Após o sucesso de “Godzilla vs. King Ghidorah“, a Toho viu que a fórmula do sucesso estava em trazer de volta os monstros mais populares da franquia. Poucos meses depois este longa foi colocado em produção, continuando uma leva de filmes anuais que duraria até 1995 com o fim da Era Heisei. Um dos oponentes mais clássicos, se não o mais clássico, é trazido de volta aqui para enfrentar Godzilla. Mothra retorna após 24 anos de sua última aparição em “Destroy All Monsters“.
Para começo de conversa, vale ressaltar o fato que a introdução desse filme é uma demonstração de adrenalina pura: um meteorito cai no oceano e desperta Godzilla, causando um estrondo que logo é sobreposto pelo título surgindo na tela como em um jogo de luta dos anos 90. Mais além, uma equipe é enviada para investigar a ilha perto de onde o meteorito caiu e lá descobrem um ovo gigante. Novamente, o ovo não poderia ser de ninguém além de Mothra. Para complicar um pouco mais a situação, a história coloca na jogada que Mothra é guardiã da Terra e que existiu outra antes de si. Essencialmente, uma versão demoníaca e corrompida da própria heroína. Com isso, creio que já dê para ter uma idéia do que está por vir.
Novamente tentam trazer mensagens moralistas ao enredo, dessa vez tratando bizarramente sobre o relacionamento da humanidade com o meio ambiente em vez de falar da bomba atômica. Mothra sempre foi representada como uma entidade boa, a protetora da Terra que enfrenta a ameaça que for, nesse caso o próprio Godzilla. A origem disso tudo, porém, vai um tanto além do costumeiro. Há milhares de anos atrás, supostamente existiu uma civilização avançada que tratava mal a Terra. Como resposta, o próprio planeta cria Battra para sua defesa, que acaba se corrompendo e tenta destruir seu criador. Mothra acaba tendo de lutar contra ele e no meio da confusão a tal civilização antiga é destruída.
Essa ideia de que a Terra é uma entidade pensante, por mais absurda que seja, é usada várias vezes ao longo da trama. Quando fenômenos naturais ou coisas simplesmente sem noção acontecem, a explicação é sempre que o planeta está se defendendo da natureza ambiciosa dos humanos. Nessa loucura, acabam tentando enfiar a mensagem que não se deve destruir o meio ambiente e que a ganância é ruim para todos. Nada que se compare às fortes mensagens do original ou do filme de 1984, que trabalham esse assunto de uma maneira muito melhor pensada.
Assim como o Rei dos Monstros, Mothra também recebeu uma renovada no design para a Era Heisei; talvez não tanto uma melhoria, mas definitivamente uma mudança. Em termos de estilo, a Mothra da Era Shōwa era mais bonita, tanto na forma de mariposa quanto na forma de larva. Ao invés de uma pelúcia como antes, parece que Mothra é revestida de um algodão molhado, que deixa sua aparência com um caráter de fantasia barata. É curioso como em quase 30 anos não conseguiram um estilo mais realista para o kaiju. Em contraposição, o design de Battra é excelente, tão detalhado, bem desenhado e criativo quanto poderia ser.
No geral, esta obra vai um pouco contra a maré de melhorias da Era Heisei: há um som junto da rajada atômica de Godzilla que o deixa parecido com uma arma de Sci-Fi dos Anos 50; além da movimentação de Mothra em sua forma de larva, que parece rolar em rodinhas em vez de rastejar como antes. Esses são alguns deslizes pequenos perto de outros como a falta de sentido, lógica ou palpabilidade de alguns momentos. Estes não impactam imediatamente a qualidade do filme em geral por serem pouco importantes para a trama, mas acumulam e logo se tornam problemáticos. Exemplo disso é quando Godzilla e Battra navegam por baixo da crosta da Terra por pura conveniência pura. Custava muito fazer eles sumirem no oceano e reaparecerem mais tarde? Não é como se não tivessem feito isso antes. Aliás, mesmo as cenas debaixo d’água, que já foram mostradas antes, são inconsistentes.. Em um momento a água está rasa o bastante para Godzilla ficar de pé, em outro o monstro está completamente submerso e com um bom tanto de água acima de sua cabeça. São pequenas coisas que se repetem tanto que é difícil não notá-las. O pior é que tudo reflete a produção apressada da Toho, que não perdeu tempo na hora de lucrar com a popularidade da série.
Se “Godzilla vs. King Ghidorah” foi um retorno às raízes de Godzilla, esta obra continua essa moda de um jeito não tão positivo. Resgataram as tramas simplistas e as atuações bobas dos Anos 60 e 70 em vez do que realmente importa. Pessoalmente, prefiro dez mil vezes as tramas mais sérias e melhor trabalhadas dos dois primeiros filmes da Era Heisei. O maior investimento financeiro na produção, entretanto, compensa vários erros e mantém o pior filme da Era Heisei superior ao melhor da Era Shōwa. Ao menos trouxeram o clássico rugido de Godzilla, uma dose de nostalgia muito bem vinda.