Como um fã de “The Beach Boys”, analisar esta obra sem compará-la com outros materiais, como o documentário “Beautiful Dreamer: Brian Wilson and the Story of SMiLE“, é um pouco difícil. Uma das bandas mais importantes da América traz consigo uma grande história, talvez grande o bastante para preencher um Épico de conteúdo até o talo. No trajeto de Brian Wilson, muito do resto do grupo acaba sendo elementar para um entendimento mais profundo de sua história. Mas por este longa não ser um Documentário, como o outro título mencionado, algumas liberdades são tomadas sobre o material. Não é algo que eu aprecie, pois nem tudo é exatamente mostrado como aconteceu, porém também não vou criticar pelo mesmo motivo que não o fiz com “Braveheart” e suas incoerências históricas.
A narrativa é apresentada de forma alternada e não linear, centrando-se nos tempos de Beach Boys de Brian e na sua vida reclusa décadas mais tarde. Nos Anos 60, a banda aproveita os sucessos de seus 10 álbuns lançados e a aclamação de suas performances ao vivo. As manifestações criativas de Wilson aumentam de intensidade e o levam a sentir que o grupo precisa de uma mudança de estilo. Eventualmente, ele para de sair em turnê e foca no desenvolvimento de músicas novas, resultando na gênese do aclamado “Pet Sounds”. Já na década de 80, um Brian mais velho sofre com o resultado de um colapso mental do passado, ao mesmo tempo que o terapeuta radical contratado para cuidar de sua condição abusa da influência sobre a vida de seu paciente.
Independente de qualquer coerência histórica que esta obra falhe em satisfazer, esta obra brilha especialmente por causa de seu elenco competente, em especial pelos dois atores que interpretam Brian Wilson: Paul Dano e John Cusack. Há de se argumentar que é incômodo o segundo não ter absolutamente nada a ver com o Brian dos Anos 80 ou com o próprio Dano, diga-se de passagem, assim como Dennis Wilson, Bruce Johnston e Al Jardine não têm nenhuma similaridade com suas contrapartes reais. Apesar deste detalhe visual, Cusack entrega uma das interpretações mais formidáveis do ano por respirar e sangrar como a pessoa que interpreta. É quase absurdo ver como o ator consegue capturar características pequenas como as pequenas pausas durante a fala, uma leve gagueira de emoção ou receosidade. Quem ouvir a voz e o tom simulados pelo ator e tiver escutado o próprio Wilson falando dificilmente vai distinguir o real da atuação, é neste nível que a excelente interpretação atinge o espectador. Paul Dano se dá melhor no aspecto aparência por ser naturalmente mais parecido com o artista em seus dias de juventude, chegando até mesmo a acompanhar as mudanças de peso do artista conforme a situação piorava. Ambas são ótimas demonstrações, mas se alguém merece indicação a algum prêmio, este seria Cusack por ter mais chances de atuar e apresentar uma performance superior no geral.
A história é contada alternadamente, um pouco de cada fase por vez. Começamos com o Wilson velho escolhendo um carro na loja onde sua futura esposa trabalha, para logo sermos introduzidos, quase imediatamente, à sua contraparte jovem em casa conversando com seus irmãos. Até onde importa para os eventos mostrados aqui, este vai e volta entre as duas épocas funciona bem em termos de criar um contraste entre as duas épocas da vida do Beach Boy. O passado mostra como a situação mental foi se escalando até o colapso em meados de 1967, enquanto o futuro lida com o período de reclusão do mundo exterior e eventual aproximação com a futura esposa. Isoladamente, como história e como filme isto já é o bastante para embrulhar a trama e entregar uma experiência, relativamente, completa. Entretanto, como fã da banda minhas impressões sobre esta parte foram um pouco mistas; um lado por gostar muito da banda e, consequentemente, do filme em si, outro por saber que há mais por trás dos panos do que é mostrado.
Conhecendo boa parte da história do “The Beach Boys”, sei que entre o momento em que Wilson adoece e o que ele conhece sua esposa acontece muita coisa. Nada menos que 13 álbuns foram lançados, a maioria com forte participação de Brian. Pode-se dizer que a época do “SMiLE” original foi o clímax das tensões do músico, mas durante anos ele continuaria a cantar e participar ativamente do grupo. Seu declínio foi muito mais gradual do que repentino, como é mostrado. A intervenção de Landy também foi pega pela metade, uma vez que apenas a parte ruim foi mostrada. Não vou defender seus atos, porém mais de uma vez foi dito que o tratamento teve sucesso na estabilização do quadro do artista. O problema é que as coisas foram longe demais e os interesses pessoais acabaram se confundindo com os profissionais, culminando na situação do filme. Ao menos a representação de Landy, mesmo que incompleta, é muito bem ilustrada por Paul Giamatti, em outra atuação notável da lista de sucessos da obra.
O material de base existe em quantidade o bastante para deixar as 3 horas de um Épico sem um momento de tédio, mas a seleção aqui agrega conteúdo o bastante para criar uma história concisa e bem estruturada. Os eventos são simplificados e alguns detalhes são incluídos para que o processo seja mais fluído, às vezes até demais, mas no final das contas as críticas são mais um desejo de mais tempo de filme que qualquer outra coisa.