Marilyn Monroe. Precisa dizer mais? Mesmo a pessoa mais ignorante sobre a Hollywood Clássica conhece o nome, o rosto e a fama. Já vi até crianças que mal foram ao cinema meia dúzia de vezes saberem quem ela é e a descrevendo como um ícone sexual da cultura popular. Mas as pessoas sabem quem foi ela realmente? Muitas nunca viram algum filme seu e não têm idéia de que ela está mais para a sensualidade ingênua do que para a mulher avassaladora que abusa de sua beleza e enfeitiça os homens a seu bel prazer. Talvez “My Week with Marilyn” não seja a melhor introdução, mas certamente é uma expansão interessante sobre quem a atriz era dentro e fora da tela, além dos efeitos dificilmente imagináveis desse contraste.
Tudo começa com o grandioso Laurence Olivier (Kenneth Branagh) planejando seu novo filme. Ele assume o papel de diretor e ator, mas quer que o atrativo seja a participação de Marilyn Monroe (Michelle Williams). Mal sabia ele que por trás dessa grande estrela havia uma dor de cabeça estratosfericamente maior. Também sem ter menor idéia de onde estava se metendo, o jovem Colin (Eddie Redmayne) arranja um emprego na produção do filme e conhece a loira mais famosa do mundo de perto. Talvez até perto demais. Sua ambição era começar uma carreira no cinema, mas ele nunca achou que conheceria Marilyn Monroe já em seu primeiro trabalho.
O poder de uma estrela — o tal “Star Power” — mal precisa de provas de sua eficiência. De qualquer forma, um reforço a ela pode ser encontrada em “My Week with Marilyn”, no qual Marilyn Monroe é, de longe, o principal atrativo. Mesmo morta há quase 50 anos, ela é a a alma deste longa — na falta de um corpo. Michelle Williams como atriz principal é, ao contrário do que pode-se pensar, a grande responsável por garantir que Marilyn Monroe esteja viva e ativa. Sua atuação ressuscita a imagem de uma estrela já falecida sem distorcer fatos para corresponder a uma imagem do senso comum. Ela está focada em trazer a tona não apenas a personalidade cinematográfica da atriz mas também tudo o que não era visto na tela, onde apenas os bons momentos eram vistos enquanto o lado ruim ficava na imaginação do público por meio de comentários de diretores e outros. Sem dúvida, o maior mérito de Michelle Williams é deixar de ser Michelle Williams para tornar-se Marilyn Monroe.
Dito isso, é um prazer extra para o espectador que conhece atuações prévias de Monroe vê-las novamente, mesmo que seja na pele de outra atriz. O falar suave, a infantil postura de quem nunca sabe o que está realmente acontecendo, as respostas simples que não diziam muita coisa e continuavam sendo interessantes de ouvir… Esta é Marilyn Monroe para além de sua beleza, que dificilmente será esquecida e se mantém bem fresca na memória das pessoas. Quem poderia esquecer o cabelo louro e a pinta no rosto? Ou mesmo o belo par de pernas revelados em “The Seven Year Itch“? Pois bem, “My Week with Marilyn” fala disso e de todas as coisas que as pessoas esqueceram ou nunca souberam. Junto da beleza e da sexualidade quase inocente havia uma pessoa com problemas pouco elegantes, alguém que era uma estrela e carregava ambos os benefícios e dificuldades deste status.
Chega a ser comum associar a figura de um artista brilhante com algum tipo de temperamento peculiar, genialidade com loucura. Pois não foi Van Gogh, um pintor extraordinário, que cortou sua própria orelha e suicidou-se com um tiro na barriga, de tantos outros lugares que poderia ter escolhido? Quantos artistas incríveis não morreram jovens e saíram de suas vidas para entrar para a história? O que aparentemente é uma verdade universal, na verdade não passa de uma conexão fraca, falsa e incompleta. “My Week with Marilyn” explora esta questão e a desmistifica quando escolhe uma das das maiores estrelas de todos os tempos para mostrar que problemas pessoais e idiossincrasias psicológicas não são imprescindíveis para a genialidade. Elas fazem mal e destroem o indivíduo, embora não se fale muito disso porque aparentemente só importa pensar em beleza e talento.
No entanto, não há nada moralista em “My Week with Marilyn”. Substituindo algum tipo de ferramenta expositiva que faria mal à obra, o personagem de Eddie Redmayne surge como a testemunha perfeita para a realidade da atriz, pois com ele nasce um ponto de vista profissional e pessoal. No lado da intimidade, por exemplo, ele presencia diretamente a relação patológica entre talento e questões pessoais quando vê pessoas virando o rosto para um problema real e evidente porque julgam fazer parte do processo criativo ou aceitam porque sabem que o resultado final valerá a pena. Pior ainda: certos indivíduos têm contato o bastante com a atriz para saber que aquelas atitudes não são saudáveis e, ainda assim, fingem que não é nada de mais. Tratar um mal-estar psicológico como se fosse um resfriado ou atribuir culpa aos outros é pior que não fazer nada, pois serve como uma meia-solução e uma medida paliativa para um problema que só tende a piorar com o tempo. Não muito surpreendente, as coisas terminaram com tragédia eventualmente.
Com isso, não se resolvem nem os problemas grandes, nem os pequenos. Estes últimos, melhor descritos como hábitos irresponsáveis e pouco profissionais, ao menos poderiam ser corrigidos mais facilmente se uma atitude saudável e construtiva fosse adotada por aqueles próximos à atriz. Um trabalho mais complexo seria necessário para atingir a saúde mental, claro, mas a vida seria mais fácil para Marilyn e seus companheiros de trabalho se uma postura correta existisse. E, assim, Colin traz consigo mais um privilégio: acompanhar o lado profissional da atriz. Embora mostre a situação injusta na qual Marilyn Monroe é colocada, “My Week with Marilyn” não a trata como santa ou algo do tipo. Existiam problemas reais e não resolvidos, sim, assim como imaturidades típicas de uma pessoa que nunca teve de se preocupar porque sempre houve alguém para fazer isso por ela. Este é o lado insuportável do qual atores e diretores comentaram ao longo do tempo, que tinham certa razão ao exigir competência, esforço e comprometimento dela assim como exigiam de qualquer outro membro do elenco.
Nem tudo é culpa de Monroe e nem tudo é culpa dos outros. A relação entre essas duas partes, cada uma com sua parcela de responsabilidade, resulta na amálgama de sofrimento, imaturidade e talento na forma de uma loira de curvas voluptuosas. Ao mesmo tempo que ela deixava parceiros de trabalho furiosos, como Kenneth Brannagh demonstra bem a ponto de me fazer concordar com ele em alguns momentos, ela também sofria muito pelo tratamento ineficiente de questões sérias carentes de atenção. Falar do quanto Monroe foi passiva por se deixar levar pelos outros é uma conversa para outro momento, já que não é um ponto abordado aqui. Quanto a retratar a atriz como uma figura paradoxal e arranjar um personagem que proporcione um ponto de vista único sobre sua vida, que é a proposta “My Week with Marilyn”, dificilmente posso reclamar. Exceto por um foco exagerado e irrealista no lance romântico entre o protagonista e a atriz, o resto mostra-se muito agradável.