Um dos filmes mais conhecidos de Fritz Lang, “Metropolis” é uma das obras mais influentes da década de 20. Um dos precursores do que viria ser a Ficção Científica hoje, sua influência se mostrou presente até mesmo nas décadas de 60 e 70, quando o gênero já havia se concretizado. Originalmente com quase três horas e meia de duração, a obra sofreu vários cortes após sua estreia e grande parte do trabalho original se perdeu com o tempo. Apenas recentemente um rolo de filme foi encontrado na Argentina com diversas cenas consideradas perdidas, que foram restauradas e lançadas em 2010 numa versão com cerca de 95% do lançamento original.
A trama se localiza num futuro onde a divisão de classes está tão extrema que vai além do social e alcança o geográfico, de um jeito que exista o mínimo contato entre as duas. A divisão do trabalho é também explorada profundamente, com destaque à relação entre operário, máquina e o sistema que ambos esses elementos constroem; de maneira que a própria posição do trabalhador é posta em questão. Por ser um filme expressionista, essas qualidades e divisões são apresentadas explicitamente, apresentando a mensagem da história até bem demais com a ajuda das atuações exageradas.
A ideia por trás do enredo logo se mostra bem simples, uma vez que este deixa bem claro qual o conceito principal desde o começo. Apesar das poucas surpresas que circundam a história, boa parte dela é enriquecida por referências à material externo; com destaque à base religiosa adotada, que compara seus personagens com figuras bíblicas e até a relaciona conceitos da trama com contos do livro religioso. Vale notar, contudo, que esta obra está longe de seguir uma temática religiosa. Ela apenas metaforiza histórias clássicas de maneira inteligente. Dessa forma, a narrativa é abrilhantada sem criar uma atmosfera apelativa, se sustentando por si mas também aproveitando dos benefícios do material externo. Não há como dizer que “Metropolis” é pretensioso de alguma forma, ela se garante por atingir um nível alto de riqueza em suas escolhas.
Dou destaque à representação dos personagens, produto do pequeno e brilhante elenco. Cada personagem apresenta poucas facetas no decorrer do enredo e nesse caso forma um conjunto de relações muito envolvente — novamente a mediocridade é evitada quando fazem muito com pouco. Considerando que a trama gira em torno da inter-relação dessas qualidades relativamente rígidas— muitas delas diferentes das outras — a exploração de cada uma dessas facetas se faz muito relevante. Felizmente, o resultado dessas interações é executado de maneira que cada característica seja explorada tanto quanto possível e apresentada de um jeito que encaixe bem com outros elementos do longa — seja através do contraste ou não.
Se por um lado há brilho na representação dos personagens, da forma mais expressiva que o filme mudo permite, por outro este mesmo filme mudo acaba sofrendo um efeito colateral: o formato é um pouco cansativo nos dias de hoje. Com 153 minutos de duração, o longa parece ter três vezes essa duração pela falta de diálogos e pelo ritmo relativamente lento, que acabam deixando a experiência mais pesada em geral. Por sorte, o enredo não sofre muito com a longa duração e acaba agradando no final das contas. Ainda assim, por ter muito a dizer, o longa fica um pouco maçante depois da trigésima vez que o ciclo “imagens – cartão de diálogo – imagens” se repete.
A representação de cada personagem é sólida e — como característica do expressionismo — mantém suas qualidades firmes durante toda a trama. Tudo é entregue na lata, beirando o exagero em alguns momentos. Atuações mostram-se competentes e não só cumprem seu papel como também enriquecem os personagens; tal como é o caso da atriz principal, que está muito bem em seu papel, ou papéis. Há certa beleza em ver a mesma atriz atuando em uma cena de uma forma e assumindo uma personalidade completamente diferente no momento seguinte. Seguindo essa linha, a dinâmica feita com a figura feminina é algo tão espetacular que se mantém forte até nos dias de hoje. É comum notar uma orientação mais definida no que se refere a representação da mulher em um filme, porém em “Metropolis” essa noção é manipulada constantemente ao mostrar a mesma mulher nos dois extremos. A mesma pessoa é tão santa quanto profana, manobra que certamente levantou sobrancelhas na época que foi lançado.
Não considero tal obra pior por ser mais cansativa, pois a origem desse cansaço está na estrutura do próprio filme mudo. Entretanto, por mais que a maioria dos atributos seja competente o longa não é desprovido de defeitos. A duração longa não é exatamente justificada, além de valor histórico — que é relativamente trivial em termos técnicos —ela por vezes parece que tira um pouco do foco do roteiro. Algumas motivações de personagens ficam pouco claras, ao passo que explicações para certos eventos chegam a ficar totalmente ausentes. Certos momentos-chave da trama também acabam sendo um pouco convenientes demais para serem engolidos, consistindo do clássico deus ex machina. Por outro lado, algumas outras sequências estão tão longe da coincidência que nem sentido fazem, parecendo mais algo aleatório num filme que se baseia na
“Metropolis” é certamente um filme que merece ser visto por sua ousadia, pela temática interessante ou ainda pela atuação característica do elenco. Devo admitir que esperava um pouco mais deste longa-metragem, pois pelo falatório esperava uma experiência um pouco mais dinâmica; algo como o que é visto em “O Encouraçado Potemkin”, que não se mostrou cansativo em momento algum. Extremamente longe de ser algo medíocre, o longa proporciona uma boa fonte de entretenimento, mesmo que um pouco pesado em alguns momentos.