Mais do que qualquer coisa, “Scent of a Woman” causou um belo estardalhaço por ser o filme que deu o primeiro e único Oscar de Al Pacino. Desde o começo dos Anos 70, o ator entregou uma atuação excelente atrás da outra. Num período de apenas 3 anos ele esteve em “The Godfather“, seguido de “Serpico” e “The Godfather: Part II“, três dos melhores filmes de todos os tempos, facilmente. Então vieram os anos 80 e Pacino já havia acumulado 4 indicações. Chegando nos Anos 90, outras duas indicações surgiram só no ano de 1993, uma por este longa e outra por “Glengarry Glen Ross”. Enquanto se pode dizer que “Scent of a Woman” e a atuação de Pacino estão longe de ser ruins, não é nenhum absurdo apontar que ele mereceu muito mais por suas outras interpretações. Afinal de contas, quem é lembrado? Michael Corleone ou Frank Slade?
Antes de ficar famoso como o Robin dos filmes do Batman, Chris O’Donnel interpretou Charlie Simms, um bom rapaz que estuda na Escola Baird através de uma bolsa e não se mistura muito bem com o bando de mauricinhos de lá, preferindo ficar na dele quando seus colegas tentam fazê-lo a se misturar. Quando o feriado de Ação de Graças se aproxima, Charlie aproveita a oportunidade para ganhar um dinheiro e viajar no Natal para ver sua família. Mal sabia ele que o simples trabalho de cuidar de um cego seria intenso, pois o tal sujeito é o Tenente Coronel Frank Slade (Al Pacino), um cara simplesmente arrogante e insuportável.
Ainda que eu tenha dito que Pacino mereceu um Oscar mais por outras interpretações do que por esta, não quis desmerecer seu personagem aqui. Sua interpretação é, inclusive, o melhor que “Scent of a Woman” tem para oferecer. Frank Slade é arrogante, chato, ranzinza e cheio de frescuras na relação com outras pessoas. Ninguém pode encostar nele, ele encosta nas pessoas; seu linguajar demonstra pouco pudor, ele fala o que quer, quando quer; e não aceita que ninguém o chame de senhor. Inicialmente parecendo apenas um outro cretino, Slade impressiona conforme Al Pacino arranja jeitos novos de um babaca ainda maior, nunca se limitando a um simples insulto. Não, ele sempre inova na arte de incomodar os outros; seja mentindo, enganando e até agredindo quem estiver ao seu redor, incluindo o bondoso Charlie.
O garoto, por sua vez, não poderia ser mais doce, um verdadeiro exemplo de personagem de um romance medíocre. Talvez por isso seja tão bom ver ele sofrer nas mãos de um cara como Frank Slade, pois nem se quisesse ele poderia fazer algo; qualquer esforço de sua parte seria facilmente dominado por seu singular colega. Para muitos, esta pode ser apenas outra relação de pai e filho, uma relação complicada de onde surge algo maior, e de fato ela parte mais ou menos deste princípio. O que chama a atenção para esta típica relação é exatamente a falta de qualquer simpatia pelo personagem de Pacino. Ele simplesmente não liga, nem mesmo mantém um resquício de amabilidade reprimida em sua mente, só procura coagir Charlie a acompanhá-lo em suas aventuras a qualquer custo. Em “Scent of a Woman”, o filho não demora para se arrepender de ter entrado na vida de sua suposta figura paterna e é justo daí que vem o diferencial dessa dupla: é uma relação quase sádica, mas sempre muito bem humorada.
Os grandes acertos deste longa-metragem estão, em sua maioria, centrados nas horas em que o infame militar está presente, pois é com ele que até cenas simples — como uma visita da alfaiate — tornam-se divertidas. O resto da história, por outro lado, deixa a desejar por não possuir tanta substância. Provavelmente, o diretor Martin Brest sabia que o roteiro de seu longa não era dos mais fortes, então deu a Pacino tantas oportunidades para brilhar quanto possível. Tirando isso, não sobra muito. O arco envolvendo o personagem de O’Donnell é passável, o desenvolvimento em cima de seu passado idem. Sua história de vida, curiosamente, só merece menção por também cair no escárnio de Slade, caso contrário seria apenas outro plano de fundo genérico para tentar enriquecer o personagem — e depois falhar. Infelizmente, essa parte mais sem graça do roteiro predomina mais do que deveria e torna o filme mais longo e cansativo, no geral. Isso sem contar o último ato, inteiramente dedicado à parte de Charlie Simms, que acaba sendo o representante definitivo do contraste entre o excelente e o mediano desse filme. De um lado o cego mais desagradável do mundo, do outro um estudante bondoso e oprimido pelo maldade dos outros ao seu redor. Não preciso reforçar qual deles é melhor.
Pelos motivos citados e outros, variando de pessoa para pessoa, muitos não engolem “Scent of a Woman” como o filme que deu o Oscar para Al Pacino. Um dos maiores atores de todos os tempos ganhar por uma obra lembrada quase exclusivamente por conta de uma cena? É difícil de acreditar, mas ao menos este é um filme divertido em sua grande parte, o que torna tudo um pouco mais fácil de aceitar.