É sempre um grande prazer quando o Cine Grandiose é convidado para analisar um filme pelo próprio diretor. “Road to the Well” é um suspense de Jon Cvack lançado em Junho de 2016; um mistério direto ao ponto, muito bem fotografado e um ponto fora da curva quando tantas produções independentes parecem desconhecer a importância de uma história. Felizmente, o poder deste filme está nas imagens e no que elas tem para contar ao espectador: mais do que fotogramas bonitos, um suspense com viradas cômicas e frequentemente interessantes. Não é uma trama excelente, contudo. Ela é engajante, mas alguns pontos questionáveis tiram o espectador da experiência por tornarem o filme confuso.
Frank (Laurence Fuller) é a definição de perdedor. No trabalho, ele é chutado como um vira-lata por seu chefe e seus colegas; e não é muito diferente em casa. A vida o derruba e ele fica no chão por ter se acostumado a ir para lá tantas vezes, a faísca da ambição já sumiu faz tempo. Então ele encontra Jack (Micah Parker), amigo de infância que tem vivido uma vida de eremita, e tudo vira ao avesso. Quando Frank percebe, ele está num carro com uma mulher morta no porta-malas e sem saber direito o que fazer a seguir.
Posso estar falando o óbvio, mas a fotografia faz um excelente trabalho. É relativamente difícil encontrar um filme independente mau fotografado por aí, por pior que ele seja, no geral. A primeira preocupação parece estar ligada à estética acima de tudo, talvez numa tentativa de mascarar o baixo orçamento. Assim, até mesmo o pior roteiro é representado por imagens belíssimas. “Road to the Well” conta com uma direção de fotografia espetacular, melhor até mesmo que muitas dessas outras produções independentes. A iluminação enriquece cenários comuns, como uma cabana na floresta ou uma casa de subúrbio, enquanto cenários naturalmente mais ricos são um espetáculo à parte. Quando um filme tem tantas cenas de diálogo, um acerto como esse é muito bem vindo.
E claro, os envolvidos nos diálogos são uma parte importante se eles pretendem ser minimamente interessantes. Praticamente todos os personagens apresentados, mesmo aqueles com pouco tempo de tela, são bem escritos o bastante para fazer o espectador lhes dar atenção. Não digo tanto se importar com eles, pois “Road to the Well” é mais sobre o que seus personagens fazem do que sobre o que é feito a eles. Felizmente, também, pois acredito que a trama falharia rapidamente se este fosse o caso. Quando o mistério se instala e Frank acorda semi-nu com uma faca sangrenta dentro da cueca — seja lá qual for o sentido disso — a figura de Jack tem um papel bem importante nisso tudo. Ele cai de paraquedas na história e parece não estar contando tudo que sabe. A suspeita se levanta, mas nunca é confirmada por uma atuação competente de Micah Parker. O mesmo não pode ser dito de Laurence Fuller, por outro lado. Ele é incrivelmente bom em interpretar um perdedor, um cara que respira e trabalha por inércia, sem ligar para sua calvície em progresso ou suas roupas mal ajustadas. Esse lado bobão do personagem é essencial para os eventos do começo do filme e a trama é engajante logo cedo justamente por conta disso. As coisas dão errado na vida de Frank tanto porque ele tem má sorte quanto por ele não se esforçar para elas darem certo. É o começo da conexão entre escolhas e consequências explorada diretamente pelo roteiro mais adiante.
Então a história começa a se desenvolver em algo mais complexo. Ela já capturou a atenção com dois personagens divergentes, o passivo e o que sabe melhor onde pisa, e uma mulher apodrecendo no porta-malas, faltando apenas elaborar um caminho para explicar como ela chegou ali e como os dois vão sair dessa. O mistério os leva a buscar um jeito de se livrar do corpo e acabar com aquele pesadelo logo. É uma jornada e tanto, mas nunca fica claro por que eles têm de ir tão longe para simplesmente enterrar uma mulher morta; parece mais é que não souberam desenvolver o embrião do enredo — um inocente arrastado para um assassinato — fazendo com que ele fosse esticado e complicado até que ficasse longo o bastante. O resultado? Muito mais confuso e injustificado do que complexo, algo que só piora quando Frank está envolvido. É quando o enredo exige mais de Laurence Fuller que ele se mostra insuficiente, arrastando “Road to the Well” junto dele para mais perto da mediocridade. O final de tudo, em especial, indica claramente que o personagem está passando por mudanças. Sua personalidade de panaca abre espaço para novos traços, mas Fuller mostra-se incapaz de acompanhar as exigências do roteiro; ele fica para trás e, logo, algumas viradas da conclusão fazem o longa perder o que sobrou de fôlego nos momentos finais.
Com um roteiro que sabe criar diálogos naturais e personagens interessantes, mesmo alguns sendo óbvias caricaturas, “Road to the Well” aproveita seus sucessos principalmente por seus personagens e por sua fotografia. É apenas quando a trama começa a se desenrolar que os problemas começam a surgir, seja por complicações aparentemente desnecessárias, viradas mal explicadas ou as limitações de um dos atores — o que pode estar ligado à direção também. No fim das contas, acredito que seja um bom começo para o diretor Jon Cvack, pois ele sugere afinidade e compreensão do que realmente importa numa produção cinematográfica: contar uma história. Mesmo que essa não seja das melhores, Cvack se importa com levá-la para frente sempre. Já é muito, considerando que tantos aspirantes à cineasta falham justamente nessa tarefa tão elementar.