A guerra civil entre Decepticons e Autobots se aproxima do fim. A destruição cada vez mais iminente do planeta Cybertron força os sobreviventes a tomar ação para evitar serem engolidos pela catástrofe e um dos primeiros a fugir é Bumblebee, enviado por Optimus Prime para sondar um possível refúgio para os Autobots. Este lugar é a Terra. Ele chega em meados dos Anos 80 e mal tem tempo para qualquer coisa antes de um Decepticon em seu encalço o danificar em uma luta. Forçado a se esconder, o robô amarelo acorda mais tarde quando Charlie (Hailee Steinfeld) o descobre em um ferro velho disfarçado como um fusca amarelo. Enquanto o robô tenta se localizar e relembrar sua missão, outros Decepticons chegam para continuar a caçada.
Depois do risível, terrível, sofrível “Transformers: The Last Knight“, a última coisa que eu queria ver era outro “Transformers” no cinema. Nunca fui odiador da série como parece ser a norma vigente dos ditos espectadores sérios e seus surtos de desprezo nervoso ao escutar o título, embora eles não estejam errados em dizer que alguns filmes são apenas… lamentáveis. Mas alguns não é o mesmo que todos, nem os robôs sob disfarce são sinônimo de lixo. “Bumblebee” é o melhor da série em muitos anos, é um dos bons e abaixo apenas do primeiro. Sem durações de quase 3 horas de robôs gigantes lutando contra outros robôs gigantes tentando dominar o planeta; sem as bobagens inacreditáveis do mais recente, que aspirou a aprofundar a mitologia de robôs com elementos de Rei Arthur. As ambições são mais humildes neste caso, apoiando-se na recente tendência de ambientar a história nos Anos 80 — vide “Stranger Things”, “X-Men: Apocalypse“, “Wonder Woman 1984” e outros.
Antes de levantar as expectativas irresponsavelmente, vale dizer que o sucesso de “Bumblebee” ainda está longe de algo extraordinário. Não é um dos melhores filmes de ação dos últimos anos ou mesmo de 2018, tal como as surpresas de “Mission: Impossible – Fallout” ou “Mad Max: Fury Road“, pois seu sucesso se baseia principalmente no fato de não se tentar incrementar um conceito simples com idéias mirabolantes. Toda franquia passa por isso: saem um ou dois filmes seguindo a mesma fórmula de perto, então ela começa a envelhecer e surge a necessidade de renovar e inovar. Às vezes são mudanças sutis para diversificar levemente e em outros casos se tenta reinventar a roda. Há ainda o caso infeliz de “The Last Knight“, que tenta este segundo caso usando uma grande quantidade de pequenas mudanças. O conceito da série é simples e nunca precisou de muito mais do que cenas de ação bem feitas, efeitos especiais de fazer o último filme parecer comparativamente feio e um vilão para alimentar o conflito central da trama. Quem assiste a estes filmes — espero eu — não busca mudar sua visão de mundo ou compreender as idiossincrasias de uma realidade diferente da sua. Então, não, não há muita razão para incluir vários supostos aprofundamentos em uma trama centrada em caos e destruição.
“Bumblebee” é uma aposta segura. A violência e intensidade gráfica são tonalizadas para conseguir uma classificação indicativa para crianças; longe de ser um problema porque o foco nunca foi esse. Mesmo assim, nota-se que a agressividade e a seriedade estão um pouco menos presentes na ação, que continua praticamente a mesma. Arranja-se outras formas alternativas e até inteligentes de apresentar o mesmo conteúdo sem que pareça que está faltando algo, como é comum em continuações que tentam abraçar um público maior para fazer mais dinheiro. Nestes últimos casos, é comum não agradar nem o pessoal que gostava de antes, nem os mais novos, que só conhecem um produto capado. O lado menos interessante dessa proposta é ela cortar a presença da ação para explorar mais o lado humano da história, os conflitos da problemática protagonista adolescente com sua vida e mãe, além da relação dela com o robô.
Poderia ter dado muito errado. Novamente, entra-se em terreno relativamente desnecessário ao incluir drama e conflitos pessoais numa briga de robôs; inclusão que chega a tomar espaço da ação, aparentemente o ingrediente mais importante. Bastaria as atuações serem ruins para uma parcela considerável da obra ruir e o saldo, mergulhar de ponta na mediocridade. A surpresa é ver que as atuações não são ruins e até muito melhores do que costuma se ver no gênero. Tirando um momento ou outro de gracinha exagerada ou de melodrama piegas — vindo principalmente de Hailee Steinfeld no papel da adolescente revoltada — todo o resto consegue ser consistente e até impressionar raramente com intensidade e eficiência. Tanto os momentos ruins como os muito bons são facilmente notáveis por levantarem a mesma pergunta: o que diabos eles estão fazendo em um “Transformers”?
Por outro lado, conter-se dessa forma é um tanto limitante também. É o mesmo que não arriscar para não dar chance ao azar. De certa forma, o conceito de “Bumblebee” empresta uma boa parcela daquilo que se viu no original com os humanos aprendendo a lidar com os robôs e tentando escondê-los de possíveis pessoas maldosas. Há aquela sensação de que a história já foi vista antes, porém até esse ponto é cuidadoso e toma cuidado para não ir longe demais. Similarmente, a escolha de contexto toma todo o precaução possível para não limitar seu público. Praticamente todos os elementos escolhidos para caracterizar a década de 80 são opções que a grande maioria dos espectadores conhece, exceto talvez pelos mais jovens: “Everybody Wants to Rule the World”, “Take on Me”, “Bigmouth Strikes Again” e, o rei da lista, “Never Gonna Give You Up”. Tudo soa como uma tentativa de não perder nenhum espectador em nenhum momento, fazer até mesmo os menos familiares com o período sentirem que o conhecem por ouvir músicas populares.
Essa definitivamente não é a renovação da série ou o filme para unir gregos e troianos sob o estandarte de amor aos Autobots, também não acerta na execução a ponto de todo o potencial do conceito ser atingido. No quesito ação e pancadaria, definitivamente poderia haver um pouco mais de tempo com isso e menos com a garota frustada porque tem de usar um uniforme ridículo no trabalho. “Bumblebee” é o melhor filme de “Transformers” em muito tempo, mas o que isso quer dizer? Até o presente momento, por mais que os fracassos sejam minoria, os acertos não estabeleceram um nível muito alto. A definição das qualidades aqui é não fugir muito do que funciona e não errar gravemente em nada. Não é um estrondo, mas já é melhor que nada.