Cinco anos depois do relativo sucesso de “Pacific Rim“, cuja bilheteria foi salva em grande parte pelo mercado chinês, chega sua continuação não exatamente antecipada. Sem chegar nos méritos de uma sequência ser necessária ou não, pois o primeiro sempre teve um teor comercial forte, é curioso como nunca se falou tanto no assunto de continuar a história anterior. Colocar jaegers contra Godzilla e King Kong? Com certeza, mas nada de comentários sobre o que aconteceu depois que o mundo foi salvo no fim do anterior. Qual a graça de um mundo já salvo? Pouca. E breve, considerando que a situação nunca ficaria assim por muito tempo numa série conhecida por brigas de robôs gigantes. “Pacific Rim: Uprising” traz este quesito em ótima forma e algumas outras mudanças. Algumas boas, outras bem desnecessárias.
Dez anos depois que a humanidade conseguiu fechar a brecha e impedir a invasão de kaijus de uma vez por todas, o mundo vive um período de paz e reconstrução. Os grandes centros foram revitalizados, ao passo que algumas poucas cidades foram abandonadas completamente ao capricho da natureza e de alguns ousados vasculhadores, que procuram peças de jaegers para revender. Jake Pentecost (John Boyega) é um destes e também o filho do estimado marechal da PPDC. No entanto, o rapaz acaba sendo pego pela polícia em uma de suas missões e forçado a voltar ao serviço militar. Seguindo os passos do pai involuntariamente, ele logo descobre que sua presença é inestimável perante uma nova ameaça.
Os comentários de “Pacific Rim: Uprising” não foram muitos. Para além dos motivos já citados, houve uma série de problemas e notícias ruins durante o período de pré-produção que tornaram sua existência improvável, somando ao fato do primeiro não ter sido um estrondo absurdo nas bilheterias americanas. Com o tempo e anúncios de que a produção estava adiada indefinidamente, as pessoas foram parando de alimentar expectativas sobre robôs gigantes no cinema. Tanto que quando o anúncio finalmente deu as caras, não foi recebido por um público ansioso. Somando isso à recepção morna após os trailers, pareceu que esta seria outra continuação sem substância ou traço de qualidade do original. Felizmente, não se trata disso.
Por incrível que pareça, toda a trama que vem antes das cenas de ação grandes não deixa a desejar. Ainda que tenha a adição de alguns elementos infelizes, pouca atividade destrutiva e uma aparente carência de conteúdo interessante num pós-guerra, “Pacific Rim: Uprising” consegue extrair uma narrativa decente dessa soma. Existem poréns, vale dizer. Não há como ignorar o fato de que o roteiro entrou atrasado na onda de incluir crianças na história, como “Stranger Things”. Atrasado e atrapalhado, melhor dizendo, pois a presença de um elenco jovem poderia muito bem nunca ter existido. Por um lado, isso traz um dos pontos mais negativos da história na forma da relação fraternal entre Jake e Amara (Cailee Spaeny), uma garota prodígio que ele encontra. Em contrapartida, quando parece que a história irá apelar para as saídas convenientes envolvendo crianças no estilo “The Phantom Menace“, surgem algumas surpresas ousadas para amenizar o gosto ruim, como coisas que filmes de elenco jovem buscam evitar para não ser muito profano.
O simples fato de uma premissa mais sem graça me manter preso ao filme já é um grande feito. Não me recordo de me sentir entediado ou que estavam indo longe demais para tentar extrair motivos para uma continuação. Eventualmente, “Pacific Rim: Uprising” chega no exato motivo que passou pela mente de todos os espectadores, porém introduz uma bela de uma volta antes disso para não cair no óbvio já no começo. Talvez o treinamento de cadetes e o retorno involuntário ao serviço militar não sejam tão legais quanto lutar uma guerra contra monstros enormes que não param de vir, pensando por alto, e realmente não é. Se a idéia é tentar superar a premissa primeiro, então há um fracasso evidente aqui. O enredo definitivamente não é tão bom quanto, mostrando-se como o ponto mais morno, para não dizer fraco, da obra. Não chega a ser problemático ou algo do tipo, porém todos os probleminhas menores estão concentrados nele.
Mas não há como negar que o prazer real por trás de uma obra como “Pacific Rim: Uprising” é ver jaegers esbarrando em prédios e demolindo cidades quase sem querer. Fazer uma continuação e esquecer completamente do ingrediente principal do primeiro seria uma fidelidade desnecessária e ilógica ao final deste, sendo mais sensato não fazer nada se fosse para seguir uma abordagem tão destoante. Há lutas entre jaegers e kaijus — de algum jeito — e até entre jaegers e jaegers, uma alternativa inesperada que traz uma mudança bem vinda à fórmula anterior. E melhor, as cenas de ação são tão boas quanto, se não melhores que as anteriores. Mais robôs gigantes, habilidades novas e uma direção que não ignora os feitos anteriores de Guillermo Del Toro, consequentemente mantendo-se fiel às dezenas de filmes de kaiju dos Anos 50 para frente. Ver a cidade espatifando-se de um jeito tão descompromissado e fantástico é um prazer para além das espadas pegando fogo e os canhões de plasma, é um elemento que o “Godzilla” de 2014 abordou de uma forma mais realista e pouco apelativa. Mesmo com seus defeitos, os filmes japoneses mostravam um pouco de satisfação e diversão em destruir os cenários em miniatura tão minuciosamente construídos, algo que esta continuação faz ainda melhor com o poder da computação gráfica por trás de uma metrópole abundante em coisas que quebram.
Melhorando algumas coisas e piorando outras, “Pacific Rim: Uprising” posiciona=se um pouco abaixo de seu predecessor. Certos personagens exageradamente excêntricos e caricatos, os quais encarnam um avatar excessivo do humor típico de Del Toro, têm presença reduzida. Por outro lado, crianças são introduzidas na história, não chegando a infantilizar o filme demais nem caindo muito nos clichês toscos do poder da amizade, que ainda surgem na relação entre o protagonista e uma garotinha. Em suma, a história como um todo — enredo, personagens, tom, ritmo — é um retrocesso do que foi visto antes, deslize que acaba sendo amenizado por uma competência forte no quesito destruição total envolvendo robôs e monstros. Só não o bastante para chegar no mesmo nível de antes.