câmera acompanhar seu trajeto de volta para as mãos de Thor. Às vezes ele também usa um martelo com 30 centímetros de cabo como se fosse uma grande arma devastadora, o que simplesmente não funciona tão bem como o escudo do Capitão América voando pelo ar, por exemplo. Consequentemente, as cenas de ação sofrem por não terem nenhum grande chamariz além de efeitos especiais e maquiagem, os mesmos que merecem elogios por representar Asgard melhor que a computação gráfica de mau gosto do primeiro filme. Antes uma realidade enfeitada demais para ser a casa de deuses nórdicos, bárbaros trogloditas cuja cultura se baseia na fartura de comida, bebida e sangue; agora um lugar com mais cara de ser o palácio de divindades e realeza. No entanto, isso de nada vale quando não é aproveitado. “Thor: The Dark World” se preocupa em compensar as falhas de sua história com imagens de destruição aleatória quando seria mais interessante aproveitar o material em mãos para algo melhor.
Nunca esperaria uma história cheia de enigmas e nuances de personagem, como não é de praxe do Universo Marvel, porém não reclamaria se ao menos soubessem aproveitar um herói cheio de poderes, um vilão poderoso, conflitos de interesse e nove dimensões diferentes para uma trama melhor do que se apresenta aqui. Talvez não sejam ingredientes o bastante para resultar num “Cidadão Kane”, mas no mínimo poderia ter sido feito algo melhor que um roteiro que mal liga universos, personagens e convenções do próprio MCU. Em teoria, tudo poderia ter funcionado muito melhor. Thor tem dois interesses: derrotar o inimigo que surge e salvar sua namorada, só que ele precisa do inimigo vivo para salvá-la. A partir daí surgem as complicações: Odin prefere esperar o ataque em sua casa, arriscando Asgard e Jane, enquanto Thor prefere atrair o inimigo para outro lugar, mas só pode fazer isso com a ajuda de Loki. Uma coisa leva a outra para criar uma corrente de interesses complexa o bastante — mas não muito — para levar as coisas para frente.
A execução deste conceito é onde “Thor: The Dark World” deixa a desejar. Quando sua ação já não se mostra lá muito eficiente, talvez um elenco de personagens fortes poderia nivelar um pouco mais a situação e dar ao roteiro um pouco mais de substância. Thor até faz um trabalho bom, embora limitado, do herói com menos cérebro que força, ao passo que Odin consegue mostrar muita presença em pouco tempo de tela. O problema é que sozinho Thor não é lá grande coisa, ele funciona muito melhor como um contraponto para outro personagem que contraste suas qualidades ironicamente. Alguém como Loki. Infelizmente, nem ele se salva aqui. Tom Hiddleston interpreta seu amado personagem de forma preguiçosa e é mal dirigido por Alan Taylor, que não sabe quando ou como extrair as emoções fortes de seu ator. Logo, ele e outros personagens se tornam presas de um roteiro que apela para o clichê emocional e, em uma ocasião em particular, usa o artifício mais lamentável que tive o desprazer de ver ultimamente para tentar enganar a audiência. Basta somar isso a um vilão sem personalidade nenhuma e o onipresente humor Marvel concentrado em personagens humanos bestas — incluindo Stellan Skarsgård de cueca — para criar um grande desastre.
Não esperava muito de “Thor: The Dark World” depois de um primeiro filme decepcionante, mas também não achei que veria algo tão fraco. É um filme que mostra quão frágil a fórmula da Marvel pode ser nas mãos erradas, quando uma trama simples carece de ação ou um mínimo de substância para funcionar. O pior do Universo Cinematográfico Marvel e com certeza o mais esquecível.