Não, “The Mummy” com certeza não faz parte do 6º Olhar de Cinema. Se fizesse, seria um candidato fortíssimo para pior filme do festival. Começou ontem a onde de notícias sobre a recepção absolutamente negativa deste remake. Alguns chegaram a dizer que é o pior filme da carreira de Tom Cruise enquanto eu fiquei surpreso com tal avalanche de críticas. Até tinha gostado do trailer. Pareceu que estavam realmente reinterpretando o material em vez de soltar algo parecido com as obras de 1932 e 1999. Por um lado, fizeram justamente isso. Se fazem isso bem, já é outra história.
Nick Morton (Tom Cruise) e Chris Vail (Jake Johnson) são oportunistas de primeira. Eles aproveitam que rebeldes árabes destroem relíquias antigas para roubá-las e revendê-las no mercado negro. Numa dessas aventuras, os dois se deparam com a sepultura subterrânea de Ahmanet (Sofia Boutella), uma princesa do Antigo Egito. Em vida, ela acreditou que herdaria o trono de faraó até que esse destino mudou com o nascimento de um filho homem. Ela recorreu à Set, o deus da guerra e desordem, para se vingar de quem lhe fez mal, mas foi detida antes de concretizar seus planos e mumificada viva. Quando seu lugar de descanso é violado, sua fúria é lançada sobre o mundo novamente.
Este é o pior blockbuster que eu vejo em um bom tempo. Esperar que outro remake entre vários lançados não vá prestar é uma coisa. Muito improvável é imaginar que vá ser tão ruim como “The Mummy”. Curiosamente, não achei o trailer ruim. Fiquei menos pessimista, se posso dizer. Então o filme começou e uma vinheta bem legal seguiu a clássica apresentação da Universal: “Dark Universe”, dizia o texto. Em adição ao anúncio de que o estúdio juntará os monstros num universo só, essa vinheta foi apresentada para mostrar que realmente falam sério. Aí o filme começou e obliterou qualquer sinal de que isso poderia ter sido uma boa idéia.
A abordagem desse universo compartilhado é apenas o começo de uma progressão geométrica de problemas. Talvez juntar os monstros clássicos do cinema funcionasse se tentassem algo como um “A Liga Extraordinária” decente. Contudo, fica bem claro que esse não é o caminho que começaram a trilhar. De alguma forma, seguir os passos que a Marvel deu até chegar em “Os Vingadores” soou mais apropriado. Usar personagens do Terror no mesmo modelo de filmes de super-herói. Como poderia dar errado? “The Mummy” se esforça para mostrar que consegue piorar mais ainda essa idéia ruim.
Quem quer que tenha sido o responsável pelo fiasco — estúdio, diretor ou roteiristas — mostra que não tem nenhuma noção do que Gênero Cinematográfico significa. Terror costuma focar naquilo que aterroriza o ser humano, representar o objeto amedrontador metaforicamente ou literalmente e levar a audiência à tensão de enfrentá-lo. Já a Aventura envolve a jornada de um ou mais personagens através do desconhecido, enfrentando desafios variados no caminho. Este último modelo ainda pode ser casado com a proposta da Ação: sequências ambiciosas e cheias de adrenalina. De certa forma, são esses os resumos de características que “The Mummy” poderia ter seguido. Em vez disso, ele traz a aventura de dois protagonistas incrivelmente desinteressantes enfrentando a ameaça de uma múmia anciã. Esta, por sua vez, não é assustadora ou imponente e tem uma expressão idiota. Sequer consegue ser uma antagonista boa o bastante para render cenas de ação decentes. É o embate mais insignificante do milênio.
Imhotep pode descansar tranquilo: sua imagem de vilão nem chega perto de ser rivalizada. Ele teria de ser muito ruim para se equiparar ao nível de Ahmanet e seus poderes mau explorados. Ela suga a energia vital das pessoas e as revive como cadáveres podres. Sua estratégia? Enviar repetidas vezes estas criaturas reanimadas e esperar que isto funcione. Varia apenas o contexto em que isso acontece, ainda assim sem evitar que pareça a mesma fórmula usada várias vezes preguiçosamente. Mas o pior não fica a cargo das sequências de ação desimaginativas, dos personagens abaixo da superficialidade ou da história plenamente fraca. Todos estes incomodam muito, só não tanto quanto a necessidade compulsiva de tentar fazer um filme de Terror e Aventura ter um lado de Coméda. Desde o começo, “The Mummy” tenta muito ser engraçado. O personagem de Jake Johnson é escrito especificamente para este fim e, como muitas coisas aqui, isso se traduz de forma terrivelmente falha. Johnson só tem sucesso em parecer um ator testando para um papel cômico e se saindo muito mal. Tanto que é vergonhoso como cada palavra de sua boca tem um tom de piada e não consegue extrair um sorriso amarelo sequer. Eventualmente, até Tom Cruise entra na brincadeira e, sem surpreender ninguém, vai tão bem quanto seu colega.
“The Mummy” tem tanta coisa errada que é difícil dizer qual o grande culpado pelo desastre. O roteiro certamente não coopera em fornecer uma história cativante ou personagens minimamente decentes, porém já não tenho tanta certeza se a tentativa de humor é totalmente culpa sua. Cruise, por exemplo, não parece estar no estado de espírito para fazer piadas quando as faz. Se seu personagem fosse escrito como brincalhão, seria mais fácil para o ator entrar no espírito bem humorado, o que leva à uma possível falta de direção. Vendo como a ação é mal executada, não tenho problemas em pensar que a direção de Alex Kurtzman tenha sido igualmente falha em dar suporte aos atores para suprir os deslizes do roteiro. Os sustos — ou como de praxe, tentativas de — só reforçam que o fracasso é generalizado. É ação que não empolga, uma vilã que não impressiona, terror que não assusta e uma aventura descartável.
Se tenho algumas coisas boas para falar de “The Mummy”, estas são tão raras que não consigo citá-las sem ser super específico. Acho que a parte boa ficou no trailer, pois todo o desenvolvimento das idéias lá apresentadas resultam em frustração. Até a parte ruim, que poderia render risadas involuntárias, decepciona. Nem dá para rir da desgraça. Eu não sei como a Universal vai levar adiante sua idéia de criar sua equipe de “Vingadores” com a Múmia, o Lobisomem, Dr. Jekyll e Drácula, mas se este primeiro filme indica alguma coisa, é que o futuro promete outras decepções.