A penúltima obra da Série Shōwa se mostra uma importante adição por diversos motivos. O que mais se destaca é a introdução de um dos mais temidos oponentes do Rei dos Monstros: Mechagodzilla, a versão robótica e mecânica do próprio Godzilla. Originalmente, este era pra ter sido um projeto comemorativo dos 20 anos da série, mas os planos mudaram novamente e se moldaram no que se conhece hoje como “Godzilla vs. Mechagodzilla”. De qualquer jeito, o filme recebeu um orçamento maior, refletido claramente nos efeitos especiais mais sofisticados do longa.
De cara temos um pouco de mistério rodeando uma profecia anciã, que previa que um monstro destruiria a cidade, mas que também dois outros monstros estariam presentes na defesa. Com isso, Godzilla é mostrado destruindo a cidade em uma encarnação de sua antiga personalidade vilanesca e assim ocupa seu espaço na tal profecia como o malvado. Isto é, até que um curioso Angilas descobre a verdade por trás dessa história. Não quero contar mais que isso para não estragar tanto o filme, mas dizer que tudo vai se revelar como um plano de alienígenas querendo dominar a terra e que Godzilla lutará contra Mechagodzilla em algum momento é apenas falar o óbvio.
Seguindo mais ou menos os moldes estabelecidos por Gigan no filme de 1972, Mechagodzilla é um oponente brutal e sem escrúpulos na hora de destruir de seus oponentes. Godzilla pode ser o brutamontes destruidor que conhecemos, mas ainda resta um pouco de coração no gigante, até mesmo contra oponentes como o avassalador King Ghidorah. Mecânico como é de sua natureza, Mechagodzilla mantém apenas um objetivo em mente e faz de tudo para alcançá-lo, nem que isso signifique obliterar tudo e todos em sua volta. Realmente, o conceito da cópia distorcida do herói não é novidade nenhuma, mas não é isso que é atraente. É a idéia de um monstro que se equipare a Godzilla em termos de poder que torna tudo interessante.
O conceito de dar praticamente os mesmos poderes a dois indivíduos e ver como eles usam esses poderes de jeitos diferentes é uma pegada legal, mas vão além disso e dão ainda mais armas para deixar o outro na desvantagem. Se por um lado o conhecido herói tem seus clássicos poderes, Mechagodzilla tem mísseis saindo de toda e qualquer articulação, raios explosivos, poder de vôo e uma força inigualável. Isso transforma o conceito de combate entre monstros em algo melhor que dois seres apenas anatomicamente diferentes. Pelo menos melhor que a técnica de nocaute de um golpe tão popular da franquia. Ainda assim, essa idéia acabou um pouco mal usada, pois fazer um personagem explicitamente mais forte perder de maneira convencional é receita certa para a decepção. É aí que está o problema principal de não aplicar bem este conceito, porque se uma derrota por meios conhecidos já é decepcionante, inventar habilidades novas para o protagonista é quase tão grave quanto. O que acontece em seguida é um grande deus ex machina, que infelizmente passa da parte humana da trama para a parte com monstros.
Mas ainda que o desfecho da luta principal seja um pouco menos satisfatório que o esperado, ele cumpre muito bem seu papel ao ser sucedido de uma sequência de cenas que finaliza bem todo o arco de batalha entre os dois kaijus. A batalha em si está entre as melhores da franquia, sendo mais complexa que a maioria dos exemplos da Era Shōwa, essas cenas seguintes só embrulham o pacote. O filme também se beneficia muito do orçamento aumentado, pois muitos elementos — como é o caso da fotografia e dos efeitos especiais — são melhor trabalhados. Algumas cenas de Godzilla destruindo a cidade alcançam um nível de beleza tão alto que fazem frente aos dois primeiros filmes da série. São tão divergentes do resto que nem parecem ser da mesma Era Shōwa de filmes como “Son of Godzilla“. Para uma franquia que nunca pareceu muito preocupada com a estética de suas imagens no geral, isto é definitivamente um avanço.
Felizmente, o tempo de recuperação dos filmes da franquia Godzilla é bem rápido. Mesmo após decepções como os últimos 4 longas. Quando erros são cometidos, estes normalmente são graves, mas os produtores logo percebem a besteira e consertam com um filme de qualidade, como foi o caso de “Mothra vs. Godzilla” suceder o terrível “King Kong vs. Godzilla“.