Atualmente, “Stand By Me” costuma ser lembrado como uma das grandes referências para “Stranger Things”, um filme dos Anos 80 sobre crianças de subúrbio aprontando alguma quando se encontram todos os dias para brincar juntos. Quatro melhores amigos da mesma idade, uma cidadezinha pequena e uma história tornada mais interessante quando vivida por crianças, o tipo de coisa que com adultos não teria a mesma graça. Por outro lado, para adultos esse é um filme acessível como qualquer outro, envolve crianças em uma trama séria e até dramática, compartilhando poucas semelhanças com outras produções como “The Goonies”, “E.T. the Extra-Terrestrial” e “The Breakfast Club”. Não há nenhuma bobeira a se encontrar aqui.
Gordie Lachance (Wil Wheaton), Chris Chambers (River Phoenix) e Teddy Duchamp (Corey Feldman) se reúnem no lugar de sempre, a casa da árvore onde jogam baralho e fumam cigarros. Os garotos têm 12 anos e pouco para se preocupar além de encontrar divertimento na pequena cidade de Castle Rock, Oregon. A novidade inacreditável da vez chega quando Vern Tesslo (Jerry O’Connell) traz uma fofoca sobre seu irmão ter encontrado o cadáver de um garoto desaparecido na floresta. Os garotos decidem fazer uma excursão para encontrar o corpo antes dos rapazes mais velhos, avisar as autoridades e aparecer no jornal como aqueles que encontraram.
Depois de muito tempo passado, é mais fácil encontrar alguém que sinta nostalgia por ter vivido os Anos 80, quando o filme lançou, do que alguém que viveu os Anos 50, época em que a história se passa. Fica claro que “Stand By Me” é direcionado ao público adulto da Década de 80 que foi criança durante a de 50, trazendo uma seqüência imbatível de clássicos de Buddy Holly, Jerry Lee Lewis e The Del-Vikings na trilha sonora para despertar a nostalgia com a idéia mais certeira de todas: música. Mesmo assim, não diria que celebra tanto o período como, por exemplo, “Grease” e “American Grafitti”, ainda há uma cara de filme dos Anos 80 que talvez se dê pela estética e pela premissa mais comum à época de lançamento. Por isso a comparação com outras obras da mesma década e a conseqüente influência no seriado da Netflix.
Sempre gostei de “Stand By Me” por sua ausência quase completa de infantilidade. Muitos filmes com crianças acabam contando histórias infantis para um público jovem, tramas leves e fantasiosas com um toque otimista dominante assegurando que vai dar tudo certo. Existe um fator infantil, claro, é apenas natural em uma história com personagens de 12 anos, um que é pontualmente presente nas brincadeiras, nas piadinhas repetidas e nas zoeiras que um faz com o outro. É o cascudo na cabeça, os xingamentos gratuitos e as ofensas contra a mãe que não poderiam faltar. Eles ainda são crianças, no fim das contas. Crianças talvez precoces, que andam com revólveres na mochila e fumam depois do jantar, mas crianças ainda. Sua perspectiva de mundo é encontrar um cadáver porque isso vai torná-los heróis da cidade, vai colocar sua foto no jornal. O melhor dia na vida de vários zé-ninguém na capital do meio do nada.
Isso traz alguns bons momentos de leveza na história, ocasiões em que se preza pela aventura e pela excitação de sair de casa escondido para acampar e procurar um cadáver no meio da floresta, uma grande coisa para os garotos. Existe a cota de diversão para equilibrar a experiência e não a deixar cair numa seriedade excessiva. As quatro personalidades do grupo fazem toda a diferença nesse quesito de construir uma jornada de várias faces. O humor fica a cargo de Vern trazendo o estereótipo do gordinho atrapalhado tão bem e engraçado quanto o Chunk de “The Goonies”, com Teddy vindo logo atrás como o engraçadão excêntrico do grupo; duas partes humor com duas partes mais sérias a cargo do Chris Chambers de River Phoenix, líder do grupo, e Gordie, o elemento estranho que encara sua existência com mais drama e introspecção que seus colegas.
Para além da superfície envolvendo crianças viajando pelos arredores da cidade, a história trata de assuntos bastante maduros como crescimento e as experiências formativas da juventude, com um Gordie Lachance velho narrando sua história em retrospecto e olhando para tudo como alguém que aprendeu com aquelas aventuras e aquelas pessoas. Nem sempre a presença de um narrador faz a diferença, muitas vezes é facultativo e até desnecessário; nunca quando ele mesmo participa da história de alguma forma. As vivências daquele passeio trazem à tona discussões, não só diversão e um tom juvenil de aventura fazendo aqueles os melhores dias das vidas de todos. “Stand By Me” é um filme sobre amigos que também aborda o fim de amizades. Seria lindo dizer que todos permaneceram amigos até a morte, abriram um negócio juntos e tiveram filhos que também cresceram juntos. Nem sempre acontece assim. As crianças aqui chegam a falar diretamente do futuro e de talvez nunca mais se verem, dos caminhos às vezes escolhidos para si e dos estigmas que limitam desde cedo.
“Stand By Me” é um filme sério, no final das contas. Bem menos animado e infantil do que pode parecer superficialmente. Afinal, a história tem um toque obscuro que soa apropriado quando se descobre que a base é um conto de Stephen King. Permanece um excelente filme sobre a juventude vista pelos olhos de alguém que sente saudade e também consegue perceber os elementos invisíveis na época, quando algo incomodava e não se podia dizer o que era por falta de perspectiva e experiência. Saber valorizar o drama também existente na juventude com certeza faz a diferença na avaliação dessa obra como algo mais que uma dose de nostalgia para os adultos dos Anos 80.