Às vezes uma recomendação faz muito bem para abrir os olhos e mostrar quão grande o cinema é como arte. Mesmo quando se pensa que já se assistiu tantíssimos filmes de diretores famosos, estrangeiros, em começo de carreira e até aqueles que tentaram a sorte uma vez apenas, sempre há alguma coisa que escapa até mesmo dos comentários corriqueiros. Eu não só nunca havia assistido a “How to Make an American Quilt” como também nunca havia ouvido falar dele até pouco tempo atrás. Infelizmente, acontece aqui um encontro com a decepção: da minha parte com a obra recomendada, pois esperava que ela fosse melhor, e da pessoa que a recomendou comigo, que provavelmente esperava que eu gostasse também.
A história acompanha Finn Dodd (Winona Ryder), uma garota trabalhando em mais uma versão de sua tese de mestrado após começar e abandonar várias outras. Quando seu namorado a pede em casamento, ela pede um tempo para pensar e decide se retirar por alguns meses na casa de sua avó, onde encontra toda a calma e tempo no universo para colocar as idéias no lugar e talvez finalmente concluir sua tese. Conforme convive com sua avó, tia avó e as amigas delas, que sempre estão visitando, Finn escuta as histórias de vida delas e descobre as várias faces possíveis do amor.
Existe um risco ao contar uma história usando várias histórias, ou seja, transmitir uma mensagem ampla através de outras individuais isoladas. Como a transmissão é dividida, decentralizada, ela fica refém do sucesso de não só uma narrativa, mas várias delas. Em primeiro lugar, todos os arcos devem falar da mesma coisa e um significado maior tem de ser extraído a partir de uma visão de todos juntos. A pior coisa que pode acontecer é não haver um sentimento de propósito em nenhum desses interlúdios narrativos, algo que pode também acontecer em apenas alguns deles. Ou talvez seja possível encontrar propósito desacompanhado de competência, contudo. Todas essas são questões a se ter em mente ao tentar algo como “How to Make an American Quilt”, que tem como arco principal a história da jovem Finn complementada pelas histórias de algumas participantes do grupo de costura. No mínimo, pode-se dizer que o erro mais preocupante não é cometido por conta de existir unidade narrativa entre todos os contos.
O mesmo não pode ser dito da qualidade inconstante dos contos. Aliás, o mais duro é perceber que o conto principal só não é o mais insosso dos contados porque há um outro curto e superficial garantindo essa posição. Por mais que o tempo de tela do arco principal seja menor que o dos outros combinados, a idéia básica do roteiro de “How to Make an American Quilt” é usar os últimos para complementar o primeiro e fortalecê-lo por introduzir outros personagens e contextos novos para alavancar o desenvolvimento do trajeto da protagonista. A história de Finn é apenas… fraca. A idéia central da premissa envolvendo ela passar um tempo longe de casa e conhecer outras histórias para ajudar a enxergar melhor a sua não é ruim, porém começa a desabar tão logo que o desenvolvimento começa. Considerando que cada interlúdio deveria causar alguma mudança no trajeto da protagonista, é apenas decepcionante que a carga emocional de algumas histórias não encontre continuidade no arco principal. Os reflexos são sempre distorcidos: ou são ocultos, ou mal concebidos.
Isso acontece principalmente porque Winona Ryder entrega uma atuação pouco inspirada e falha em tentar canalizar uma personalidade introvertida. É até estranho como seus maneirismos e linguagem não verbal cumprem muito bem seu papel de evidenciar uma pessoa com dificuldade de se comunicar e transmitir o que há dentro de si, diferente de praticamente todas as situações em que a atriz começa a falar e o véu da ilusão se rasga. As transições também não são bem executadas, embora isso também seja responsabilidade do enredo. A passagem de um sentimento para outro em uma mesma cena por vezes traz a qualidade súbita comum de melodramas, um salto não natural de uma conversa comum a uma briga, por exemplo. “How to Make an American Quilt” quer que o espectador acredite que existe uma tensão interna a respeito do casamento só porque introduz um clichê ridículo representando a tentação da carne. Apenas verbalizar ou anunciar uma mudança não a torna crível e em vários momentos é possível notar como as transformações acontecem porque sim, mais por uma demanda auto-imposta do roteiro do que por um desenvolvimento natural.
“How to Make an American Quilt” costuma se exaltar quando sai de seu arco principal e abre espaço para as histórias das outras mulheres. Ou melhor, até no presente a participação das coadjuvantes é mais forte e ofusca a figura de Winona Ryder. Poucos coadjuvantes chegam a se colocar a abaixo dela e isso só acontece porque o nível é bem baixo, tal como se vê na mãe da protagonista ou no rapaz sarado da piscina. Todo o resto, que inclui ótimas atrizes como Ellen Burstyn e Anne Bancroft, transparecem como sua experiência eclipsa a da protagonista tanto em competência artística como em maturidade dentro da história. Por outro lado, são as viagens para o passado que realmente roubam a cena e fazem o presente parecer tão brando e sem graça. A história de vida de uma mulher como Sophia Darling existir no mesmo espaço em que a de Finn Dodd é como quando alguém dramatiza sua situação e outra pessoa compartilha uma experiência notavelmente mais grave, fazendo a primeira parecer frescura comparativamente. O mesmo acontece aqui. Seja em atuações ou em eficiência narrativa, os interlúdios costumam ser mais interessantes que o melodrama da protagonista.
No final das contas, “How to Make an American Quilt” peca mais por conta de seu desenvolvimento mecanicista de uma história envolvendo aprendizado indireto e conflitos internos a respeito de um ponto de virada na vida da protagonista. As histórias paralelas terem uma função não é problema e compõem o caminho a se seguir neste caso, mas sua existência não necessariamente traz uma obrigatoriedade de concluir cada uma delas com uma lição de vida aprendida. É notável a clássica tendência hollywoodiana de dar um final feliz — ou um final qualquer, a propósito — para todos os personagens, como se a perpetuação de um estado ou estilo de vida fosse impossível. Mas também não é um desastre completo. Ironicamente, aquilo que deveria ser complemento acaba ganhando protagonismo por ser mais interessante ou melhor contado que a própria história de Finn, que não passa de uma jornada de problemas nascidos tão rapidamente quanto são resolvidos.