“Seed of Chucky” começa com um boneco com vida própria sendo usado como atração em um show de circo. Ele é tão feio quanto poderia ser e perfeito para ser uma aberração que atrai o público em massa. Nem nome ele tem, só sabe que é japonês por causa de uma marcação no pulso e que seus pais estão por aí em algum lugar. Eis que ele finalmente encontra sua resposta na televisão quando vê Chucky e Tiffany em Hollywood e é para lá que ele vai, descobrindo que é produto de uma dupla de bonecos possuídos por vodu. Ele só não esperava conhecer o lado assassino deles.
Não, nunca achei “Seed of Chucky” a pior porcaria a ser produzida em Hollywood. Parece que foi comum por um tempo usar ele como referência de filme horrível e de decadência das séries de Terror, que chegavam em níveis absurdos de desespero para se manter relevante. Para quem via de fora, era um retrato bem claro: o personagem não tem mais impacto, então decidem dar uma noiva para ele numa tentativa de reacender a chama e depois um filho numa repetição da medida desesperada. Bem, não seria a primeira vez que isso acontece, uma vez que até o monstro de Frankenstein também ganhou noiva em “Bride of Frankenstein“, de 1935, e uma tentativa de reviver a série em “Son of Frankenstein”.
“Seed of Chucky” é frequentemente criticado por levar a série para um lado cômico muito extremo, esquecendo as raízes originais que fizeram de Chucky um boneco até hoje odiado. Há muita gente que diz não ter medo dos filmes e toma um susto quando vê um boneco do Chucky em tamanho real por aí. Por mais que os filmes não sejam aterrorizantes, a idéia de um boneco assassino ainda tem seu peso. Talvez por saber desse potencial e também de como as pessoas de fato tiveram medo do boneco um dia muitos tenham se frustrado ao ver que “Bride of Chucky” adotou um ar descontraído e auto-satírico, mais ainda quando sua continuação se entregou completamente à galhofa. Mas tudo bem, um novo ar por si não é problema. É o que é feito com ele que tem mais peso na opinião majoritariamente negativa sobre a obra. Ela de fato peca, mas não é tão ruim assim.
Ou, pelo menos, ela começa bem. O humor auto-referencial retorna ainda mais forte, passando um pouco do ponto em que era engraçadinho e esperto da última vez e entrando em um patamar em que até mesmo a vida pessoal dos atores pessoais é envolvida, uma versão distorcida e mais tosca de “Wes Craven’s New Nightmare”. Os eventos dos quatro primeiros filmes dão origem à uma lenda urbana de um casal de bonecos assassinos, os mesmos encontrados num cemitério no final de “Bride of Chucky“. Não só isso, como Hollywood já aproveitou a idéia para fazer um filme de terror sobre a tal lenda urbana usando réplicas dos bonecos e ninguém menos que Jennifer Tilly fazendo a voz da boneca Tiffany. Assim que os bonecos voltam à vida, não demora para Tiffany querer possuir o corpo de Tilly e se tornar humana de novo através da atriz que ela mais admira. Pois é. Ao menos param por aí e não trazem Brad Dourif como o ator que Chucky quer possuir.
Até aí, a comédia a que “Seed of Chucky” se entrega ainda não chega num nível incômodo, ainda é bem aproveitável por conta da presença do tal filho de Chucky, Glen… ou Glenda? Talvez esse seja um dos primeiros filmes de terror a questionar identidade de gênero, mesmo que seja de um jeito um tanto debochado e ridículo, mas que, sim, inclui como tema primário do enredo porque o filho nunca foi humano com gênero definido antes de se tornar boneco, ele só nasce — de algum jeito, sabe-se lá como — um boneco de plástico com tantos órgãos genitais quanto G.I. Joe ou Barbie. Assim como a aventura na Hollywood na vida real rende momentos bizarramente engraçados e inesperados envolvendo celebridades reais, o novo personagem é uma adição quase sempre positivo. Quase.
O grande problema aqui é que o humor não entra como um adicional para a experiência, e sim como substituto da essência que até então sempre foi o Terror ou, no máximo, um humor negro violento. “Seed of Chucky” tem, até o momento de seu lançamento, as mortes menos marcantes e com menor protagonismo de todas as outras. Chega a ser estranho perceber quando tempo é gasto com gracinhas e os planos de Tiffany de tentar se tornar humana de novo, uma subtrama de Jennifer Tilly tentando subir de carreira em Hollywood e os dois pais tentando criar o filho que acabaram de descobrir. O final, especialmente, alcança um nível de ridículo que só destaca as piores qualidades da direção de Don Mancini em sua estréia na posição. Algumas tomadas são apenas feias, outras aproveitam mal os efeitos especiais, ao passo que o final só relembra o espectador de quão ridículo a premissa de bonecos assassinos pode ser, coisa que os melhores filmes sempre conseguiram manter oculta.
O clímax de “Seed of Chucky” é muito ruim. É tosco, é ridículo, começa absurdo e termina lamentável, jogando no lixo a chance de tornar esse filme um pouco melhor nos olhos do público com uma conclusão um pouco mais marcante. Há uma reviravolta boa envolvendo toda a motivação de Chucky e uma cena em particular que… apenas não. Estraga tudo sem mais e deixa o gosto ruim que permaneceu por nove anos até o próximo lançamento, “Curse of Chucky”, que talvez tenha ido direto para vídeo porque o nome da série já estava bem manchado e já não havia interesse mais por ela. Infelizmente, foi esse o responsável por deixar o personagem num limbo existencial por um bom tempo, mesmo que o resultado não seja o mais ofensivo de todos e hoje já tenha se recuperado boa parte da atenção das audiências, por assim dizer.