Acredito que o segredo para uma continuação boa é o mesmo que para um remake: uma mudança, atualização ou reinterpretação de algo que foi feito. Até mesmo filmes formulares necessitam de um fator mudança para serem aceitos, caso contrário serão criticados por serem muito próximos ao original. O polo oposto, por outro lado, também mostra-se igualmente negativo: se a continuação ou remake desvia-se muito do caminho de antes a rejeição acontece igualmente. Neste caso temos um remake dos bons de um filme homônimo lançado em 1969 e estrelado por John Wayne; ou uma nova adaptação do livro em que a primeira obra com Wayne foi baseada — o que fizer mais sentido para o espectador.
A história, como esperado, é essencialmente a mesma. Mattie Ross (Hailee Steinfeld) sai em busca de justiça após o assassinato de seu pai em uma discussão. Primeiro ela procura a ajuda das autoridades locais, mas encontra seu desinteresse por conta do criminoso estar em um território indígena distante. Eventualmente, recomendam a ela que tente recrutar um marechal através da oferta de uma recompensa. Das três escolhas disponíveis, Mattie vai com Rooster Cogburn (Jeff Bridges) — um bêbado ranzinza, porém bravo pistoleiro — no final das contas. Junto deles está o jovem LaBoeuf (Matt Damon), que junta-se à caçada com seus próprios motivos.
Se eu pensar nas razões porque gostei tanto do filme de 1969, terei um pouco de dificuldade em verbalizá-los apropriadamente, a obra simplesmente funciona em sua simplicidade e seu baixo orçamento. Levando em consideração como é difícil analisar o longa de 2010 sem dar certa atenção à de 1969, digo que, embora esta obra seja agradável, ela não acerta tantas boas notas quanto sua predecessora. Felizmente, uma série de diferenças na abordagem fazem com que a experiência valha a pena simplesmente por apresentar novidades frente ao já conhecido. O visual, por exemplo, é algo que imediatamente chama a atenção por ser de um caráter muito mais sofisticado. Isso pode ser visto facilmente no figurino finamente desenhado, nos cenários de alto orçamento ou até mesmo na limpeza dos cavalos utilizados. Mas nem tudo é concebido de maneira agradável aos olhos, as paisagens devem grande parte de sua beleza aos esforços da fotografia de Roger Deakins; repleta de noites cristalinas, dias pálidos e uma atmosfera envolvente.
A história se manter a mesma significa que a tendência de ser um road movie é mantida; não importa tanto a chegada, o foco é o trajeto até este destino. Neste contexto, o que leva a história adiante é a relação entre os personagens durante a viagem, algo que se manteve relativamente igual ao que se viu antes. Ainda que o modelo seja basicamente o mesmo, o foco nos personagens muda, havendo mais em Matie Ross e menos em Rooster Cogburn. Devo dizer que realmente esta é, de longe, a melhor mudança que fizeram; algo que se vê na atuação astuta e firme de Hailee Steinfeld, que faz valer a pena com folga o foco maior em sua personagem. Até poderia dizer que Rooster Cogburn faz falta, mas infelizmente a atuação mediana de Jeff Bridges evita que isto seja fato. Foi dito que os Coen tentaram estabelecer um nível alto de autenticidade com este filme, tentando deixar costumes, cenários e atuações o mais próximo possível do Arkansas de 1880. Sem dúvidas um objetivo louvável, mas que poderia ser ainda melhor se Jeff Bridges conseguisse cumprir a demanda estabelecida.
Em termos de postura e atitudes, o ator consegue faz sua parte tão bem quanto qualquer espectador poderia esperar; ao mesmo tempo que toda vez que ele abre a boca, há uma onda de frustração no ar. Não sei que tipo de sotaque Bridges tentou reproduzir, mas o resultado dá a entender que ele está engasgando com os próprios dentes enquanto tenta parecer durão; nada como a voz grave e bonita de John Wayne. Isso leva a ouutro ponto negativo desta nova adaptação: a história. Sim, ela é mais fiel ao livro, mas este é um daqueles casos em que a mudança é bem vinda. Imagino que os autores que têm suas obras alteradas em adaptações devem desgostar de tais mudanças, eu mesmo provavelmente não gostaria. A desnecessariamente inexpressiva conclusão do livro é resgatada aqui, sendo o que o filme inteiro evitou ser por muito tempo: desinteressante. Não é de se surpreender que um dos raros momentos em que a direção falha é no desfecho, acredito que já em 1969 perceberam que não havia boa representação que salvasse um roteiro raso.
Por si esta obra dos irmãos Coen mostra-se como um bom Faroeste em uma época de escassez do gênero. Os valores de produção mais altos marcam presença por meio da estética fina, que estabelece um ambiente imersivo, e de efeitos especiais de qualidade, principalmente os de violência. Ao mesmo tempo, a direção deixa a desejar ao se prender muito à fidelidade; seja ela relacionada à história do livro, que tem seus defeitos, ou aos maneirismos da época, mal representados na atuação forçada do protagonista.