Há cerca de 13 anos, a EON Productions lançava “Die Another Day“, o vigésimo filme na franquia 007 e o quarto a estrelar Pierce Brosnan como James Bond. Embora tivesse mantido a fórmula dos 19 filmes anteriores, sua abordagem dos elementos clássicos se mostrou exagerada demais para os padrões da própria franquia. Agora imaginem se, ao invés de retornar para as origens do agente secreto em “Casino Royale”, a EON tivesse continuado os maiores absurdos do último filme de Pierce Brosnan. Esse é “Kingsman: Serviço Secreto” em poucas palavras.
Quando as famílias mais poderosas do planeta perdem seus herdeiros para a Primeira Guerra Mundial, suas fortunas ficam sem alguém para recebê-las. Descontentes com a situação do mundo, estas famílias decidem investir em uma organização secreta para manter o mundo em ordem quando todo o resto falhar. Assim nasce o serviço secreto independente. Em uma missão falha, um de seus agentes acaba morto, iniciando um processo seletivo para um novo agente. O rebelde Eggsy (Taron Egerton), um garoto das ruas que não liga para nada, acaba sendo selecionado por Galahad (Colin Firth) como candidato para a vaga ao mesmo tempo que uma ameaça global surge.
Apesar de ser quase impossível não lembrar das entradas mais absurdas da franquia 007, como “Moonraker” e “Die Another Day“, este longa tem alguns méritos próprios, assim como suas contrapartes Bondianas. Mesmo quando os temas vão um pouco longe demais, como palácios de gelo e bases espaciais, sempre há um pouco da fórmula original que evita que o filme seja uma falha total. O que acontece aqui é exatamente isso, existe muito conteúdo passável ou ruim para algumas poucas cenas realmente boas. Muitas delas lembram “Shaun of the Dead” por colocar cenas de ação em perfeita sincronia com uma canção popular ao fundo. Enquanto o primeiro usou “Don’t Stop Me Now” do Queen, o último fez um ótimo uso de “Freebird” de Lynyrd Skynyrd. Em casos específicos como esse, o exagero do longa-metragem casa perfeitamente com a vibração frenética dessas cenas de ação e das músicas que acompanham.
O porém é que dos 129 minutos de filme, não mais que 30 são feitos dessas cenas excelentes. Durante a maior parte do tempo, sequências menos empolgantes e complexas tomam o tempo do tela. Tentando prender a atenção do espectador com uma centena de explosões e até mesmo o terno menos elegante de James Bond. Em alguns casos, como em franquias de Terror dos Anos 80, fazer um filme auto-consciente de sua parte ridícula se mostrou como uma escolha revitalizadora para seu futuro. Neste caso decidem ir além da simples zombaria ao perpetuar as mesmas atitudes que o longa tira sarro. Em “Moonraker”, que leva James Bond ao espaço sideral, mantém certo suspense sobre a direção da trama e das cenas de ação em si, independente do contexto absurdo. Mesmo com uma centena de apetrechos, nunca é exatamente claro quando eles serão usados. Aqui temos vários desses mesmos aparelhos, que não poderiam ter sido usados mais obviamente, estragando assim várias sequências além do nível estabelecido por sua própria execução ruim.
Como dito, mesmo as mais absurdas entradas da franquia Bond têm algumas características que os fazem ser ao menos divertidos de assistir. Cenas ousadas e bem construídas, que colocam o espectador na beira de seu assento, mostram presença aqui, mesmo que apenas eventualmente; ao passo que o absurdo às vezes não é tão longe do aceitável e até consegue ser uma ótima forma de entretenimento. Por serem escassos, tais momentos acabam dando lugar a outros que tentam fazer graça ao sacanear os pontos baixos dos filmes de espião. Dou enfâse ao tentam — e como este filme tenta — pois em não mais que dois momentos pode-se notar uma referência inteligente. É mais do que explícito como se tenta homenagear, tirar sarro, e reproduzir a magia de tais filmes tudo ao mesmo tempo, o tempo todo. Encher de referência aos filmes antigos e falar sobre a franquia 007 sarcasticamente não salva este filme de si mesmo, e por fim chega um momento onde o espectador se vê forçado a simplesmente lavar as mãos perante o nível da vulgaridade mostrada.
“Kingsman: Serviço Secreto” vem para mostrar que ser realmente engraçado não está incluído no pacote de tentar fazer humor. No final das contas, o resultado uma continuação espiritual de “Die Another Day“, caso os produtores tivessem decidido continuar com as armaduras de choque, com os carros invisíveis, com o surfe na tsunami e até mesmo com capangas com espadas no lugar dos pés. Ah, James Bond que me desculpe, os pés de espada foram invenção de “Kingsman” mesmo.