O que nos atrai tanto a outras pessoas? É possível pensar que o dito amor a primeira vista pode ser apenas o impacto de uma beleza estonteante. Considerando que pessoas estupidamente bonitas raramente dão o ar da graça, é compreensível que o resultado seja uma impressão marcante. Mas nem sempre dá para dizer que beleza é o único motivo por trás de uma conexão. Às vezes é alguma outra coisa inexplicável e indescritível, significativamente mais forte que a atração física. “Your Name” explora este lado nebuloso de um modo fantástico e surpreendente. Confuso em certos momentos? Sim, mas na medida certa para transformar a bagunça em mistério e evitar incoerência.
Num dia como qualquer outro, Mitsuha acorda sem sentir-se ela mesma. Algo não parece certo, como se tivesse acabado de nascer com 13 anos de idade sem saber quem é ou onde está. Ela tem uma vida pacata e tradicionalista ao lado de sua vó e irmã, fazendo as mesmas coisas e vendo as mesmas pessoas quase todos os dias. Meio cansada de tudo isso, ela deseja ser um menino e morar na cidade grande, exatamente a vida que Taki leva diariamente. De um jeito curioso, os dois se vêem cada vez mais conectados sem sequer se conhecerem.
Mais do que qualquer coisa, esta é uma história complexa. Exatamente do tipo que apresenta uma situação obscura e vai desmistificando-se até o ponto que o espectador entende a dinâmica e pode absorver outras novas complicações. Colocando dessa forma, até parece que é um processo simples, mas “Your Name” é uma experiência que até agora, um bom tempo depois que assisti, não faz todo o sentido pra mim. Se alguém me questionasse exatamente como as coisas acontecem nos mínimos detalhes, não saberia responder todas as perguntas. Talvez assistindo mais uma vez, já sabendo do que acontece, tudo ficaria mais claro. Entretanto, não considero isso um problema porque a qualidade dessa história não se mede pelo nível de detalhe captado pela audiência. Ela está longe de uma obra educativa ou algo do tipo, apenas precisa comunicar o bastante para que a experiência não seja compreensível.
Não quero dizer que “Your Name” recebe uma colher de chá. Embora muito complexo, nunca me senti desinformado demais ou sem entender algo crucial enquanto assistia. É mais ou menos como em “The Big Short“: não saí da sessão com o entendimento de um economista, apenas com o necessário para entender o que o filme estava dizendo. Nesta animação, fiquei sem entender muitas coisas no começo e raramente mais adiante. As dúvidas que surgiam eram sanadas sem demora pelas cenas seguintes e, ao final, nenhuma importante restava. Eu havia captado o bastante para entender a trama e me senti satisfeito. Não foi um dos casos em que a história pareceu dar uma mordida maior que a boca, terminando com pontas soltas e um ar de pretensão.
Sendo assim, a história se propõe a algo grande e faz sua parte. O incrível resultado final faz pensar nas infinitas possibilidades e explicações por trás de uma ligação tão íntima quanto inusitada. No fundo, trata-se de em romance adolescente e, ao mesmo tempo, de muito mais do que isso. Fantasia, drama, humor e até elementos de ficção científica estão inseridos na receita para criar uma experiência longe de todos os clichês que vêm à mente quando se pensa num conto de amor jovem. É o conceito simples de nutrir sentimentos por alguém com a complicação de não saber direito quem essa pessoa é e onde ela está, entre outros que prefiro não mencionar. Todos juntam-se organicamente para criar uma obra que vai bem além do que se imagina inicialmente sem nunca perder seu toque de realidade e fidedignidade.
É impressionante ver como o roteiro ainda vai mais longe e transforma-se para corresponder a trama. Não só o enredo vai longe em termos de complexidade, a narrativa acompanha variando pontos de vista, lugar e cronologia. Essa forma incomum é, inclusive, mais responsável por confusões do que o enredo propriamente dito. Se o conteúdo fosse exposto de uma maneira direta ao ponto, tenho certeza que tudo seria compreendido mais rapidamente e, consequentemente, sem o mesmo charme de uma narrativa ambiciosa que dá certo. “Your Name” alcança desde a fantasia de destino e sonhos impossíveis até a banalidade de desejar alguém para amar e sentir-se confortável com a própria vida. Trabalhando sempre com a dualidade entre o fantástico e o comum, o tradicional e o moderno, o campo e a cidade, o filme liga estes dois pólos opositores usando a angústia, que mostra-se presente em ambas as vidas de Taki e Mitsuha.
Tudo isso é representado por um dos visuais mais intensos que já vi em uma animação japonesa. Só não digo que é a melhor porque ainda senti que alguns momentos têm um ar de fabricados, como desenhos tratados digitalmente para ficarem mais detalhados. A surpresa positiva veio mais consistentemente pela visão do diretor sobre quais imagens usar e quando. Esteticamente falando, ainda sinto falta da qualidade mais artesanal de filmes como “A Viagem de Chihiro“. Além disso, único ponto de que realmente não gostei muito foi o final. Os momento que pareciam perfeitos para encerrar “Your Name” foram deixados de lado. A história foi, então, estendida para abraçar uma entonação que não encaixou muito naturalmente no caminho que estava sendo seguido.
Em suma, é um tanto difícil elogiar um filme que explora um conceito simples de forma tão única sem falar sobre os detalhes da experiência. A minha vontade é comentar cenas individuais e alguns momentos críticos do enredo para ilustrar melhor como algumas das influências de outros gêneros funcionam, por exemplo, mas seria uma injustiça com quem ainda não assistiu. De qualquer forma, sempre há a chance de encontrar uma sinopse que revela mais do que deveria. Não aqui. Assisti a “Your Name” sabendo apenas que era uma das animações de maior bilheteria do mundo e me surpreendi desde os primeiros momentos tentando descobrir o que estava acontecendo. Foi uma ótima experiência, então não desejo nada menos para quem ainda não viu.
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