Filmes sobre Música como “Beautiful Dreamer: Brian Wilson and the Story of ‘SMiLE’” contam uma história e informam seu conteúdo de forma amigável com o espectador casual. Se este não souber nada sobre a banda em questão com certeza mudará um pouco isso ao ver tantas informações em forma de filme. “Baby Snakes” é a empreitada de Frank Zappa no ramo de documentários sobre música, embora o filme seja mais do que isso — e talvez menos por não administrar essa idéia ambiciosa tão bem. Acima de tudo, vale dizer que esta obra é bem melhor aproveitada pelas pessoas que já são familiares com o trabalho de Zappa.
Em vez de simplesmente contar a história de Zappa, de sua banda, de um disco ou até de um show específico, “Baby Snakes” reúne três focos em um filme só: algumas cenas perdidas dos bastidores da banda, com algumas entrevistas e conversas; as psicodélicas animações em massinha de Bruce Bickford; e um show da banda realizado em 1977 no Teatro Palladium de Nova York. Tudo com a extravagância característica da banda e sua música. Parece a receita para o sucesso, não? Não exatamente. Certamente existem pontos positivos aqui, mas diria que a mistura desses 3 elementos não é um deles; talvez por eles não se ligarem muito bem, talvez por não haver um roteiro propriamente dito. De qualquer forma, acredito que fazer as coisas seguindo as regras não era bem o estilo de Zappa e sua banda, então restou ao espectador torcer para que a qualidade aparacesse no meio de tanta bagunça.
Curiosamente, ela deu as caras. Não tanto para tornar esta obra uma jóia rara dos documentários de Rock, mas o bastante para segurar as pontas e evitar o desastre. Inicialmente o longa apresenta cenas dos bastidores do grupo, com palhaçadas entre eles, ensaios e alguns comentários dos membros; os quais são intercalados com as animações em massinha de Bruce Bickford e com pedaços do show até que a última hora é dedicada exclusivamente ao concerto.
Sinceramente, o começo é um tanto parado e bizarro. Os comentários e as cenas de bastidores parecem mais uma gravação amadora e não foram muito divertidos ou informativos. Não conheci muita coisa além da dinâmica dos ensaios e do clima descontraído; coisa que já não é lá uma grande surpresa para quem é familiar com o trabalho do artista. Afinal, não teria como fazer toda aquela sátira num clima sério. Por um lado isso agrada os fãs pelo menos um pouco que seja, por outro mostra-se como um tanto insuficiente se o espectador busca conhecer algo novo com essa obra. Some isso às ocasionais sequências de animação e o resultado é um filme não muito amigável para o espectador casual, especificamente aquele que não conhece muito bem a música de Frank Zappa. Tomo como exemplo as animações mostradas frequentemente em “Baby Snakes”: sensacionais, criativas e detalhadas, mas no contexto do filme acrescentam pouca coisa. Uma pessoa dirigindo um carro diminui de tamanho e fica pequena num assento imenso, depois escala o volante enquanto o carro entra num túnel estranho que, na verdade, é um tipo de amálgama de partes do corpo humano em constante mudança. Se essa descrição pareceu louca é porque as animações são isso mesmo, muito mais até. O problema é que acho que a audiência não procurava um filme sobre artes plásticas, por mais que Frank Zappa tenha se impressionado com o trabalho de Bruce Bickford a ponto de colocá-lo no longa.
Em meados da última hora de filme as coisas melhoram para todos quando a atração principal torna-se a performance de grandes sucessos da banda, sem animações psicodélicas e sem abuso sexual de bonecas de borracha. Toda aquela extravagância e esquisitice passa a ser traduzida em forma de música, respondendo quaisquer dúvidas sobre o método de trabalho da banda conforme ritmos são interrompidos e substituídos por melodias cada vez mais surpreendentes e variadas. Nunca esquecendo de deixar espaço para bobeiras tipo deixar a audiência subir no palco ou usar brinquedos de criança para criar melodias do zero. A competência dos músicos e da criatividade de Frank Zappa é mostrada claramente a qualquer espectador curioso; ela satisfaz os fãs de longa data com apresentações de alto nível e dá uma chance de conhecer o som para aqueles que não conheciam antes.
Outro porém — talvez um pouco menor e irrelevante — é a duração desse filme. Novos fãs podem definitivamente surgir após assistir a “Baby Snakes”, o problema é que a experiência toda dura em torno de 2h40. Isso é longo para um filme tradicional, quem dirá para um filme sobre música, então algumas pessoas podem se espantar. Há uma versão de 90 minutos desse longa que ainda não vi, mas imagino que seja uma versão muito mais enxuta do que é visto aqui. Se o interesse permanecer após tantos detalhes negativos, recomendo uma conferida nesse longa. Caso haja apenas curiosidade pela música de Frank Zappa, fica a dica dos álbuns “Sheik Yerbouti” e “You Are What You Is”. Se nem isso surgir, evite “Baby Snakes”.