Antes de qualquer outra coisa, vale apontar que “Antwone Fisher” é a estréia de Denzel Washington como diretor. Aqui, ele conta a história de Antwone Fisher (Derek Luke), um jovem marinheiro que mais parece uma bomba com o contador estragado, explodindo com a mínima provocação. Suas brigas acabam por chamar a atenção de seus superiores, que o rebaixam de patente, o colocam em suspensão e o fazem passar por sessões de terapia com um psiquiatra. Inicialmente, ele não dá o braço a torcer e não se abre nem um pouco com seu terapeuta, o Dr. Jerome Davenport (Denzel Washington), mas o caro doutor é paciente e não vai simplesmente deixá-lo continuar a fazer confusão sem saber o que se passa.
De certa forma, pode-se dizer que este é um filme de estréias dentro do mundo do cinema. Além de Denzel na direção, o longa conta com o Antwone Fisher de verdade no roteiro. Sim, a história é baseada em fatos reais e especialmente no livro “Finding Fish”, escrito pelo próprio Fisher. Embora a adaptação cinematográfica não foque na vida inteira de Antwone, o espectador ainda tem um insight interessante sobre os porquês da vida daquela pessoa. Vendo de forma rasa, esta é outra história do incompreendido problemático que faz suas burradas com um propósito desconhecido por todos; então encontra uma pessoa que muda sua vida e o ajuda a enxergar razão em seus atos caóticos. O pior de tudo é que ela é exatamente isso, rasa como sua descrição.
O esforço em conjunto dos dois iniciantes desaponta por ser totalmente previsível em sua insistência de usar clichês para construir a história. Os vários flashbacks para explicar a trama, o caráter completamente expositivo deles, os personagens com apenas um ou meio propósito na história toda, a tentativa de estabelecer sub-tramas e se perder no meio do caminho… Basicamente tudo o que se espera de uma obra genérica sobre a vida de alguém, o famoso filme que você pega pela metade na televisão e só sabe qual é porque a propaganda dizia que era baseado em uma história real. Pelo menos ainda resta em Denzel Washington uma noção sobre direção cinematográfica, o que evita que o resultado final seja manjado como “The Boondock Saints“, no qual o formato usado pelo diretor fica totalmente explícito pela sua repetição descarada.
Ainda assim, isto não é dizer que seus esforços são satisfatórios. Sua colaboração infelizmente reduz a história a uma série de meias sentenças com uma sequência de explicações. Em certo momento do início, por exemplo, o psiquiatra pergunta se o protagonista sabe onde está seu pai, ao que este responde que sim; imediatamente a cena corta para o mencionado pai atravessando uma porta após tomar um tiro de espingarda. Entendo que muito do filme se passa em sessões de terapia, onde a finalidade realmente é revelar informações para resolver problemas, mas o conteúdo nunca deve limitar a forma. Ou seja, terapia não é motivo para uma narrativa pobre, que ainda mostra outros sinais de falha quando uma sub-trama recebe pouca atenção no desenvolvimento e de uma hora pra outra é dito que ela era importante. No fim das contas, é a mesma raiz para todos os problemas: querem que o espectador engula algo como importante apenas porque o filme diz isso, em vez de despertar a curiosidade dele e mostrar porque algum evento merece preciosos minutos de sua atenção.
Se não fosse pela história com realmente algo a dizer, teria de dizer que este longa é uma falha completa. Mas não, a história de Antwone Fisher tem conteúdo e mantém o interesse porque alguns eventos falam por si, apesar de seu caráter comum. Como dito, não é por causa do roteiro ou da direção que isso acontece, mas sim porque o elenco conta com atores que alimentam um pouco a chama da história ao transmitir emoção para uma trama picotada. Dessa forma, se o espectador não se sente sedento pelo próximo acontecimento, ao menos não reclama da forma como ele é entregue. O próprio Denzel faz um bom trabalho como o centrado psiquiatra do protagonista, misturando perfeitamente as qualidades tenras de um marido, a calma de um terapeuta e a austeridade de um militar. Contracenando com esta figura complexa colocam Derek Luke como o próprio Antwone em uma interpretação que usa mais o físico que o falado e se mantém fiel ao personagem estabelecido no começo. Novamente, não é por coincidência divina que o elenco brilha muito mais que outros elementos, ele acerta exatamente onde falei que outras coisas erram. Sabemos que o personagem de Washington é profundo porque sua atuação transmite isso, não porque alguém chega para ele e fala “Nossa, doutor. Você é realmente um cara nota dez!”.
No final das contas, “Antwone Fisher” é uma boa demonstração de potencial desperdiçado. A história é comum, mas tem algo a dizer com aquela situação familiar, ainda mais quando escolhem as pessoas certas para os papéis importantes. Só faltou saber contar bem esta mesma história picotada por flashbacks expositivos, na qual o conteúdo veta oportunidades de explorar o familiar de uma maneira que só o cinema consegue.