De todos os filmes do Universo Estendido da DC, “Aquaman” parece ser o menos aguardado e não é difícil entender o motivo. Depois de “Batman v Superman” ser castigado por ambos críticos e público, de “Suicide Squad” conseguir trocar opiniões divisivas por uma predominância negativa e, mais tarde, “Justice League” falhar em causar uma impressão forte e dar o respiro que o Universo DC precisava, a cama estava feita. Somando isso ao sarro que se tira do herói por seu superpoder ser falar com peixes, longe do apelo de Batman ou Lanterna Verde, fica ainda mais fácil enxergar por que se falou tão pouco do filme nos meses antes do lançamento. Para um público ansioso ou não, “Aquaman” foi lançado sem fazer o mesmo fiasco de seus predecessores, mas também sem causar algo mais que uma impressão razoável.
Arthur Curry (Jason Momoa) é o fruto de uma união peculiar. Quando seu pai encontra uma moça largada nas pedras da costa, surge um romance breve e intenso de onde o pequeno Arthur nasce. Sem saber inicialmente, ele ganha de sua mãe a herança de uma civilização aquática escondida do mundo terrestre e com isso torna-se o herdeiro de um trono que não deseja. Mas um dia sua origem volta para atormentá-lo quando seu meio-irmão, o Rei Orm (Patrick Wilson), decide unir todos os povos aquáticos em uma investida contra os humanos. Arthur se vê forçado a assumir seu lado atlante para impedir uma catástrofe entre os dois povos aos quais pertence.
Um dos rumores sobre um filme do “Aquaman” nunca ter sido feito antes é a dificuldade de contar uma história sobre um herói aquático. Muito tempo fora da água e ele seria como qualquer outro super-herói, perderia uma qualidade definitiva de sua identidade. O problema é que realizar uma produção inteira debaixo da água, incluindo reinos, raças diferentes, figurino e efeitos visuais seria inviável ou insatisfatória, provavelmente com o potencial do herói desperdiçado em um baixo orçamento. Entre as alternativas, esperar a tecnologia alcançar o escopo do material sem dúvida foi o melhor a se fazer.
O resultado disso é um universo representado exatamente do jeito que deveria. Antes de dizer que “Aquaman” não tem nenhum momento de computação gráfica claramente falsa e distrativa, alguns poucos estão ali chamando a atenção. Todo o resto, a maioria esmagadora, evita fazer feio e aproveita para representar visualmente o mundo debaixo d’água sem se deixar levar pelas tendências estilísticas do começo do Universo DC. Assim, há tons de azul claro e marinho muito bem iluminados contrastando com amarelo e rosa saturados no lugar de um fundo do mar escuro e cinza e sem vida. Ver como se constrói uma civilização alternativa, com tecnologia avançada alimentando toda a estrutura do lugar me faz pensar que gostaria de ter visto tudo isso na Asgard de “Thor”. São os mesmos conceitos, armas tecnológicas e veículos únicos, só que muito mal representados no caso da Marvel. Chega até a ser estranho dizer que armaduras anfíbias e naves em forma de arraia não são vergonhosas aqui. Às vezes há algo espalhafatoso e chamativo, mas nada ofensivo.
Mas não só de visuais vive um filme de super-herói. A ação é um aspecto importante, se não o mais, em uma experiência muito dependente de mostrar poderes em prática e algum vilão similarmente poderoso em confronto direto com o herói. Ainda não chegou o momento em que o cinema abraça histórias de herói que não dependem de adrenalina e destruição. E não há nada de errado nisso, embora a alternativa seja interessante. “Aquaman” se sai bem na proposta de criar um ambiente apropriado e em seguida orquestrar algo para ocupar tal espaço. A água, normalmente mal aproveitadas em outros produtos e mídias, merece destaque. Movimentos desacelerados e de pouco impacto ficam de lado quando seres conseguem usá-la como propulsão para piques e investidas, além de oferecer liberdade de movimento equivalente ao de um personagem voador, mas sem a gravidade entrando na equação. São nesses momentos que o herói finalmente consegue se destacar e mostrar mais valor do que consegue em “Justice League“, melhorando bastante a impressão negativa que tive até mesmo em termos de personalidade. Ao menos o roteiro cede espaço para o herói não ficar apenas no estereótipo apresentado antes.
Em teoria, “Aquaman” funciona onde deve: na ação. E seria o bastante para um saldo bastante positivo se todo o resto não fosse tão fraco. Já foi dito que o maior pecado do Universo DC nunca foi sua identidade visual sóbria, a seriedade com que trata seus personagens ou todos os outros aspectos destoantes do Universo Marvel, e sim os roteiros. Ver tanta gente falar isso mostra que não é necessário ser um acadêmico em cinema para perceber que há algo de errado. Impossível exacerbar problemas de um texto mais claramente do que com imagens em movimento numa tela gigante. De qualquer forma, cinco filmes prévios mostram às vezes o problema vem da base e não pode ser corrigido com excesso de polimento, efeitos especiais permeando cada quadro, ação tentando manter o ritmo equilibrado e o espectador, satisfeito com seres extraordinários exibindo suas habilidades. Tudo isso ajuda, sem dúvida, mas não é o bastante. Não nesse caso, quando os problemas primários são significativos o bastante para serem facilmente percebidos.
Nenhum roteiro nasce perfeito ou esse não costuma ser o padrão. Talvez a primeira coisa que surge é estrutura, o esqueleto que dita picos e vales de intensidade dramática e ordena apropriadamente cenas de forma que as mais críticas estejam em seus lugares enquanto outras são remanejadas ou excluídas. O diálogo não foge da regra e também passa por fases diversas de desenvolvimento, também tendo um estado em que a mensagem está crua e sem se preocupar com a escolha de palavras especificamente. Por exemplo, sabe-se que uma frase deve comunicar o afeto de uma pessoa pela outra em dado momento e aí por diante. O caso de “Aquaman” é curioso. Ou algum estagiário trocou a versão final do roteiro por uma inicial, ou o desenvolvimento morreu no rascunho e foi lançado assim mesmo.
O resultado é uma história que fede a clichê tão fortemente que o pensamento é constante. É um convite aberto a todos os espectadores, até os que não gostam, para adivinhar as falas e os eventos de “Aquaman”. E, ridiculamente, a freqüência de acertos é alta, mas sem surpreender muito quando “I love you so much” é um dos vários exemplos aparentemente tirados de um estoque de muitos outras similares. Somando isso ao ritmo acelerado característico de James Wan, várias cenas apenas têm tempo de mostrar o essencial e se atropelam junto de outras a fim de mostrar uma seqüência que só pode se gabar de ser coerente, não mais que isso. No fim das contas, muito conteúdo vem e vai sem causar uma impressão forte, é o mínimo para manter um saldo modestamente positivo.
2 comments
EU não gostei da subtrama envolvendo os pais dele.
Por mim o filme começaria naquela cena dele bebendo no bar e a Mera chegando.
A Nicole Kidman foi uma escolha questionável. Ela parecia ser a irmã mais nova do OceanMaster e não a mãe dele.
O problema é que a Nicole Kidman envelheceu muito bem, nem parece ter 51 anos. rs E sim, o começo é BEM ruim. Todo atropelado, sem o mínimo da sensibilidade necessária pra fazer o romance ter algum tipo de vida. A cena do aquário então, meu deus.