“Breaking Bad” teve seu último episódio em 29 de setembro de 2013. Sim, já faz mais de 6 anos desde seu fim e nem parece, sendo que hoje mesmo disse que acabou em 2014 ou 2015. Ele ainda é bastante respeitado e freqüentemente mencionado em rodas de conversa sobre melhores seriados, além de continuar mais ou menos nas mentes da audiência por conta de “Better Call Saul”, um spin-off lançado em 2015. Mas nem tudo isso dá uma boa razão para “El Camino” ser lançado tão depois do final da série sendo continuação direta dele. Difícil imaginar que os comentários são profundos a ponto de evocarem detalhes específicos do enredo de forma que eles seriam rapidamente lembrados aqui.
A ascensão de Walter White e a queda de Heisenberg não foram eventos que afetaram apenas o próprio, pois arrastaram muita gente junto. Sua família, primeiramente, seus inimigos e especialmente Jesse Pinkman (Aaron Paul), o rapaz que fez parte do negócio de metanfetamina desde o começo. Ele também foi o que mais sofreu as conseqüências dessa vida e por pouco o preço não foi alto o bastante a ponto de cobrar sua vida. Jesse escapa por pouco da polícia e se encontra procurado como principal suspeito no caso Heisenberg enquanto apenas busca uma forma de deixar tudo isso para trás e recomeçar do zero.
Lançamentos e novas idéias para projetos não devem depender exclusivamente da expectativa e opinião do público. O contrário seria uma censura automática de novas propostas que as pessoas nem sabem se gostariam porque não há outra forma de saber além de ver em primeira mão. Seria um mercado orientado por gostos e conceitos pré-definidos. Por outro lado, se uma abordagem mais sutil, um tipo de termômetro da audiência, fosse consultado com moderação, talvez filmes como “Toy Story 4” e “El Camino” nunca vissem a luz do dia. Seria de todo ruim? Não. Assim como nenhum desses dois é um fracasso manchando o legado prévio, são projetos sem muito sentido por certas razões. Aqui a idéia é questionável porque se trata de uma seqüência direta de eventos mostrados pela última vez há meia dúzia de anos atrás e, pior, de um arco que já havia tido certo fechamento.
De forma alguma a história de Jesse Pinkman ficou sem final. E se tivesse ficado de fato, teria sido um problema do seriado não dar uma conclusão para um de seus personagens principais e certa irresponsabilidade dos responsáveis de só pensar em retificar a questão tanto tempo depois. Quem assistiu sabe que a sugestão do que acontece já é o bastante para satisfazer a expectativa por um ponto final. Mostrar o que acontece passo a passo não era imprescindível, nunca foi objeto de reclamação e talvez até estabelecesse um problema de ritmo se houvesse sido incluído. Mas tudo bem, a proposta de “El Camino” é expandir um ponto não obrigatório, ainda passível de exploração por focar em um personagem querido.
A trama básica envolve a fuga de Jesse Pinkman do lugar onde aconteceu o último golpe de Heisenberg contra seus inimigos. Ele é procurado pelas autoridades e busca uma forma de fugir sem ser pego, conseguir dinheiro para sumir do mapa talvez para sempre. E é isso. Ou melhor, se fosse só isso, talvez “El Camino” não fosse um filme, apenas um episódio a mais ou um epílogo de meia hora. O filme freqüentemente volta para o passado, como esperado, por razões diversas. A mais justificável é exposição para evitar que alguns eventos do presente pareçam gratuitos, como mostrar por que o personagem está ali e o que ele procura. Outras razões envolvem desde o óbvio, trazer personagens marcantes do seriado para uma participação especial em mais uma cena ou duas, até expandir mais sobre outros eventos apenas sugeridos anteriormente, nunca mostrados diretamente.
O problema é que a maioria não funciona completamente. Mesmo as cenas que explicitam seu propósito, por exemplo, não se limitam ao seu objetivo e nada mais, o que acabaria trazendo atenção à sua função expositiva e isso é sempre ruim. Então se faz necessário introduzir mais conteúdo para a narrativa não ficar seca demais. Essa contextualização da exposição traz consigo cenas extras desacelerando um ritmo que já não começa dos melhores e permanece lento na maior parte do tempo com apenas alguns intervalos em que a situação esquenta e o interesse aumenta junto. O resto é até pior porque sequer tem uma boa razão para existir, então apenas atrasa a narrativa principal e ainda prejudica o ritmo. Tudo faz sentido dentro da história de “El Camino” porque Jesse foi muito traumatizado por suas experiências passadas e é assombrado por elas até hoje, então sempre há uma deixa para um pouco de nostalgia. Não deixa de ser uma meia desculpa para o famoso “fan service”.
“El Camino” é como um lembrete dos velhos tempos. Vários rostos aparecem mais uma — talvez última — vez nos mesmos lugares típicos há tempos não vistos, as mesmas casinhas, diners e, é claro, desertos sem fim da região do Novo México, cenários que podem não parecer nada de mais e se destacam por ambientar situações que só “Breaking Bad” conseguia fazer, qualidade pontualmente resgatada aqui. Nesse sentido, vale pela nostalgia e para quem queria muito esse reencontro com o passado, pois no geral não se acrescenta quase nada. A idéia que o espectador criou antes sobre como Jesse escapa no final do seriado é apoiada por cinco temporadas inteiras de ele e Walter White sempre dando um jeito. Nada de novo, muito surpreendente ou fora do comum é mostrado conforme a fuga em si acontece e isso é um tanto decepcionante por matar um pouco a razão de tudo. Tudo bem pedir a atenção do espectador por 2 horas após mais 6 anos, desde que haja algo diferenciado para mostrar. Não é o que se encontra.