Parece não haver sentido escrever sobre alguns filmes. Todo mundo já viu, qual seria a novidade sobre uma análise de “The Terminator”? Tudo bem que ele não é tão popular quanto sua continuação, “Terminator 2: Judgment Day“, mas ainda assim é o primeiro de uma das séries mais populares da história do cinema. Foi seu sucesso que permitiu aquilo que seria uma das melhores continuações de todos os tempos sete anos mais tarde. A não ser que fosse para falar mal ou extremamente bem, não há muito o que acrescentar. Ou talvez haja e eu não saiba ainda. Depois de ter assistido tantas vezes, é capaz de haver algum comentário ainda não proclamada ou, na pior das hipóteses, fica o registro na internet.
No ano de 2029, a humanidade luta com números muito reduzidos por sua sobrevivência contra um exército de máquinas que domina o planeta. Uma inteligência artificial independente chamada Skynet toma controle de todas as máquinas do mundo e se vira contra os seres humanos, exterminando a maioria e metodicamente caçando o resto, que se reúne em guerrilhas lideradas por um homem: John Connor. O plano da Skynet é cirúrgico ao enviar um Exterminador T-800 (Arnold Schwarzenegger) ao ano de 1984 para assassinar Sarah Connor (Linda Hamilton) antes que John nasça. Ao mesmo tempo, um dos soldados da rebelião, Kyle Reese (Michael Biehn), é enviado junto para proteger Sarah dessa ameaça.
“The Terminator” é reminiscente de uma época em que eu só assistia aos mesmos filmes. Minha suposta vida de cinéfilo se resumia a colecionar os DVDs do que eu gostava para poder assistir duzentas vezes até cansar. E por um bom tempo minha coleção se resumia a todos os das séries “Sexta-Feira 13”, “Brinquedo Assassino”, “A Hora do Pesadelo”, outras de terror e, é claro, “Exterminador do Futuro”. Eu via e revia todos. Quando queria ver algo novo, voltava para algum no começo da fila que fazia tempo que não rodava no aparelho. Por um bom tempo só havia três filmes da série até chegar um quarto uns anos mais tarde e, mesmo assim, esse último não era dos mais assistidos, não sendo coincidência que é o único não analisado no site até o momento. Resumo da história: eu assisti muitas e muitas vezes. Vi até cansar e continuar assistindo de qualquer forma porque não existia nada como Netflix. Meu descanso chegou quando comecei a abrir espaço para coisas novas em vez de rever as antigas e, assim, fiquei muitos anos sem assistir. Com certeza desde que o site começou, pelo menos uns 7 anos.
Esse não é o tipo de obra de que se esquece. Toda as cenas ainda estavam frescas na memória, a ordem delas e até mesmo alguns diálogos. Detalhes menores se perdem, claro, porém fiquei surpreso como a maioria se conservou. Seria pela repetição ou porque “The Terminator” é marcante de fato? Por que não os dois? Se não fosse bom, com certeza não teria colocado para rodar tantas vezes, muito mais que “Omen IV: The Awakening”, por exemplo. Não havia problema em rever a mesma coisas tantas vezes porque sempre havia alguma coisa a mais para descobrir e reinterpretar para um garoto que nem sonhava em levar cinema a sério. Isso foi muito antes do tempo dos vídeos de YouTube “explicando” finais e trazendo teorias sobre toda e qualquer coisa lançada. A graça era descobrir pela primeira vez que, sim, existia um paradoxo temporal inerente na história. Sem pensar muito, Sarah Connor é uma constante temporal como a mãe de John Connor. E quem é o pai? O John do futuro já existe no começo, concebido por algum pai desconhecido. Então a trama se desenrola e as coisas começam a se conflitar de uma forma que faz o espectador pensar que há um quê de inteligência ali naquele filme de ação popular.
Perceber pela primeira vez que havia mais substância do que “I’ll be back” e “Come with me if you want to live”. Bem, eles estão viajando no tempo e isso tem consequências. Isso foi um começo. Provavelmente teria sido um detalhe absorvido mais rápido hoje em dia, que na época foi negligenciado talvez porque tudo que está na linha de frente de “The Terminator” é entretenimento de muito bom gosto. Não adianta pintar a obra com termos bonitos, ainda é um filme de ação que fez sua fama porque há Arnold Schwarzenegger falando poucas linhas de diálogo com seu sotaque engraçado, matando gente em lugares públicos e com a cara estourada revelando um endoesqueleto de metal cromado e olhos vermelhos por baixo. O que leva a obra para frente é sua estrutura de uma longa perseguição que consegue englobar todos os tipos de perseguição que um orçamento modesto permitia.
Considerando todas as circunstâncias, James Cameron fez muito em “The Terminator” com o pouco que tinha disponível. Os dois lados se enfrentam em um arranjo não tão simples de resolver num embate: um dos lados é um ciborgue de quase 200kg programado para ter força sobre-humana, mira perfeita e determinação inabalável; o outro é um humano magrelo de 85kg armado com uma espingarda. Kyle Reese serve para informar Sarah Connor do perigo e ajudá-la a fugir, senão ela seria morta sem nem saber o porquê. Seu trabalho é tentar equilibrar como pode a batalha, o que não é muito. Não é uma luta justa e é isso que torna tudo mais interessante. Em mais um ótimo exemplo de herói vulnerável, a dupla protagonista tenta sobreviver e torce para dar sorte para conseguir superar uma máquina que não dorme, não come e é muito mais capaz.
O conceito da vulnerabilidade chega cedo: Reese aparece no ano de 1984 sem nenhum equipamento ou arma de seu tempo e tem de se virar. Suas roupas são roubadas em uma loja e ele tem uma arma que mal funciona contra o exterminador, ou seja, ele se força a estar sempre em fuga para ficar vivo. Só que até isso funciona na base do improviso. Assim como Cameron não tinha muito dinheiro para investir, o personagem tem de fugir com uma porcaria de uma picape velha que não vai muito rápido. São todos momentos que constroem a tensão central de “The Terminator”. A fuga é constante e acontece de formas diferentes, sempre o suficiente para não parecer um filme de um ato só ou pior, de um truque só.
Nesse meio se encontram também outras cenas de ação de tipo diferente que duas partes se perseguindo pela cidade. Há tiroteios e explosões para coroar o clímax de cada grande sequência e uma trilha sonora synthwave acompanhando todas elas. Um produto de seu tempo e um ótimo, por sinal, longe de ser um ponto que envelheceu mal, pois esse posto é da maquiagem e prostéticos. Talvez as pessoas não lembrem tanto da perseguição depois do estacionamento, mas todos lembram do que acontece depois na delegacia. “The Terminator” ainda conta com o carisma pontual de seus poucos personagens para funcionar melhor, conseguindo fazer até mesmo o ciborgue de Schwarzenegger e suas 14 falas serem marcantes. Afinal, foi ele o personagem mais lembrado ao longo dos anos. Depois de assistir muito aos outros e um T-800 sempre aliado, é interessante voltar para o primeiro e encontrar nele um vilão para variar.