O ano de 1974 certamente foi bom para o cineasta Francis Ford Coppola. Além do majestoso “O Poderoso Chefão: Parte II”, foi lançado também “A Conversação” — ambos tendo sucesso com a crítica. Comparando os dois, a continuação do clássico instantâneo de 1972 obviamente acabou saiu mais na frente que o outro, lançamento consideravelmente menor. Por melhor que um filme seja, este acaba perdendo um pouco de brilho quando posto frente a uma obra-prima. É exatamente isso que acontece aqui. Perto da maioria dos lançamentos, “The Conversation” se sobressai com certa folga, pois a experiência proporcionada não é nada menos que espetacular.
Longe de qualquer tipo de relação com o crime organizado, esta história acompanha Harry Caul (Gene Hackman), um profissional em vigilância, em um novo caso. Sua tarefa é simples: gravar as conversas de um casal e entregar a gravação para quem o contratou. Uma personalidade paranóica e uma crise de consciência, no entanto, complicam seu trabalho quando surge a suspeita de que o casal pode ser assassinado. Seu trabalho já causou falecimentos prematuros antes, mas desta vez Harry mostra-se perturbado pela perspectiva do que seu trabalho pode causar.
Já foi dito uma vez que simplicidade é a receita para o sucesso. Talvez nem sempre, mas ao menos é isso que se vê em filmes como “12 Angry Men“. Este longa-metragem reforça este ponto ao entregar uma história interessante e concisa com relativamente poucos recursos. As localidades são cotidianas, o figurino não foge do habitual, as situações não são lá muito incomuns, cinematograficamente falando, e os personagens não são nenhum exemplo de extravagância. Então o que faz com que este longa seja de alguma maneira atraente? Sua excelência em trabalhar bem com o material que possui disponível. Harry Caul, o protagonista, não foi na época e não é hoje um personagem feito para entrar para a História, mas uma ótima interpretação de Gene Hackman o traz a vida. Elementos como a paranóia, a fervorisidade religiosa e a paixão pelo Jazz criam um ser humano comum e interessante o bastante para levar um filme adiante.
Não há muito para se dizer da história, uma sinopse, por menor que seja, já ilustra bem a premissa. Para compensar esta falta de conteúdo na história, o filme se molda como um estudo de personagem. A vida do protagonista torna-se o foco principal, seus modismos viram as reviravoltas e sua paranóia o MacGuffin de tudo. O uso de Harry Caul como ponto central do longa tem sucesso por representá-lo em perfeita concordância com a atmosfera do resto da obra. O local de filmagem é São Francisco, mas sua aparência é tão sem brilho que até mesmo viajantes entusiastas podem desanimar. A banalidade é possivelmente o traço mais forte de Harry, característica que, como dito, se aplica também ao ambiente. Nada inapropriado, uma vez que o filme é estruturado à partir da vida dele.
Considerando que elementos tão chatos parecem ser interessantes através das lentes de suas câmeras, não é de se duvidar que tudo tenha sido planejado minuciosamente por Coppola. A direção faz um ótimo trabalho na representação destes eventos comuns. Ao longo dos diversos momentos da vida do protagonista, não se sente em nenhuma ocasião que o trabalho de câmera esteja em atividade; embora o resultado final, a semântica amplificada, continue presente. Um simples encontro entre colegas tem muito mais para dizer que outras cenas mais chocantes, da mesma forma que o frequente silêncio do personagem fala muito sobre sua personalidade. Neste contexto, a música também adota um papel ordinário, mas fundamental por conta de sua qualidade. Composta por solos de piano, a trilha sonora ilustra os eventos de forma graciosa, tão sutil quando o nível de sua produção. As agradabilidade das melodias pode até ser proveniente de sua sintonia com a atmosfera da obra, mas acredito que qualquer espectador que dedicar um tempo para ouvir o tema principal concordará que elas são excelentes por si.
O irreconhecível Gene Hackman, muito diferente de seu papel em “The French Connection“, a direção e roteiro fantásticos de Coppola, e a música extraordinária provam que os motivos para se gostar de “The Conversation” são muitos. Se no fim das contas Michael Corleone se sai melhor que Harry Caul, não é porque este longa é ruim, mas sim porque o nível de qualidade de “The Godfather: Part II” é realmente algo raro no Cinema.