Godzilla luta contra Ebirah, a lagosta gigante. Uma lagosta gigante, sem mutações, sem um design completamente maluco, simplesmente uma lagosta gigante. Primeiramente, vale notar que este longa foi escrito para o personagem King Kong, o que explica muita coisa bizarra que acontece durante a trama. Explicar não é isentar de ruindade, porém, e infelizmente o filme sofre bastante com muitas cenas estranhas. Não sei por qual motivo a Toho insistiu tanto em personagens como King Kong e Rodan, não que algo bacana não pudesse ser feito com eles, mas todas as suas aparições foram fracas até então.
De cara quando revelam Godzilla, vemos que ele dorme dentro de uma caverna por qualquer motivo isento de bom senso. Bizarro é imaginar como ele entrou em um local tão fechado, em primeiro lugar. Ao menos a saída da caverna é um puta momento de virilidade, Godzilla simplesmente atravessa a parede de pedra de uma vez, destruindo-a por completo em uma cena que lembra muito a parede de lama de “Rambo II – A Missão”. De certa forma, não ficaria surpreso se a inspiração de tal cena clássica tenha vindo daqui.
A trama é quase nula nesse longa. Muita pouca coisa acontece em uma hora e meia de filme, enquanto tudo que de fato ocorre demora demais para terminar. De forma simples, a trama gira em torno de um grupo de pessoas que rouba um barco e acaba numa ilha cheia de terroristas escravagistas, onde encontram Godzilla dormindo e Ebirah rondando as águas em volta da ilha. Não demora para as coisas darem errado e os monstros começarem a briga. Novamente o problema do comportamento de Godzilla vem à tona. Ele é esquisito na maior parte do tempo e somado a um design de fantasia igualmente bizarro torna o clima do filme um tanto inconsistente. O Rei dos Monstros, por exemplo, joga vôlei com pedras e pega no sono aleatoriamente pelo menos uma vez durante a trama, o que claramente prova que o papel era pra ser do terrível King Kong.
Outro ponto que remete aos filmes do Kong da Toho é a reciclagem do cenário de ilha, já usado em outras obras da própria produtora. Novamente temos uma ilha cheia de nativos que falam japonês e não conseguem pensar no mais óbvio dos planos para fugir dali. Neste longa Ainda mais notável é a mudança de tonalidade da franquia, que pode ser vista em vários elementos. Dentre eles, a trilha sonora representa isso bem, uma vez que tem sua entonação mudada para ritmos mais animados e infantis. Estes até são bem agradáveis, mas acabam deixando os temas clássicos um pouco na saudade. Há também uma tendência maior para o humor —destaque para o termo tendência — por existirem mais cenas engraçadinhas e leves que nas obras anteriores. Ao menos estas sequências casam bem com a trilha sonora e se mantêm longe do humor falho e espalhafatoso de “King Kong vs. Godzilla“, ainda que não sejam nada muito agradável de assistir.
Dessa vez conseguiram piorar as já falhas cenas de luta dos filmes anteriores. O comportamento dos monstros nas lutas é esquisito o bastante para criar um clima não natural, seja por Ebirah balançando mais que cosplay de 15 reais ou por Godzilla andando com os braços abertos como se estivesse com as axilas assadas. Isso não só incomoda como dá a impressão que as ideias para uma luta excitante parecem estar se esgotando rápido. Pode-se notar isso especialmente por repetirem as mesmas coreografias de sempre, neste caso reproduzindo os piores movimentos de antes — como voleibol com pedregulhos e jogar água na cara do inimigo. Alguns poucos momentos se salvam, como as cenas debaixo d’água que lembram bastante “Thunderball”, lançado no ano anterior, enquanto o resto é totalmente digno do esquecimento.
Como dito anteriormente, tudo o que acontece parece demorar horrores para começar e para terminar. Tomo como exemplo a breve aparição de Mothra: antes sempre existiam cenas breves de cantoria para que Mothra fosse convocado à luta e neste longa não é diferente, só que cada sessão de cantoria demora um tempo absurdo. Enquanto a enrolação toma conta, Mothra fica desativado como em uma ressaca violenta. Assim como em outros filmes, há uma porção de sequências humanas para criar clima até a batalha principal. Nesse caso há uma mini trama sobre terroristas que fabricam armas nucleares e usam nativos como escravos. Godzilla até chega a enfrentá-los através da destruição alheia, mas nem as miniaturas, que costumam ser decentes, se salvam aqui; todas parecem baratas e estão mais que na cara que são de brinquedo. Muita coisa que costumava ser símbolo do sucesso da franquia se perde novamente, especialmente o nível de qualidade mantido pelas últimas três obras.
No fim de tudo, a experiência que tinha começado relativamente promissora acaba indo por água abaixo, assim como o vilão Ebirah. Este até poderia ter sido um bom filme de temática mais leve, mas uma série de fatores acaba minando as limitadas conquistas vistas aqui. Talvez outro filme tenha uma batalha aquática mais excitante que a de “Ebirah, Horror of the Deep”, restando ao espectador torcer para que isso e outras coisas, como o design do inimigo, melhorem.