Baseado em uma obra escrita por Robert A. Heinlein chamada “All You Zombies”, conto de ficção científica publicado em 1958, este longa-metragem é a adaptação desta história para o cinema. E apesar do nome sugestivo, não se trata de uma história de zumbis publicada antes mesmo de “Night of the Living Dead” lançar a criatura na cultura popular, mas de uma sobre viagens no tempo conhecidas por sua consistência. É uma das características mais difíceis de se atingir quando o enredo leva seus personagens para o passado e para o futuro. De tudo o que pode-se encontrar em “Predestination”, inconsistência está muito longe de ser nominável.
Com a descoberta da viagem no tempo, uma Agência é organizada para evitar que crimes temporais de meliantes que tentem usar a tecnologia para o mal. Em especial, um homem conseguiu fugir do alcance do Agente (Ethan Hawke) vez após vez ao longo dos anos. Finalmente, na última missão de sua carreira, ele deve fazer o possível e o impossível para capturar o bandido. Uma missão pontual, mas que abre portas que o Agente nunca esperava que um dia seriam abertas. Há mais em jogo do que era aparente inicialmente.
Se devo apontar uma característica extremamente marcante nesse filme, com certeza escolho a maneira adequadíssima como conduzem a trama e o ritmo. Abraçar uma duração relativamente padrão, totalizando 97 minutos, é uma das escolhas que favorecem a economia narrativa e evitam que “Predestination” chegue a ser cansativo ou expanda=se a ponto de morder o próprio rabo em sua ambição. Há ainda o fato dele mais puxado para a Ação, que adiciona movimento e variação de tom para tornar o ritmo tão fluído. Com exceção de alguns momentos aparentemente desnecessários num primeiro momento, a execução da trama é quase impecável. A soma da duração breve com um conteúdo variado ajuda também a simplificar a compreensão das várias complicações inerentes de viagens temporais.
De acordo com os próprios irmãos Spierig, uma fidelidade ao material base foi mantida no filme, mantendo o conteúdo das duas mídias próximos. Ao sustentar essa fidelidade, algumas falhas presentes no conto de 1958 acabam passando para a versão do cinema, uma vez que os diretores decidiram não examinar com cuidado a lógica do autor do conto. Ao manter a lógica original, certos elementos acabam parecendo esquisitos demais para serem possíveis. Tudo bem que uma suspensão de ceticismo se faz necessária em um filme sobre viagens no tempo, mas alguns detalhes são simplesmente muito absurdos para sequer parecer minimamente plausíveis. Mesmo que estes se encaixem perfeitamente na lógica de eventos estabelecida, é difícil acreditar que estes possam acontecer em primeiro lugar. Há de se argumentar que tais elementos estranhos se dão por conta da fidelidade à obra original, mas acredito que se nos cinemas esses elementos ficaram esquisitos, talvez isto tenha uma coisa ou duas a dizer sobre a obra original.
Dentre os elementos positivos desse filme, muitos estão apoiados na maneira como as explicações são reveladas. Reviravolta atrás de reviravolta, pedaços da história vão sendo adicionados ao mistério e no processo destruindo as suposições construídas pelo espectador ao longo da progressão da trama. Nesse aspecto, os irmãos Spierig conseguem se mostrar extremamente felizes ao deixar o desenvolvimento em um meio termo agradável entre colocar o espectador no escuro e deixar tudo previsível demais. Dessa forma, os diretores regulam efetivamente a relação entre pista e compensação, alimentando a história ao espectador de maneira segura e gradual.
As interpretações do elenco são realmente satisfatórias, ainda mais quando muito do próprio longa trata de questões de identidade. Mesmo com vários auxílios de figurino e maquiagem, a maioria dos méritos são das atuações admiráveis do elenco, que fazem o melhor que conseguem, dadas as limitações de roteiro. Enquanto poderia falar mais sobre o desempenho exemplar do elenco, prefiro apenas dizer que estas são formidáveis para não estragar uma das maiores surpresas do longa.
Ainda que sua trama possua alguns elementos bizarros demais para serem engolidos, o filme consegue fazer sentido no final das contas, amarrando as tão comuns pontas soltas quando se trata de viagem no tempo. Além disso, uma condução sólida do ritmo faz dessa experiência, completa de reviravoltas, uma viagem no tempo suave e sem cansaço. A parte que realmente impede que este filme seja melhor do que é, está inserida no já conhecido esquema de ir longe demais na manipulação das coisas por conveniência da história.