Continuando a maratona Godzilla, vem “Godzilla Raids Again”, o segundo filme da franquia japonesa. Dessa vez, em vez de simplesmente colocar o monstro contra a cidade a trama introduz outro monstro na jogada, característica que se mostraria comum nas produções dos anos seguintes. Popular como se tornou, esta moda de colocar outros monstros contra Godzilla começa aqui, fazendo do monstro principal um anti-herói ao invés de vilão como no original.
Anos após a morte de Godzilla no longa de 1954, dois pilotos procuram por cardumes de atum no oceano para a empresa que trabalham. Mas quando um dos aviões entra em pane e o outro piloto sai para o resgate, ambos encontram um novo Godzilla, dessa vez visto brigando com outro monstro, Angilas. Mesmo que o fim do primeiro filme considere a possibilidade de existir outros Godzillas pelo mundo, a idéia de trazê-lo de volta me deu aquela sensação de oportunismo financeiro. Provavelmente os engravatados avaliaram o original com potencial grande para deslanchar uma franquia e consequentemente fizeram mais filmes enquanto a popularidade era alta. Esse fato não só mata o impacto do final do primeiro, como também rouba o ar de iconicidade do monstro, que passa de o Godzilla para um Godzilla.
Seguindo essa tendência, perde-se muita coisa em comparação com o original. A mensagem anti-nuclear, que era forte no original, torna-se apenas uma ferramenta para justificar certas peculiaridades do enredo. Outras coisas já são simplesmente ignoradas. Em momento algum há alguma explicação para a volta de Godzilla, a não ser pelo comentário feito no final do filme anterior. Logo, o espectador tem de fazer certo esforço para juntar os pontos e entender bem que em que pé essa continuação está. Creio que, se havia a possibilidade de trazer o monstro de volta no futuro, podiam ter feito o final do anterior um pouco mais aberto. Se fosse para matar o monstro, que matassem de uma vez.
Em compensação, o ritmo é bem menos lento que seu antecessor, com muito mais ação na tela e menos cenas de enrolação humana. Sem delongas para mostrar o monstro, vemos Godzilla e Angilas logo no começo, sem todo o processo demorado de mostrar um pouco de cada vez. Também há pouca falação sobre os monstros, pois de cara os personagens compreendem o que está acontecendo. Felizmente, aquelas centenas de cenas de estudo sobre as bestas são inexistentes aqui. Isso dá uma certa revitalizada no filme, que com quase 60 anos de idade resiste um pouco melhor ao teste do tempo através do aumento de ação.
Quanto ao aspecto porrada, a série ainda estava engatinhando em direção ao que seria no futuro, então nada de brigas épicas aqui. Não que as cenas de luta sejam absolutamente ruins, mas dá para notar um pouco de amadorismo na hora da sua execução. Elas não parecem ser bem planejadas, aparentam ser uma boa idéia aplicada de maneira repentina. Vendo os filmes seguintes nota-se que o conceito de batalha entre monstros ainda estava em seu começo, ainda mais por este ter sido lançado quase imediatamente após o primeiro. Para efeito de comparação, as coreografias das lutas lembram dois moleques de 13 anos achando que grudar no pescoço do outro e cair no chão é a mesma coisa que arrebentar seu inimigo. Some isso a uma aceleração da velocidade das cenas de luta e o resultado são dois pirralhos fantasiados brigando na década de 20. Digo isso pois a diminuição do número de quadros por segundo é muito similar à técnica usada por diretores do cinema mudo. Seu uso, por si, é compreensível, mas poderia ter sido feito de maneira mais sutil.
Por sorte, o tempo de produção não afetou a qualidade dos cenários e das miniaturas tão boas no primeiro filme. Uma mudança de cenário leva Godzilla de Tóquio até Osaka, mas ainda assim a cidade continua tão bonita e bem feita quanto poderia ser, sendo inclusive até mais admirável em alguns momentos que no original. Algumas cenas em especial exibem tal atenção ao detalhe — como quando o monstro pisa em uma estrutura de pedra e faz ela se esfarelar em pedregulhos menores — dando assim um ar ainda maior de autenticidade para a atmosfera geral do filme. Com exceção de algumas cenas no final, que não parecem tão bonitas por serem pouco plausíveis, o resto agrada e muito. As sequências finais, nas quais a qualidade dos cenários e das miniaturas cai um pouco, parecem mais um reflexo de um roteiro apressado, que com um pouco mais de tempo e carinho talvez ficariam melhores.
No fim das contas, “Godzilla Raids Again” é um passo à frente em alguns aspectos e um vários passos atrás em outros. Partindo um tanto da idéia original, o filme exibe bem sua tendência de fazer lutas de monstros se tornar o foco da série. Entretanto, os passos nessa direção ainda não compensam a perda de conteúdo em relação ao primeiro filme da série. Ao menos nem tudo está perdido, pois enquanto de um lado há várias perdas no quesito moral, de outro há um grande ganho no quesito de ação, que no futuro colocaria a série em um formato mais enérgico.