Normalmente tendo a achar que certos filmes são faroestes porque sim. Às vezes a premissa foi lida só uma vez muito tempo antes e apenas o título ficou na memória. Acaba sendo o bastante para plantar a semente errada. Aconteceu com “Hud“, “Bad Day at Black Rock“, “Cool Hand Luke” e agora com “Bring Me the Head of Alfredo Garcia”. Ao menos nesse caso não estou completamente errado porque ele é considerado um neo-western, ou seja, as mesmas convenções narrativas em um ambiente e tempo diferente do Velho Oeste americano. Os personagens dirigem carros, atiram com metralhadoras e andam de terno e óculos escuros sem deixar de lado os dilemas morais e a lei escrita com chumbo.
El Jefe é um barão mexicano, criminoso de alto escalão com recursos infinitos que vive em uma fortaleza no meio do deserto rodeado por homens armados o tempo todo. Mas nem todo esse poder impede que alguém chegue em sua filha e a engravide. Isso enfurece o barão, que exige a todo custo saber quem é o pai. Alfredo Garcia é o nome do responsável. Ele anuncia um prêmio de 1 milhão de dólares para qualquer um que trouxer sua cabeça e a informação se espalha rapidamente até chegar nos ouvidos de Bennie (Warren Oates), que precisa do dinheiro tanto quanto qualquer um.
A história é direta ao ponto. Os primeiros eventos mostram exatamente o que a premissa descreve até o a notícia viajar longe e chegar no bar onde Bennie trabalha. A partir daí a história se desdobra em direções diferentes sem nunca perder o objetivo principal de vista. Mesmo com cenas que aparentemente não acrescentam nada diretamente, ou seja, diferentes do personagem dirigindo seu carro em busca da localização de Alfredo Garcia, o filme pode ser descrito como simplista. A história nunca se desvia o bastante do caminho principal em prol de nada, exceto em momentos raros com um perigo novo complicando a jornada ou uma cena de diálogo tentando aprofundar os personagens. “Bring Me the Head of Alfredo Garcia” até tenta, mas não chega a apresentar um desenvolvimento de personagem ou complexidade, com subtramas acrescentando à principal.
Nem sempre isso significa uma experiência rasa. “Mad Max: Fury Road” inteiro é basicamente uma perseguição do ponto A ao B e depois do B ao A novamente. Até chega a soar estúpido colocando dessa forma, mas é exatamente o trajeto percorrido pelos personagens em mais ou menos duas horas. O outro lado da moeda traz filmes que claramente carecem de conteúdo e se apresentam como uma trama em nível básico, pele e osso apenas. Infelizmente, “Bring Me the Head of Alfredo Garcia” se coloca mais próximo de “Escape from Alcatraz“, um exemplo dessa última descrição, do que da obra-prima de ação de George Miller. Muitas vezes a experiência até chega a ficar um pouco enfadonha por estar estendendo algo simples ao invés de desenvolvê-lo. A duração de 1h52 até soa demais para uma história que poderia ser contada em 1h30 sem as esticadas, por mais contra-intuitivo que seja sugerir que um filme raso deva ser mais curto.
O final é a epítome da experiência como deveria ser. Faz sentido, é a conclusão de todos os eventos prévios e o que dá sentido a eles, representando em um período curto a essência da obra em apenas algumas cenas. Ao menos isso se pode creditar a “Bring Me the Head of Alfredo Garcia” porque o final causa a exata mesma impressão vista várias vezes antes: “É só isso?” O filme acaba sem mais, no final de uma cena que tem todo o tratamento de uma outra qualquer sem relevância. Muito provavelmente é proposital e até faz sentido dentro do tom da narrativa de não glamourizar nada e mostrar as coisas como elas são na visão do diretor, cruas e sem a emoção vista na fantasia e na ficção. Não deixa de ser decepcionante. Seja por ainda parecer raso ou porque a trama novamente vai longe demais e perde a chance de ser mais eficiente sendo mais breve, a janela de uma boa conclusão.
Sendo justo, a proposta da história em termos de abordagem, tom e conteúdo nunca chega a ser terrível. “Bring Me the Head of Alfredo Garcia” funciona por se propor a algo e cumprir tal proposta. Poderia ser mais? Com certeza. É fácil imaginar uma jornada um tanto mais eletrizante no campo da ação. A obra é claramente pobre nesse aspecto de introduzir obstáculos clássicos por falta de orçamento. O dinheiro é gasto apenas onde é mais importante, nos tiroteios imprescindíveis para a trama e ainda assim sem muita sofisticação. O resto da jornada acaba sendo um tanto mais parado, com apenas uma cena digna de menção por ser a única em que algo do gênero acontece. E mesmo assim é um momento tosco: justo quando o protagonista e sua parceira decidem acampar no deserto porque sim, são atacados por uma dupla de motoqueiros sujos e mal intencionados. Oh não, e agora?
“Bring Me the Head of Alfredo Garcia” não faz mal com o pouco que tem, apenas o suficiente para uma história coesa que cumpre sua proposta básica. Temas como obsessão e a flexibilidade da moral sob a pressão do desespero são bem presentes, compõem a parte mais profunda, por assim dizer, da obra. É dessa fonte que nascem as tentativas do roteiro de ser mais do que a busca por homem em troca de dinheiro. A idéia é demonstrar que tal jornada pode ter consequências imprevisíveis por atingir o indivíduo num nível pessoal para além dos perigos externos já esperados. Reconhecer isso na obra já mostra que ela se sai suficientemente bem para ser funcional. Até mesmo o sucesso agrada em certo nível. O único porém é que claramente falta uma ou as duas coisas: maior desenvolvimento ou recurso para fazer isso existir.