Dizem que um é pouco, dois é bom e três é demais. No caso de “Missão: Impossível”, um é bom e dois é demais da conta. Para “Mission: Impossible II”, Brian De Palma troca de lugar com John Woo, diretor chinês conhecido por seus filmes de ação que não economizam nem um pouco na adrenalina. Em retrospecto, escolher Woo por causa dessa característica faz sentido tendo em vista o que foi feito nos últimos três filmes, todos bastante agitados e em ritmos aceleradíssimos. No entanto, o estilo do diretor não traz exatamente o mesmo tipo de energia dos longas mais recentes, é algo mais relacionado ao exagero estilizado e, infelizmente, muito mais clichê que seqüências únicas com qualidades incríveis e não repetidas em outros momentos da obra.
Ethan Hunt (Tom Cruise) curte férias relativamente tranqüilas escalando cânions no Utah, ao menos para seu padrão peculiar de tranqüilidade. A distância da civilização não impede a IMF de encontrá-lo para apresentar sua mais nova missão: recrutar os talentos de uma ladra profissional, Nyah (Thandie Newton), e descobrir a história por trás de um acidente de avião curioso. Eventualmente, Ethan se vê envolvido numa situação envolvendo um vírus letal que mata o usuário em menos de 36 horas e só pode ser combatido nas primeiras 20.
Dizem que não vale a pena chutar cachorro morto, porém, mesmo sabendo da reputação praticamente unânime de “Mission: Impossible II”, é difícil não encontrar sentimentos fortes quando se assiste. Não porque o filme é surpreendentemente competente no drama e na escrita de seus personagens ou mesmo na criação de cenas de ação de deixar até mesmo o espectador de Sala VIP inclinado em direção à tela em sua poltrona reclinável. Longe disso. Ver como o material se destoa significativamente daquilo que foi apresentado no primeiro é lamentável, especialmente porque todas as novas decisões são de extremo mau gosto. Aqueles que aplaudem novidade por si com certeza ficarão felizes com a mudança de tom, de ritmo e de identidade, no geral. Quanto aos outros que preferem ver mudanças bem justificadas e que agreguem positivamente ao que se viu antes, estes certamente não ficarão satisfeitos com o resultado.
Talvez a escolha de John Woo como diretor tenha sido a pior coisa de “Mission: Impossible II”. Imagino que aqui as águas se dividam entre os que apreciam o estilo de Woo e os que não fazem tanta questão. Toda a ação é executada com os toques do diretor moldando-a em seus padrões de encher toda a qualquer situação com acrobacias e movimentos exagerados capturados em câmera lenta e finalizados com uma grande explosão para distrair os inimigos e possibilitar a fuga de Hunt. É um esquema relativamente rígido que só não se repete constantemente porque há um pingo de noção para aplicar essas características em situações diferentes e em ordem diferente. Mas a essência está ali. Não há como olhar para a tela e pensar que o cineasta tentou aplicar sua identidade a um molde pré-existente. Em outras palavras, como se ele tivesse tentado algo mais ou menos próximo ao que Brian De Palma fez antes ao mesmo tempo que colocasse seus próprios toques.
Isso não acontece. “Mission: Impossible II” é totalmente um filme de John Woo, goste o espectador ou não. As variações dos padrões de ação existem, não há como negar, porém chega a ser tosco como elas são aplicadas. Por exemplo, nem todas seguem o esquema descrito anteriormente, apenas aplicam as mesmas coisas de formas diferentes. Em vez de ser sempre Tom Cruise deslizando pelo chão meia dúzia de vezes num mesmo tiroteio regado a pistolas com 128 tiros no pente, às vezes é possível ver Tom Cruise voando por cima de carros explodindo e fugindo de outra moto, atirando em seu perseguidor em câmera lenta com sua pistola de 128 tiros. Isso sem contar exageros aleatórios como dar um chute num inimigo, que poderia ser um mero chute, mas é representado lentamente com um mortal pra trás; ou mesmo uma suposta perseguição de carro em que uma pessoa joga o carro pra cima do outro porque sim até quase causa um acidente por motivos desconhecidos.
O suspense na execução de um plano com uma chance gigantesca de dar errado para todos não existe mais. Toda a história soa como apenas mais um dia na vida de Ethan Hunt e não tem peso algum ou sentimento de perigo exceto por alguns momentos bem pontuais na trama, como uma das reviravoltas envolvendo a mocinha da trama. Aliás, se fosse apenas isso, uma missão impossível nas mãos da IMF, talvez “Mission: Impossible II” fosse um filme melhor. No entanto, é impossível identificar desde o começo cenas que exalam mau gosto e falta de sentido. Por exemplo, numa tentativa de entrecortar a aproximação de Ethan até seu alvo e um número de dança latina, há primeiramente um problema com o explícito chroma key usado para sobrepor a dança à imagem de Hunt. Mais tarde, após a conclusão dessa cena curiosa, Hunt e seu alvo participam de insinuações sexuais nada sutis e nada espertas, as quais colocam os personagens em posições sexuais como se fosse a única alternativa e, ainda por cima, enquadrando o decote da moça porque isso supostamente é um exemplo de composição de cena sublime.
Talvez as coisas pudessem ter dado mais certo se o estilo do primeiro filme fosse seguido. Claro, a intenção não é pregar um conformismo, uma permanência num mesmo estado sem abrir portas para novidades. No entanto, também não dá para dizer que qualquer coisa nova significa uma melhoria por si. John Woo certamente foi uma péssima escolha para suceder Brian De Palma e, conseqüentemente, “Mission: Impossible II” acabou sendo um típico filme de ação que tenta chamar a atenção com explosões freqüentes, câmera lenta exaltando acrobacias super-estilizadas e um tanto aleatórias do protagonista, tiroteios sem preocupação com munição, contagem alta de corpos e atos espetaculares sem um mínimo de risco por trás deles. De uma boa história de espião a um genérico filme de ação.