Já faz um tempo que não escrevo por aqui e faz ainda mais tempo que estou para escrever esse texto. Acho que a primeira vez que pensei em escrever esse texto foi em meados de 2018, na primeira vez que havia reassistido “The Texas Chainsaw Massacre” depois de criar o Cine Grandiose. E então nunca escrevi. Por qualquer motivo que me foge, criei a postagem, subi as imagens e ficou num eterno estado de “Rascunho”, um constante lembrete de que eu nunca havia acabado — ou sequer começado — aquele texto. Eis que agora, depois de mais alguns vários anos, decidi fazer uma maratona de todos os filmes da série “O Massacre da Serra Elétrica” no Halloween. Então, sim, atrasado mais uma vez para a minha própria festa. O lado bom é que acredito que tenho uma boa memória, além do fato de esta ser a quarta ou quinta vez que vejo o filme, e essa última me trouxe uma apreciação maior do que a prévia em 2018.
Há um motivo para “The Texas Chainsaw Massacre” ter se tornado um clássico e ser até hoje uma referência de excelência no gênero do Terror. Primeiramente, ele é um fortíssimo precursor de todo um subgênero tão popular nos Anos 80 que praticamente centralizou todas as produções do gênero em si durante um tempo. Sim, todos sabemos da história de como “Psycho” e “Peeping Tom” pavimentaram o caminho em 1960, e também como “Halloween” foi um pilar para outras produções nos anos seguintes. No meio desse caminho, a obra de Tom Hooper aparece ainda antes da de John Carpenter com um modelo praticamente de enredo pronto para outras séries seguirem beat por beat.
A história acompanha um grupo de jovens amigos que viajam de van e acabam passando pelo interior do Texas para visitar o túmulo do avô de Sally Hardesty (Marilyn Burns) e acabam encontrando uma série de bizarrices no caminho. Assim que eles precisam parar para abastecer a van e descobrem um posto sem gasolina, o grupo decide sair para explorar a área enquanto não conseguem uma solução, mas o que encontram vai muito além de suas expectativas para uma viagem tranquila.
Bom, não é preciso nem ir muito longe na descrição do enredo, pois além de muito popular é evidente o que acontece de errado com os jovens desavisados entrando em terreno desconhecido. E é esse modelo de enredo de visitar um lugar sem saber dos perigos que ali moram que uma centena de outros slashers seguiram. Claro, não foi algo absolutamente novo porque a convenção da mansão mal-assombrada, por exemplo, data de muito tempo antes de 1974. A questão é que um cenário tipicamente americano usado como plano de fundo para algo terrível. Eis que não se está mais em Nova York, Los Angeles, locais populares, nem em um local tipicamente suburbano e familiar: é o meio do Texas. Quente, inóspito, quase sem vida, dificilmente um lugar que as pessoas visitariam por conta própria, de fato um lugar anti-turístico. E o que se encontra lá? Para não resumir a um bando de caipiras desalmados e fora de controle, há uma descrição mais interessante a ser encontrada no sentimento de insegurança econômica e instabilidade política dos últimos anos do mandato Nixon, por exemplo. Subitamente, um grupo de adolescentes que só gostaria de curtir um pouco é arrastado para um cenário hórrido contra sua vontade, uma situação que nunca quiseram viver e são forçados a viver contra suas vontades. A realidade se mostra mais forte que seus desejos.
A representação disso, claramente, é exagerada ao máximo e não busca ser uma exploração nem aprofundada do cenário americano sociopolítico nem uma ilustração verossímil do que a população vivia. Em suma, uma hora o mundo alcança até mesmo quem nada quer com ele, quem procura algo e encontra outra coisa no lugar. Tobe Hooper busca ir ainda mais a fundo, provocando o espectador a tratar os eventos extraordinários como fatos, como uma representação verídica e documental. “Este filme é baseado em fatos reais”, ou algo parecido com essa famosa e redundante frase, pois fatos apenas podem ser reais. Há uma aspiração de ser algo a mais aqui, de ser mais do que um produto pensado em um formato pré-fabricado. “The Texas Chainsaw Massacre” não só atinge esse patamar por sua excelência, evitando a possibilidade de soar presunçoso em suas aspirações, mas também por ajudar a construir e definir um gênero inteiro ao apresentar uma execução de conceito ímpar, particularmente por ser verdadeiro à sua proposta.
De uma forma bastante relativa e com uma dose razoável de suspensão de descrença, “The Texas Chainsaw Massacre” é um filme realista. Ao contrário de alguns filmes futuros que tomam uma série de liberdades para que as coisas funcionem da forma que os cineastas pretendem, há um sentimento de que a obra aqui busca se aproximar de uma atmosfera mais realista do que de costume. Por exemplo, enquanto exemplos mais sutis, de certa forma, trazem as vítimas correndo e sendo alcançadas sempre por um Jason Voorhees que caminha, há sempre outros que abusam, como “Scream VI” e seus personagens com muitos pontos de vida sobrevivendo a cinco, seis ou mais facadas como se isso fosse razoável até mesmo em um cenário fantasioso de filme. “The Texas Chainsaw Massacre” busca ser nu e cru, direto ao ponto. Sem buscar criar mortes criativas, espetaculares, chamativas ou nada do tipo. O assassinato é breve e objetivo. E faz sentido, considerando quem os antagonistas são e qual sua real intenção por trás dos atos. Mais do que isso, são louváveis algumas performances na criação de uma atmosfera tensa e aterrorizante. Não uma que dá medo, exatamente, pois essa é uma discussão longa e talvez até infinita sobre o que causa medo de fato e se um filme de Terror é mais ou menos bem-sucedido de acordo com a percepção do espectador de sentir medo.
Enfim, a forma como “The Texas Chainsaw Massacre” se apresenta é peculiar porque já de início se entrega a uma série de propostas diferentes, do realismo documental ao humor negro à violência explícita e ao terror de viver uma situação de vida ou morte. Marilyn Burns, a protagonista, é colocada não só em risco de morte imediata mas também em contextos em que deve sobreviver da forma que pode. Ela grita com toda a potência de seus pulmões, berros com vontade e fidedignos, feitos para edificar um sentimento em um momento em que palavras não funcionam. Em termos simples, ela grita muito e grita bem. Não só isso, ela tenta fugir para valer: corre, corre e corre mais um tanto. A atenção dada para estes momentos em que a personagem apenas quer fugir e é mostrada de fato correndo em tomadas longas e sequenciais mostra a tal preocupação com o realismo. Fugir não é tão simples e não há soluções fáceis. Ela corre o máximo que pode, se machuca no caminho, manca e continua em movimento sempre, abastecida pelo medo e pelo desespero.
“The Texas Chainsaw Massacre”, apesar de simples em sua construção e de aparência que reflete sua limitação de recursos, é extremamente consiste no que se propõe a apresentar. Mesmo tendo pouco dinheiro, há espaço para ambição e terreno fértil para sustentar essa ambição usando as ferramentas limitadas ao dispor. É o baixo orçamento com charme, que não tenta nada fora do seu alcance nem se acomoda na sua modéstia, mas busca explorar ao máximo o que tem ao seu dispor. Seja brincando com a noção de tentar enganar o espectador com o aviso de história real ou, ao menos, estabelecer uma estética documental aliada ao argumento para tentar causar uma impressão mais forte. No fim, a simplicidade funciona a favor de “The Texas Chainsaw Massacre” de forma mais efetiva que os próprios artista que eles esperavam, possivelmente. Não à toa tentou-se replicar com níveis variados de sucesso, vários deles sendo apenas assombrosamente ruins.