Este é outro exemplo de filme que, assim como “Rope“, chama a atenção por ter sido feito em uma época muito restritiva. O exemplo não é exatamente igual, pois a obra de Hitchcock chama mais a atenção por sua direção incomum; ao passo que “The Ox-Bow Incident” se difere da maioria por sua sórdida temática diferente dos bons humores de Hollywood. Ter temas incomuns não é a única coisa que torna este filme único, entretanto, este também é o último filme da história a ser indicado ao Oscar de Melhor Filme e nenhum outro.
Gil Carter (Henry Fonda) e seu parceiro acabaram de chegar na cidade de Bridger’s Wells, onde os ânimos não estão muito alegres: vários ladrões de vacas têm atacados as fazendas da região. Em um destes ataques, um vaqueiro querido na cidade é baleado e tem várias cabeças de gado roubadas. Os habitantes se mobilizam para tomar uma atitude tão logo que recebem a notícia de que os ladrões foram avistados por perto. Um pelotão de cidadãos indignados se forma e sai para buscar justiça, arrastando Carter e seu amigo — suspeitos por não serem bem conhecidos — nesta jornada com pouco compromisso com a lei.
Quando apropriado, sempre tento reiterar como a realidade de Hollywood ao longo dos anos afeta o Cinema da época — e consequentemente o filme analisado. Assim como “Rope” e “The Lost Weekend” — de 1948 e 1945, respectivamente — este longa-metragem é da época em que o controle sobre a produção cinematográfica a tornava quase industrial, quase todas as etapas eram fortemente supervisionadas pelos estúdios. Cineastas como Frank Capra estavam no comando do mundo de finais felizes Hollywoodianos, mantendo o cinema como uma versão romantizada da realidade. Nada disso está em “The Ox-Bow Incident”. Este é um filme simples, pouco ambicioso em termos de orçamento e com uma história carregada de dilemas, significados e controvérsia.
Com apenas 75 minutos de duração, este pode ser facilmente considerado um filme curto. Justamente por isso digo que ele vai direto ao ponto por não perder tempo com sub-tramas e enrolação do enredo. Por este motivo ver este longa é uma experiência pouco cansativa, é fácil ir do início ao fim sem perder detalhes ou se distrair; ainda mais quando os diálogos são pontuais como a própria trama. Eles falam o que têm para falar sem reboleios, colocando o dedo na ferida sem medo das consequências daquelas palavras. O filme inicia com os dois forasteiros chegando na cidade sob olhares suspeitos, então revela-se que aqueles que balearam o fazendeiro estão nas redondezas e o grupo de cidadãos sai para caçá-los. Mal dá tempo para respirar e os três supostos bandidos já estão para serem enforcados. No entanto, ninguém sabe se eles realmente são os culpados. Os cidadãos usam rumores, meias verdades e uma situação desfavorável para incriminar os rapazes e provar para o mundo que estão fazendo justiça, de alguma forma que só eles enxergam.
Sempre menciono também como a moralidade é um tema recorrente nas obras de Velho Oeste, mas, pensando bem, posso dizer que “The Ox-Bow Incident” é o Faroeste mais moral de todos os tempos. Não por ele ser correto ou apresentar personagens bem educados, e sim por ter conflitos morais como seu principal — e talvez único — tema. Como dito, a história não demora para chegar no parte do julgamento dos três homens, acontecimento que toma grande parte do filme e no qual o dilema moral é mais discutido. Desde que o dilema entra em cena as coisas passam de uma busca pelos bandidos para um mergulho nas profundezas da mente do ser humano. De início, tudo parece estar bem certo: os bandidos foram encontrados, só falta passar o julgamento e prosseguir com a sentença. Porém, no decorrer destes planos supostamente simples, tudo toma uma forma diferente do planejado. Os bandidos não são preto no branco e as circunstâncias levantam a dúvida. Como proceder? Tudo estava tão amarradinho que a lei nem precisou ser respeitada. O grupo, que só poderia ser oficializado por um xerife, foi encabeçado por um delegado e poucos falaram de um julgamento justo nas mãos de um juiz. A lei é tratada como inefetiva por muitos que acham que podem fazer um trabalho melhor.
Mas são eles realmente mais eficientes que a lei? Bons o bastante para estar acima dela? Mesmo se forem, suas ações justificam o atropelamento de algo que gerações construíram? Estes são alguns dos temas abordados por esta obra, que já foi apontada como a versão Faroeste de “12 Angry Men“. No decorrer deste controverso julgamento, facetas ainda mais elementares do ser humano são questionadas: orgulho reinando sobre humildade, egoísmo interferindo na ética, as consequências da irresponsabilidade e como tudo isso molda a moral dos personagens retratados aqui. Talvez a única falha esteja no fato deste longa se resumir a, basicamente, o que é descrito aqui. O protagonista e seu parceiro não são muito fortes, apesar de terem propósito, e os poucos temas secundários são desinteressantes justamente por sua abordagem ser rasa. Ainda assim, quando se fala no que realmente importa, “The Ox-Bow Incident” não desaponta por um segundo sequer.