Não, nunca vi o “The Jungle Book” original de 1967. Para alguns isso pode ser uma heresia ou o sinal de uma infância infeliz, mas para mim significou duas coisas: nunca entrar para os escoteiros porque a atividade do primeiro dia envolvia o filme; e uma chance de conhecer a clássica história quase 40 anos depois de cara nova. Claro, ao menos a premissa e os personagens são conhecidos por qualquer que tenha ouvido o nome Disney na vida; é quase impossível que uma criança não reconheça o nome Mogli ou Balu por aí. Foi sabendo o básico do básico que entrei no cinema e tive uma experiência melhor que o esperado.
A história é mais ou menos a mesma, com apenas alguns toques aqui e ali. Mogli (Neel Sethi), encontrado ainda garoto por uma pantera chamada Bagheera (Ben Kingsley), se criou na floresta com a supervisão de seu mentor. Mas foi com a matilha dos lobos que ele aprendeu a viver na selva, adaptando-se do jeito que pode.Um dia o perigoso tigre Shere Kahn (Idris Elba) aparece e ameaça o garoto, forçando-o a fugir para outra parte da floresta; onde ele encontra o urso Baloo (Bill Muray) e descobre uma série de coisas sobre si e a vida na selva.
Vendo por cima, arrisco dizer que a animação original era um tanto mais infantil e feliz que este remake de 2016. Ao que me parece, abordam a mesma história de maneira muito mais séria e realista, isto é, na medida do possível e sem nunca perder o espírito da obra original. Logo no começo a ameaça de Shere Kahn é clara: ele quer o sangue do garoto e nada menos que isso. Não é uma rixa boba entre menino e tigre, ele demonstra com diálogo e ação que está disposto a fazer o possível para conseguir o que quer. Como um filme sobre um tigre homicida conseguiu uma classificação indicativa tão baixa é uma incógnita, mas não é como se isso atrapalhasse a história; pelo contrário, achei que foi uma adição interessante para o público mais velho. Misturam esses toques sérios com a dinâmica de um filme de aventura juvenil sem criar uma anomalia no processo. Sempre há espaço para um personagem como Baloo sem que o sentimento de ameaça iminente se perca em meio a suas piadas e bobagens.
Não sei como era antes, mas para mim esse filme foi outra daquelas obras da Disney que diz algo relevante por trás de toda a perfumaria. Escondidos por personagens carismáticos, visuais detalhados, cenas fortes e até algumas canções está uma moral interessante. Mogli não é apenas um Tarzan em miniatura, ele é um garoto com dilemas grandes demais para seu tamanho pequeno. Os filhotes de lobo não demoram para atingir a maturidade e superá-lo fisicamente, sem contar que quase todos os animais contam com sentidos aguçados para ajudá-los. Mogli, em contrapartida, arranja jeitos de se adaptar, os quais não são bem aceitos por Bagheera; ele tem de seguir as regras da selva, mas sem suas artimanhas o único jeito de se salvar é voltando para a aldeia dos homens. Não é apenas uma aventura na selva, não é mesmo? Mogli deve enfrentar uma série de conflitos internos e externos para não ter que passar a vida fugindo, descobrir seu papel no mundo e onde ele pertence. De uma forma ou de outra esta é uma história de amadurecimento, um coming of age sutil, se posso dizer.
Por outro lado, me senti um pouco dividido em relação aos tão elogiados visuais. A sofisticação da tecnologia é inquestionável. O mundo não parece falso por nem um momento sequer, mesmo sendo feito com computação gráfica da grama no chão até os pássaros no céu. A única coisa real ali no meio é Neel Sethi e as vozes que dublam os animais. Mas será que tudo é tão impecável assim? Comparada com outras obras que vi em IMAX, “The Jungle Book” não teve uma imagem exatamente cristalina; os detalhes de algumas tomadas complexas não eram tão claros e por vezes pareceram borrados de propósito, como se quisessem esconder possíveis defeitos. No entanto, esta meia-solução é apenas a raiz do problema. De vez em quando eu parava e questionava tudo aquilo que estava vendo. É tudo falso, mas é bem feito, mas é falso! Os animais são fascinantes a ponto de fazer o espectador se perder nos detalhes, enquanto a selva de pixels às vezes ficava estranha com um ator de verdade rodando em seu meio. Seria este um real avanço do uso da computação gráfica ou apenas o “Star Wars: Episódio II – Ataque dos Clones” daqui alguns anos?
Depois de ver “The Jungle Book” admito que fiquei mais interessado do que nunca pelo animação original. Tenho quase certeza que a experiência será diferente da competente mistura de seriedade com aventura e personagens clássicos vista aqui, mas acho difícil me decepcionar com os visuais. Ao menos o desenho não envelhece rápido como a computação gráfica.