“Djon África” abre a sétima edição do Olhar de Cinema com uma história sobre cultura e o redescobrimento de raízes por meio de uma viagem ao passado. Não literal, obviamente, mas uma que mostra ao indivíduo como seu estilo de vida o afastou de tudo aquilo que passou a valorizar mais tarde, quando percebeu que sua vida tinha uma parte faltando. Na tal crise dos vinte e tantos anos, o protagonista decide que sua infância, seus parentes e sua família distante não são assuntos a serem descartados levianamente. Ele deve ao menos tentar investigar por conta própria.
O nome do rapaz em questão é Miguel (Miguel Moreira), preferindo ser chamado de Djon pelos amigos e colegas. Sua vida é, em grande parte, participar de malandragens e pequenos delitos enquanto arranja um bico aqui e ali para ter um pouco de dinheiro no bolso. Certo dia, ele descobre que tem muito em comum com seu pai. Os dois têm o mesmo nome, são parecidos fisicamente e levam o mesmo jeito malandro de viver. Decidido a saber mais quem é seu pai, sua mãe e a família que ele não conheceu, ele sai de sua casa em Portugal para viajar a Cabo Verde e investigar mais a fundo suas raízes.
Embora não seja a proposta mais original de todas, ela também está longe de ser batida. Conhecer a história das pessoas que vieram antes de si e o que elas fizeram é como uma forma muito intimista de estudar História. Vai além de descobrir fatos pela mera maravilha da curiosidade ou por hobby, pois pode revelar padrões e características que não ficaram no passado. Isso e mais podem ser passados para frente sem que a própria pessoa saiba, em alguns casos. Os erros do pai indo para o filho; ou talvez suas qualidades, seu jeito, sua fisionomia… Sem saber exatamente quais são os elementos dessa equação, Miguel parte em busca de maior conhecimento. Assim, sua missão não se limita a encontrar mais informações sobre o pai. No processo, ele acaba querendo saber mais sobre si mesmo.
O rapaz não conhece absolutamente nada sobre seus pais. Criado pela avó desde bebê, ele apenas sabe que são originalmente de Cabo Verde, que provavelmente moram lá e que o pai também se chama Miguel. Não é muita informação, mas Cabo Verde também não é um país muito grande. O rapaz está mais do que disposto a perseguir a menor das chances de sucesso. “Djon África” tem boas idéias e, em teoria, tem um objetivos sensatos em usar uma viagem literal como veículo para uma viagem personalidade adentro, uma jornada de descobrimento pessoal. Em teoria. Nada é tão elegante na prática.
“Djon África” começa mal quando o catalisador da viagem, a base de toda a história, é rasa e mal construída. Tudo começa com o rapaz sendo quem sempre foi até que encontra uma pessoa aleatória na rua, a qual aponta a semelhança com seu pai. Bastou sair de casa uma vez só para ele convenientemente descobrir seu passado esquecido. Miguel logo pede para sua avó contar tudo que sabe sobre seus pais, finalmente enviando-o na tal jornada. Para algo moderadamente promissor em sua premissa, “Djon África” começa um pouco decepcionante ao simplificar o gatilho para tudo a ponto de soar artificial. Por um lado, o bom é que não dá tempo para se entediar neste começo. É preciso pouco tempo para alavancar o enredo com um pontapé e diálogos expositivos.
E este nem de longe é o pior pecado de “Djon África”. Mais para frente, outras qualidades infinitamente mais interessantes que este começo de história dão as caras e sugerem que talvez seria possível sair da sessão impressionado, especialmente considerando que o próprio protagonista é uma delas. Miguel tem a naturalidade necessária para revigorar os momentos mais toscos com seu jeito curioso e meio provocativo; sem nada a ver com sexualidade, vale dizer, pois tem mais a ver com um estilo meio infantil de se portar. Curioso, descomedido e engraçado — em parte pelo sotaque cabo-verdense. Ele, em conjunto com uma outra personagem que surge mais adiante, leva o filme nas costas em mais ocasiões do que é possível contar nos dedos porque a história frequentemente falha em denotar qualquer tipo de progresso. Nem mesmo na tarefa básica de mostrar que ele está chegando perto de seu objetivo, descobrindo pistas e riscando da lista as várias possibilidades. É frequente se pegar ponderando sobre onde estão querendo chegar com um trajeto tão sinuoso.
Por outro lado, caso o argumento seja de que os eventos concretos pouco importam perto da jornada pessoal do protagonista, “Djon África” desaponta igualmente. Não há uma transição visível do espectro literal ao interno no que diz respeito aos objetivos da história. Imagino que as intenções por trás da obra tenham sido mostrar como a transformação interna e individual ganha importância sobre todo o resto, mas isso não acontece. A história passa perigosamente perto de não ter final algum, sendo apenas moderadamente inconclusiva depois de uma sequência psicodelicamente sem sentido seguida de um final tão sutil quanto o começo da jornada de Miguel. Havia margem para levar a história a algum lugar, mas “Djon África” não alcança isso por começar apressado, seguir erraticamente ao longo do caminho e finalmente acabar com apenas um traço do objetivo pretendido.
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Péssima análise. Quase de fio a pavio tu errou.