Essa é uma história de garoto conhece garota, mas não se engane, não é uma história de amor. É isso que o começo de “(500) Days of Summer” traz em seus estilizados créditos iniciais, dando uma prévia muito bem colocada do que vem pela frente: a história de uma expectativa frustrada de romance numa visão descontraída e divertida. Mas não foi exatamente essa entonação leve, ao meu ver, que deu um tom de originalidade e atraiu o público para esta história. Associar romance com descontração — comédia, em outras palavras — nada mais é do que a clássica Comédia Romântica. Qual foi o diferencial, então?
É simples: “(500) Days of Summer” consegue se colocar numa realidade mais próxima da audiência. Mais de uma vez, o narrador afirma que esta é uma história pós-moderna de romance. Além disso, os personagens são um tanto diferentes do padrão. Nada do homem no estereótipo galã, terno e apartamento em Nova York, junto da mulher independente, cuja convicção sobre a vida dura só até o momento em que o homem entra na jogada. Esta história traz personagens mais fáceis de simpatizar, gente que está começando a vida e ainda não sabe qual direção tomar — ou sabe e tem receio, como mostram. O garoto com cabelo bagunçado e roupas casualmente desarrumadas e a garota que se veste como uma boneca. É fácil o bastante sair por aí e ver gente como os dois em algum café da cidade, lendo Dostoiévski e escutando música Indie.
É seguindo essa linha que “(500) Days of Summer” se destaca: moderadamente realista, nunca demais para não bater de frente com o romantismo de seu protagonista. Tom Hansen (Joseph Gordon-Levitt) sempre quis ser alguém na vida, mas trabalha escrevendo cartões comemorativos. Um romântico nato que se apaixona perdidamente por Summer Finn (Zooey Deschanel), a garota incrível que aterrissou em sua vida. Bastou ela entrar na sala para ele imaginar todos os tipos de aventuras e ter certeza mais que absoluta de que era a garota de sua vida. Antes de rolar qualquer coisa, ele já terminou e se re-apaixonou várias vezes pelos motivos mais pirados. Mas a realidade finalmente prevalece e ele tem de lidar com a vida do jeito que ela é, não como ele imagina ou deseja que ela seja.
Um contraste se cria e se repete através da recorrência do tema da realidade contra fantasias projetadas em eventos e pessoas. A história de Tom pode até ser narrada por uma voz do além, mas não há dúvidas de que o ponto de vista dos eventos é seu. Os tais 500 dias não são apresentados um por um, faltaria tempo para isso, então vários deles são mostrados sem uma ordem aparentemente definida. Dia 290 corta para o Dia 3, depois para o Dia 158 e de volta ao começo com o Dia 22. Entre altos e baixos, Tom transmite perfeitamente como enxerga a vida em momentos que capturam o humor de ver alguém numa dimensão excêntrica chamada paixão. Ele está deslocado da vida real a ponto de achar sentidos subliminares e falar coisas absurdas como se o resto do mundo estivesse sintonizado em sua ilusão. Summer dar um bom dia pouco inspirado certamente significa que desencanou de Tom; o par de olheiras com certeza significa 36 horas de orgia num harém obscuro. “(500) Days of Summer” abre um caminho acessível e divertido aos pensamentos de Tom. Nunca foi tão fácil conhecer a sensação de pisar em nuvens e entender o que é estar deliciosamente apaixonado. O roteiro traz momentos que só quem já se apaixonou uma vez — todo mundo — sabe como é, materializa a sensação e coloca as distorções boas e ruins da realidade à disposição do espectador. Este pode até não concordar ou ser como o protagonista, mas ao menos vai experimentar um pouco do que é perder os freios quando alguém incrível aparece.
Admito que pensei em criticar a falta de ênfase nas partes ruins do relacionamento. Havia sentido falta de motivos para o dois terminarem — algo que acontece nas primeiras cenas. Foi escrevendo essa análise que percebi que não há erro algum nisso. Se é o protagonista quem está lembrando da vida num fluxo de consciência, sem respeitar a ordem cronológica das idéias e muito parcial às coisas boas, então faz todo o sentido que ele favoreça os momentos bons com Summer. Isso leva a um ponto interessante: talvez tenha faltado uma transição entre estágios passados pelo casal. Não necessariamente término e início de relacionamento, pois a história vai além disso. Penso que os momentos finais apelarem para uma saída mais simples estragam muitos dos sucesso vistos antes, especialmente a originalidade. Os vários momentos criativos e engraçados permanecem intocados, mas sem uma conclusão apropriada a história como um todo se prejudica.
Para uma narrativa aparentemente complexa, cheia de vai e volta, é curioso como ela consegue ser previsível. Dizer que isso se aplica à progressão toda é pretensioso, além de impossível. Os retornos e avanços trazem diversas surpresas, porém a história como um todo ainda parece muito familiar. Não é pelo modelo garoto conhece garota, a trama até tem uma virada inesperada e ainda assim não consegue evitar um ar de clichê. O carisma dos dois protagonistas não faz decisões pobres valerem a pena. É justamente o contrário, as viradas em suas personalidade são tão súbitas que me perguntei onde as pessoas do começo foram parar. Não é uma questão de se apegar aos personagens do começo. Não sou contra o desenvolvimento deles contanto que este exista na história. Senti que o clímax de “(500) Days of Summer” foi especialmente carente disso, apenas saltaram de um ponto ao outro.. Houve muitos dias de verão sem uma transição visível para outono.
Depois de tanta gente compartilhando imagens, vídeos e gifs sobre o filmes, dizendo que é uma Comédia Romântica que se destaca entre tantas outras, devo dizer que esperava um pouco mais. Realmente, “(500) Days of Summer” acerta numa representação incrivelmente colorida do que é amar e estar apaixonado, aproveitando a deixa que seu título dá para ir e voltar na cronologia despreocupadamente. Faltou um desfecho adequado para esta história despretensiosa e fácil de acompanhar.