É claro que uma continuação existiria. Dado o sucesso surpresa de “The Lego Movie“, planos foram feitos para mais daquele universo voltar aos cinemas. Curiosamente, não foi uma continuação direta que seguiu o primeiro filme, mas dois spin-offs lançados em 2017: um deles com o Lego Batman e outro focado na linha Ninjago. Foi só depois de 5 anos do original que “The Lego Movie 2: The Second Part” teve a oportunidade de continuar diretamente o gancho da última cena do anterior. Só que dessa vez vão longe demais nas idéias mirabolantes e longe de menos em todo o resto, culminando em uma experiência sem alguns dos charmes de antes.
Assim que Bricksburg é salva de ser colada no lugar para sempre pelo Lord Business, um novo invasor se apresenta para Emmet e o grupo de mestres construtores: alienígenas de outro planeta invadem a cidade e começam um período de destruição sem fim. Bricksburg logo se torna Apocalypseburg, uma cidade de cidadãos alegres e sorridentes transformada em uma planície desolada pela guerra constante. Todos mudam para se adaptar à dura rotina de sua nova realidade, mas o conflito fica ainda mais sério quando os amigos de Emmet são seqüestrados pelos freqüentes invasores. Com a ajuda de Rex, um caubói treinador de velociraptors e viajante espacial, Emmet vai ao resgate para evitar que sua visão do caos se concretize.
Apesar de não ter visto o spin-off de Ninjago, posso dizer com tranqüilidade que “The Lego Batman Movie” foi o melhor dentre os três restantes. Toda a insanidade do primeiro foi unida e concentrada na mitologia de um personagem que a tem de sobra. O filme demonstrou completa segurança em todas as brincadeiras feitas com alguém de alta relevância na cultura popular, mesmo lidando diretamente com pilares como a relação entre o Cavaleiro das Trevas e o Coringa. Com isso em mente, era de se imaginar que tal competência seria encontrada nas próximas obras do universo Lego, o que não acontece em “The Lego Movie 2”, um retrocesso em comparação com o original e o spin-off.
Começa pelo fato de tudo ser demais. As novas idéias se apresentam tentando esfregar na cara da audiência quão drasticamente a situação mudou desde os eventos do último filme. É mais do que uma seqüência direta dos eventos, com brinquedos fofinhos — na verdade, uma linha direcionada para o público mais infantil, a Lego Duplo — e aparentemente indestrutíveis resistindo a todos os esforços dos heróis. Dessa vez, a briga constante transforma a cidade completamente e lhe dá a nova face muito pouco inspirada de um futuro pós-apocalíptico. Com o lançamento de “Mad Max: Fury Road“, uma nova geração inteira teve a chance de conhecer a versão de George Miller do conceito e, mesmo se não fosse por ele, vários outros produtos também exploraram um cenário parecido, como os jogos da série “Fallout” e “Wasteland”. É difícil comprar a idéia de que cenários desérticos e inóspitos, habitados por gente má e esquisita, é algo fascinante como “The Lego Movie 2” tenta vender.
Superestimar suas próprias qualidades é um erro aparente e recorrente ao longo do filme. E, claro, não é como se “The Lego Movie 2” afirmasse abertamente a importância de suas próprias idéias, é só a impressão transmitida por conta do nível de entusiasmo se manter o mesmo enquanto as idéias deixam a desejar. Isso pode ser visto perfeitamente na própria trama. “The Lego Movie” trouxe uma base sólida através da sátira do mito do herói e da figura do protagonista salvador do universo, além de sua coleção de piadinhas menores e até mesmo uma reviravolta interessante quando se revela que todos os eventos do universo Lego são reflexos de outros do mundo real. A peça de Lego mitológica com o poder de salvar o universo era, na verdade, a tampa de “super bonder” que colaria todas as pecinhas para sempre. Simples assim. E bastante efetivo.
Em contrapartida, “The Lego Movie 2” traz um modelo similar de fantasiar um conflito dos personagens humanos por meio de uma história no mundo de brinquedo. Dessa vez, a idéia é transmitir uma mensagem de amizade e união, especialmente entre gêneros diferentes; colocar o garoto brigando constantemente com sua irmã, ilustrar a diferença entre os dois e trabalhar em cima disso. É uma premissa um tanto menos interessante, uma base não tão sólida quanto antes. Ao menos todo o resto das piadinhas menores não sofre com a escolha infeliz de trama principal, pois a maior parte delas preserva o aspecto espertinho e destemido de às vezes ser intencionalmente sem graça ou sentido para pegar o espectador de surpresa. Apenas algumas músicas e menções excessivas de cultura pop destoam; as primeiras por serem desnecessárias e as últimas, meramente gratuitas.
A única coisa de que não se pode reclamar em “The Lego Movie 2” é a ação. Parece que ela e a estética geral da obra são os aspectos que não decepcionariam nunca, mesmo se todo o resto desabasse. Faz sentido que ao menos as duas funcionem juntas, já que grande parte do fascínio de tais cenas agitadas existe por conta da identidade visual de plástico agregar tanto à orquestração da ação. Não seria tão fascinante ver a mesma coisa sem o toque especial das pecinhas de plástico e do relativo improviso de, por exemplo, representar uma briga de mano-a-mano entre dois bonequinhos. Todas as limitações são abraçadas e usadas criativamente ao invés de manipuladas e distorcidas para fazer o que todo filme faz.
O saldo termina positivo e bem menos impressionante que os anteriores. Não por falta de novidade ou porque o conceito geral do universo Lego já saturou, mas porque a execução decepciona diante da expectativa de mais uma dose da divertida criatividade de antes. Encontrar uma história fraca em termos de enredo e de idéias gerais — como ambientação e referências a cultura pop — não era o que eu nem muita gente esperava, imagino. Especialmente numa época em que tudo é auto-referencial e eternamente bebendo de fontes passadas para criar produtos supostamente novos, sair citando “De Volta para o Futuro” não é nada genial.