Devo dizer que por muito tempo e por algum motivo este faroeste passou batido por mim. Sempre que procurava um novo filme do gênero acabava indo nas décadas de 1960 ou 1970, atrás de atores como John Wayne e Lee Van Cleef ou de diretores como Howard Hawks e John Ford. Admito que, dos atores de Faroeste que fizeram bons filmes, Clint Eastwood nunca foi um dos meus favoritos, mesmo que aprecie e muito o trabalho dele como ator e diretor. Há um tempo atrás dei uma olhada nas listas da AFI (American Film Institute) e me deparei com uma vários Top 10 que abrangiam diversos gêneros, entre eles o Faroeste. Abri para ver o conteúdo e me deparei com obras que já assisti, outras que ainda só conhecia, e outras que nem tinha ouvido falar. Dentro dessa última categoria estavam “Unforgiven”, “McCabe & Mrs. Miller” e “Cat Ballou”. Todos os três me chamaram a atenção, mas definitivamente foi a obra de Clint que me interessou de verdade.
O filme tem sua trama girando em torno da vida de um ex-pistoleiro, que se aposenta depois de se casar. Famoso por ter sido um dos mais competentes assassinos de seu tempo, William Munny arranja uma boa esposa que lhe mostra o erro de suas maneiras. Deste ponto em diante, Munny muda suas atitudes para se dedicar à vida de fazendeiro e de homem de família. Como o longa exibe logo no começo, sua esposa não é mais viva e o trabalho na fazenda mostra-se difícil, uma vez que o protagonista não é competente nela. Num dia qualquer,um rapaz estranho — que se autodenomina “The Schofield Kid”— chega em sua casa procurando pelo ex-pistoleiro. O rapaz quer a gorda recompensa posta em cima da cabeça de dois cowboys que agrediram fisicamente uma prostituta. O problema é que ele não sabe muito bem a arte de matar, o que o leva a procurar a ajuda de Munny nessa jornada.
Um aspecto que acho de extrema importância comentar, e que ficou o tempo todo em minha cabeça, é a fotografia espetacular vista aqui. Posso dizer com segurança que, visualmente, este é um dos filmes mais bonitos que já vi na vida. As paisagens são impressionantes e variadas, apresentando visuais estonteantes ao espectador independente do lugar. Nesta variedade encontram-se planícies, montanhas, cenários urbanos, terrenos verdes, riachos e tudo que possa enriquecer a imagem vista na tela. Os cenários são são só entorpecentes de tão bonitos, mas a maneira como são capturados faz toda a diferença; o que faz a típica cena do caubói cavalgando no pôr do sol ser isso e muito mais do ao mesmo tempo.
Só esse aspecto absurdamente bom já vale uma conferida no filme, mas, felizmente, “Unforgiven” é muito mais que um Faroeste bonito. O que me chamou a atenção, a princípio, foi o fato do personagem principal ser um pistoleiro aposentado há anos. Esta idéia é trabalhada além da simples caracterização, uma vez que ela é refletida em seu desempenho e fica explícito quando ele volta à ativa para mais uma tarefa. Tratando-se de um Faroeste não convencional como este, é apenas apropriado que usem o protagonista para trabalhar mostrar essa característica. William Munny já foi o melhor, assim como o Faroeste já foi um dos grandes gêneros do cinema, hoje ele é apenas um velho enferrujado e distante do costumeiro gatilho mais rápido do Oeste. Em especial, o último tiroteio do filme mostra bem esse aspecto, executando de um jeito incomum uma cena que não seria tão excelente se fosse descrita em palavras. Muito desse sucesso deve muito a toda construção que leva a este grande evento. Uma coisinha atrás da outra vai somando para criar uma verdadeira bola de neve, cada bala sendo uma potente descarga de emoções reprimidas.
Outro fato que tem destaque na trama é a moralidade e as linhas que dividem o bem e o mal. Como em muitos filmes, aqui é mostrado que nada é totalmente branco ou totalmente preto, mas sim cinza. Porém a maneira como a temática é apresentada exibe-se especialmente interessante, pois acontece quase uma brincadeira com o conceito. Vez após vez estes valores são alterados, desde os que já estavam pré-definidos até os que foram se construindo durante a trama. O filme joga um jogo de cabo de guerra o tempo todo: prostitutas que aceitam ser objetos sexuais não aceitam ser desrespeitadas como cavalos; a cidade que prega justiça e tranquilidade vira a cara para certos crimes para manter a suposta paz; assassinos de sangue frio tornam-se heróis; xerifes de chapéu branco mostram ter esqueletos no armário; um individuo fiel aos seus amigos e esposa está disposto a matar por dinheiro.
Tendo todos estes aspectos em seu currículo, “Unforgiven” se apresenta como uma ótima peça que compõe o gênero Faroeste. Seja pelos personagens, pelos cenários ou pela trama, o último trabalho de Clint Eastwood no gênero certamente agrada em todos esses aspectos. Sem dúvida é uma obra competente o bastante para ganhar um lugar em minha lista de melhores Faroestes de todos os tempos.