Mistério normalmente é algo bom quando se fala em história. Assim como o conflito, é um elemento que frequentemente leva a trama para frente e deixa o espectador ligado. Onde está Carmen San Diego? Quem matou Laura Palmer? Pai, por que me abandonaste? São todas questões válidas, sem dúvida alguma. No entanto, a mais importante aqui é: do que diabos “Hail, Caesar!” se trata? Pelos trailers me pareceu uma comédia inteligente num contexto atraente, os anos 50. Ver o filme, por outro lado, me deixou com tantas dúvidas que preferia ter visto apenas o trailer.
A princípio a trama acompanha o dia-a-dia de Eddie Mannix (Josh Brolin), um executivo do Estúdio Capitol que resolve problemas onde eles aparecem. Seus métodos e ideais e métodos nem sempre são os mais aceitos, mas ele faz questão de se confessar seus pecados na igreja diariamente, como fumar um cigarro. Saindo de lá ele começa sua rotina: visitar sets para acalmar diretores, cuidar da imagem de grandes atrizes e suas gafes, manter as estrelas do estúdio ocupadas e… procurar por um ator que sumiu sem deixar traço. Se este fosse só mais um sumiço aleatório Mannix colocaria o problema na fila, mas quem some é Baird Whitlock (George Clooney), o maior astro de sua época.
Pode parecer uma história relativamente direta ao ponto: um cara atarefado deve dar conta dos problemas em suas vidas pessoal e profissional e ainda torcer para os filmes serem um sucesso. Em teoria, é isso que acontece; na prática, a história é outra. Lendo sobre esta obra me deparei com alguém que falava que considerava “Hail, Caesar!” uma obra de nicho, um prato cheio para os que gostam da Hollywood clássica. Isso é apenas meia verdade. Sim, quem viu “On the Town” e sabe um pouco sobre a vida pessoal de Bette Davis com certeza terá seus dois segundos de orgulho por pegar as referências, mas elas estão longe de fazer o longa valer a pena. É complicado, na verdade. Não é porque sou apaixonado pelos Anos 50 — algumas de minhas obras favoritas são do período — que enxerguei este filme melhor, embora deva admitir que a parte boa é feita justamente dessas cenas. Qual é o problema então?
Para responder essa pergunta volto a uma que fiz antes: do que diabos “Hail, Caesar!” se trata? Tirando o personagem de Josh Brolin não há nada que ligue muitas das sequências aqui. Para piorar, ele não está presente em várias e em outras faz pouca diferença. Mas o que me chateia de verdade é que as sequências são muito boas, isoladamente falando. Em tempos de referências para todos os lados — e até memes sobre isso — é interessante ver como os irmãos Coen conseguem criam um ambiente rico sem limitar seu público. Não é nenhum absurdo imaginar que algumas personalidades excêntricas — como Bette Davis e Joan Crawford — existiram no regime controlador dos estúdios sobre seus atores. Afinal de contas, se um sabonete for segurado com muita força ele escorregará. Ver uns filmes antigos é apenas um pequeno pró, pois o conteúdo é acessível e fica ao alcance de qualquer espectador. Basta ligar os pontos que o próprio longa fornece.
Por si, essas cenas são ótimas. A direção dos Coen, a escolha de elenco, a fotografia e a coreografia, no geral, são sublimes. Ache bom ou ache o suco do lixo, não há como botar defeito tecnicamente. Mas como ressaltei em outros textos, aspectos técnicos não são a receita para o sucesso de uma obra. Numa visão geral, não há como saber para onde o enredo de “Hail, Caesar!” quer ir. Falta um esqueleto, uma idéia, algo mais forte que um ambiente para evitar que tudo pareça uma montagem quase aleatória de curtas-metragens. Onde os irmãos Coen querem chegar com tudo isso? Se o objetivo era desviar a atenção do espectador de um suposto arco de história, então este longa é um sucesso. Caso contrário é apenas uma grande confusão de boas idéias mal costuradas.
No fim das contas, apenas perguntas sem resposta surgem de tudo isso. O enredo inexistente conta com um humor leve e quase em segundo plano como suporte, além de várias sequências que ressuscitam o espírito da Hollywood dos Anos 50. Estas são executadas tão bem que apenas alguém doido pelos charmes dessa época conseguiria fazer. Ou será que esse amor realmente existe? É impossível saber. porque o filme não fala nada ao espectador. Qualquer noção de conexão entre sequências de cenas — ou seja, uma idéia por trás do todo — é inexistente. Não dá para saber se os Coen querem criticar Hollywood clássica ou fazer uma carta de amor a ela; se querem criticar os comunistas ou quem os perseguia; se querem contar uma história boa ou fazer a audiência escrever textos reclamando do filme.