“A Quiet Place Part II” foi uma fonte de frustração antes mesmo de ser lançado. Eis que o mundo está em Março de 2020: notícias de um novo vírus chinês aparecem com cada vez mais frequência nos noticiários, mas como todo bom brasileiro, esperava que a crise de saúde chegasse ao país como apenas uma marolinha. O que acabou acontecendo foi o governo reconhecer oficialmente a pandemia poucos dias antes da cabine de imprensa do filme, que me deixaria levar um convidado e teria uma palestra sobre inclusão. A cabine chegou a ser remarcada uma vez antes de ser cancelada por mais de um ano até que semana passada quebrou essa sequência de adiamentos e finalmente mostrou que o produto, não as circunstâncias em torno de si, não havia espaço para decepção.
Depois de noites de terror quando as criaturas invadem a fazenda dos Abbott, a família consegue se salvar por conta do sacrifício do pai, porém tudo que resta é destruição e memórias infelizes. Evelyn (Emily Blunt), Regan (Millicent Simmonds), Marcus (Noah Jupe) e o bebê recém nascido se vêem forçados a buscar um novo lugar para se instalar. Sua vantagem? Finalmente saber como matar as criaturas eficientemente. Não é fácil, mas é um começo. O problema é que há mais de um tipo de ameaça por aí, já que nem todos os humanos têm as melhores intenções em mente.
Ponderar sobre como se comparam com o original é sempre uma certeza no caso de continuações. É como ir duas vezes ao mesmo restaurante e perceber alguma coisa diferente, talvez uma mudança no cardápio, no atendimento ou na própria comida; algo mudou, restando qualificar se a mudança é positiva ou não. “A Quiet Place Part II” é, em muitos sentidos, mais do mesmo sem se resumir a uma repetição genérica como muitas vezes acontece. Há sempre aquele filme de Ação ou de Terror que prefere não mexer em nada para evitar algum possível problema, entregando para a audiência exatamente a mesma coisa que encontraram previamente. “Friday the 13th” é o exemplo de ouro nesse caso, sendo às vezes forçado a mudar algo para não ser uma exploração comercial ainda mais descarada. Essa segunda parte da obra funciona como uma continuação dessas que trazem algo novo.
Mas que não haja expectativa para uma mudança gigantesca. Imagino que seja restrito o número de possibilidades que um filme pós-apocalíptico sobre alienígenas assassinos com audição aguçada pode seguir. Ou pode ser eu o sujeito sem criatividade para afirmar uma coisa dessa sem realmente me dar o trabalho de sentar e pensar num roteiro. Essa seria a tarefa de John Krasinski, que assina Roteiro e Direção aqui, portanto estaria confiando que ele fez essa tarefa e chegou no melhor resultado que conseguiu. O contrário é sempre muito mais estridente ao exclamar seu desleixo, então é bem mais evidente que o trabalho feito não foi tosco. De forma alguma poderia dizer que “A Quiet Place Part II” só tenta capitalizar no nome do original para ganhar algum dinheiro extra.
Em vez de começar logo onde o primeiro parou, a história traz o espectador de volta para o primeiro dia do apocalipse para mostrar exatamente como todos foram pegos de surpresa quando alienígenas predadores saíram fazendo vítimas às dezenas. Foi um mérito do primeiro filme deixar subentendido como as coisas se sucederam até chegarem naquele ponto presente, com só algumas informações que abrem oportunidade para o espectador preencher o vazio por si. Sendo franco, não é preciso imaginar muito como monstros quase invulneráveis, rápidos, gigantes e letais acabariam com a humanidade bem rápido. Mesmo assim, é uma expansão de universo bem vinda porque se tem acesso aos detalhes antes ocultos, dos sentimentos envolvidos e do caos generalizado que tomou conta de todos ao mesmo tempo, além de introduzir um personagem novo. “A Quiet Place Part II” traz isso como um bônus antes de finalmente voltar ao presente e seguir a história de onde parou, quando Evelyn arrebenta a cabeça de um monstro com uma escopeta à queima roupa.
O diferencial de fato é a nova abordagem em relação ao apocalipse. Ainda se trata de Terror em sua essência, Suspense talvez, agora com um toque de ação para entrar nos conformes da nova premissa. A idéia antes era de se manter confinado em um espaço seguro e controlado, controlar todas ferramentas da fazenda inteligente dos Abbott para que eles vivessem com a maior segurança possível, usando luzes coloridas para perigo e ambientes com isolamento acústico para tentar se aproximar da normalidade, incluindo planos para o bebê que estava por vir. Agora a fazenda está destruída e a família tem de se mudar. A novidade de enredo é essa, sair da fazenda e achar um lugar novo, fim. Nada de muito complexo ou imediatamente chamativo, vale dizer, mas que também indica uma tendência natural ao movimento, de gente se locomovendo e enfrentando novos cenários em vez de fortificar e proteger seu espaço. Ou seja, há ação no sentido literal da mudança de posição e também como influência de gênero. E não só isso, pois funciona muito bem. Conhece-se um pouco mais do que há no mundo para além do mesmo cenário e que tipo de pessoas sobreviveram, além de onde elas estão, todas as perguntas pertinentes para circunstâncias diferenciadas como essa.
“A Quiet Place Part II” traz um tom levemente diferente que permanece tenso do começo ao fim por não se deixar cair no clichê da facilidade. Não é porque há uma forma de matar os alienígenas que esse artifício é explorado repetidamente, banalizando a grande sacada do filme anterior e também a ameaça das criaturas. Existe uma forma de fazer isso, só não é muito fácil ou conveniente. Para piorar, não há mais a segurança de um ambiente controlado como antes, então cresce a ameaça da tendência incrível do ser humano tomar atitudes imbecis em situações de vida ou morte, talvez a maior inimiga de qualquer personagem em um filme de Terror. Claro, nem isso é abusado porque “A Quiet Place Part II” é um filme inteligente demais para descartar personagens por serem mal escritos ou burros demais. Arrisco dizer que supera seu predecessor, mas como faz tempo que assisti, não saberia dizer com exatidão. É uma experiência equivalente, no mínimo.