Corie (Jane Fonda) e Paul (Robert Redford) são os recém-casados mais felizes a desconhecer a miséria em Nova York. Depois de um longo e romântico passeio de carruagem em volta do Central Park, os dois alugam um caríssimo quarto de hotel para aproveitar uma lua de mel inesquecível, mas as coisas enfim tornam para a normalidade. O período de amor acaba e Paul tem de ir trabalhar em seu novo emprego como advogado enquanto Corie fica encarregada de preparar o lar para a vida que eles construirão juntos. Tudo certo e planejado, aparentemente. Os móveis estão a caminho e o apartamento aguarda apenas a chegada de seus donos para vibrar com a energia que só um casal jovem tem, exceto que as coisas passam a dar muito errado. “Barefoot in the Park” conta uma cômica história sobre os sonhos e perrengues que a vida amorosa traz no pacote.
Adaptado de uma peça de teatro de Neil Simon, que também escreveu o roteiro, “Barefoot in the Park” é um retrato daquele momento peculiar em que a juventude entra em conflito com o mundo cão, quando o peso das responsabilidades e das decisões é sentido como um fardo indesejado e desejado ao mesmo tempo. Por um lado, conserva-se a vontade de permanecer naquele jardim de infância da vida em que o risco é baixo e as recompensas, modestas; existe segurança sem a satisfação de ter ambições satisfeitas e objetivos de vida alcançados. Parece que a vida não tem graça até a hora em que a cara é dada a tapa para ver qual o resultado, se o esforço é o bastante ou se é prelúdio para o fracasso. Em palavras mais simples, Corie e Paul estão na transição chata de não saber exatamente como abraçar esta nova percepção das mecânicas do mundo. Eles só querem ficar debaixo das cobertas em um apartamento aquecido e aconchegante, fazendo amor e esquecendo de que existem obrigações, outras necessidades e perspectivas de futuro.
Mas é claro, isso não seria possível nem se eles quisessem só isso para a vida. Além do mais, não haveria história alguma sem esse estopim que, como em toda comédia, resulta numa situação peculiarmente engraçada para os personagens. Os problemas criados são abordados com um tom leve e brincalhão em vez da prática tradicional de usá-los a favor do drama e de problemas reconhecíveis como partes do cotidiano. Pressões emocionais e possíveis crises são encaradas como oportunidades para expor facetas dos personagens de forma que eles pareçam ridículos e desajustados, perdidos e sem noção de como estão sendo bobos. Essa é a graça de “Barefoot in the Park”: introduzir alguns personagens numa situação apertada — literalmente — e ver como eles se saem diante das possibilidades de chacota.
Por mais que a promessa seja interessante, ela é um pouco traiçoeira. Em termos de enredo, “Barefoot in the Park” é decepcionante por seré um tanto previsível. Ter sido lançado em 1967 só mostra que os clichês vistos até hoje já existiam naquela época e que seus efeitos são tão negativos quanto atualmente. Assim, prefiro não dizer exatamente qual é o decorrer das coisas, mesmo sendo bastante óbvio, mas propor um exercício. Se saber um pouco mais sobre a trama for a vontade do leitor, basta ler a premissa, considerar os elementos narrativos em jogo —romance ardente, necessidade de trabalhar, esposa espontânea e jovial, marido engomadinho e correto — e imaginar como eles podem entrar em conflito. O final é especialmente ruim nessa parte em sua tentativa forçada de encaixar um atrito grande do nada, sem uma progressão prévia escalando os ânimos até este nível alto. De quebra, aproveitam o momento para mostrar à audiência porque o filme se chama assim numa longa sequência cheia do mesmo exagero súbito.
Felizmente, “Barefoot in the Park” não é um filme exclusivamente dependente de sua trama para dar certo. Os mesmos elementos narrativos citados anteriormente são mais que objetos da previsibilidade do enredo por serem interpretados por um elenco que dá aos menores coadjuvantes alguma contribuição notável para o conjunto da obra. Um instalador de linhas telefônicas, por exemplo, é facilmente um personagem memorável em suas participações curtas e pontualmente engraçadas mas também por dar inicio a uma outra piada recorrente que é tão boa quanto, se não melhor do que foi visto até então. O maior acerto aqui é facilmente as tentativas de humor. Um bom planejamento e gente competente na linha de frente fazem as piadas serem feitas de muito mais acertos do que erros, uma equação aparentemente simples que nem sempre acertam por aí. E se até o ator do instalador de telefone faz um bom trabalho, é de se imaginar que o resto se saia bem também.
Merecidamente, Mildred Natwick foi indicada ao Oscar por sua interpretação como a mãe de Corie, uma senhora refinada e toda preocupada com chegar pontualmente em seus compromissos, como sair fazer compras com a amiga e chegar em casa a tempo de tomar chá e não ficar muito tarde para a novela. Por que funciona especialmente bem em seu caso? Porque ela se relaciona diretamente com o personagem extravagante e flamboyant de Charles Boyer, um homem que tem o maior prazer do mundo em desbravar o desconhecido e se surpreender, mesmo que negativamente. Tudo vale para o homem . Inclusive, arrisco dizer que é ele o grande destaque em termos de atuação. Para quem só conhecia seu trabalho mais sério e dramático em “Gaslight“, ver algo similarmente brilhante aqui foi ótimo.
E é claro, os dois protagonistas seguem uma linha parecida por constituírem um contraste entre si. A personagem de Jane Fonda é descontraída e brincalhona, sem se preocupar com os detalhes demais para ver as aventuras que o caminho reserva. Ela é do tipo que enche o marido certinho de mil beijinhos para só depois pensar que pode estar fazendo ele se atrasar, ao passo que ele é capaz de querer planejar os mil beijinhos em sua agenda justamente para não chegar tarde. No geral, “Barefoot in the Park” tem boas idéias para uma história cômica e conta com um ótimo elenco, mas as falhas na estrutura logo mostram os sinais graves da erosão mais adiante, os quais são sentidos sem chegar a fraturar a experiência irremediavelmente.
1 comment
Sobre o filme… Descomplicado e sem pé nem cabeça… Não tem enredo lógico e sim um amontoado de situações que também não fazem sentido.. Jane Fonda está impecável pois eu realmente fiquei querendo dar na cara da personagem chata que ela interpretou magistralmente: Corie é instável, mimada, pegajosa e birrenta, que tem momentos de puro egoísmo e carência digna de causar claustrofobia e temor de viver um relacionamento destes. Um belo par, mas ela é psicótica e chata. O que salvou o filme foi o sr. Velasco e Ethel, a mãe de Corie!