Quando foi anunciado que a série de jogos “Warcraft” seria adaptada para o Cinema houve um certo temor, pelo menos por parte de quem joga videogame. Adaptações de jogos no cinema não têm um histórico muito bom, embora algumas sejam realmente legais. Do universalmente abominado “Super Mario Bros.” em 1993 ao mais recente fracasso de “Hitman: Agent 47”, é difícil manter as expectativas muito altas. Mas a Blizzard Entertainment, desenvolvedora dos jogos, tem certa fama de passar longe de decisões ruins, então alguma esperança havia. Se o sucesso aqui for medido em dólares, realmente a Blizzard pode ter acertado; caso o objetivo tenha sido a aclamação crítica, aí as coisas complicam.
Azeroth é um reino de paz, mas não por muito tempo. A estabilidade construída por humanos e outras raças é ameaçada por uma horda de orcs, que fogem de sua terra moribunda para conquistar território. Pegos de surpresa, os humanos devem se organizar como podem para enfrentar uma nova raça que resolve seus problemas com guerra. Um lado foge para evitar a extinção, o outro apenas tenta sobreviver contra um novo inimigo muito poderoso.
Jogar é algo que faz parte do meu dia-a-dia há vários anos, mas, francamente, nunca tive muito contato com a série “Warcraft”. Até cheguei a jogar um dos jogos e me familiarizar levemente com o MMORPG “World of Warcraft”, o que já é o bastante para saber que o universo da série é gigantesco. Transformar isso em filme acaba resultando em alguns acertos e vários problemas. Uma decisão boa foi não perder tempo explicando todo e qualquer aspecto de Azeroth, como as coisas funcionam lá. Logo de cara o espectador descobre que aquele é um mundo onde mágica é normal, onde grifos voam por aí e cidades flutuam no céu. Tudo bem, acredito que ninguém queria uma aula de introdução a Warcraft, então realmente não há do que reclamar. Aliás, “Warcraft” ao menos serve como um belo despertar de curiosidade. Devo admitir que o filme me deixou interessado por maiores detalhes daquele mundo e acredito que outros espectadores possam sentir o mesmo — o que talvez seja o real objetivo da Blizzard com este filme.
A ação é onde as coisas começam a decair. A infame guerra entre humanos e orcs não fica só na promessa, rendendo bons frutos e boas cenas de ação, no geral. Aqueles que jogaram ou tiverem contato ficarão especialmente satisfeitos em ver seu jogo de visão isométrica de perto, ao passo que o resto da audiência aproveitará tudo aquilo como um pouco da força bruta dos orcs contra a esperteza e maior agilidade dos humanos. Mesmo que legal em sua maior parte, a ação não é exatamente convincente. Pode ser algo pessoal, mas acredito que: ou a caracterização dos orcs ficou agressiva demais, ou a dos humanos ficou pouco imponente. Talvez a direção de arte tenha se empolgado com os efeitos especiais e decidido transformar as criaturas em montanhas de músculos digitais, difícil dizer a razão. De qualquer forma, fica bem claro qual dos lados está em desvantagem, tornando especialmente complicado acreditar que um monstro enorme perderia para um humano de 70kg. Felizmente, a qualidade da computação gráfica nestes personagens é decente, ainda que em outras coisas não seja. Não são efeitos de última geração. Este é o exemplo de filme em que os visuais não estão ali para apreciação, apenas em quantidade o bastante para os olhos se acostumarem.
Meu problema com “Warcraft” está no roteiro. Como dito, fazem bem ao não explicar todo e qualquer fenômeno de Azeroth. Por outro lado, parece que os roteiristas escreveram sua história enquanto andavam em gelo fino. Não explicam o que não diz respeito à trama ao mesmo tempo que se prendem a clichês e artifícios expositivos cada vez que tentam se aprofundar naquele universo. Colocam personagens falando bobagem atrás de bobagem como se houvesse algum receio de explorar o enredo, como se o espectador fosse incapaz de entender — ou até sentir — o básico de contar uma história. Explicam táticas simples de guerra e fazem questão de delinear detalhes que normalmente ficam no segundo plano — como o significado de alguma ação e até a moral da história, se posso dizer. Não posso falar que este é um filme rico em sub-texto, mas acredito que é inegável dizer que até a história mais simples tem algo a dizer além do óbvio; essa semântica secundária nem sempre é boa, entretanto, e fica ainda pior quando é esfregada na cara do espectador. Piora quando recorrem à riqueza do universo para resolver todo e qualquer problema proposto pelo enredo. Não importa qual seja a ameaça, sempre existe alguém que ouviu falar do problema em algum lugar. Há algum reino ou entendido do assunto para auxiliar naquelas questões, chegando algumas vezes ao clássico deus ex machina para acabar com as piores enrascadas. O resultado é um roteiro extremamente linear. Tudo é muito causal, fica muito claro que uma coisa leva a outra e que o resultado lá na frente não foi uma soma de fatores complicantes, e sim consequência direta de apenas uma razão.
Pelo tanto que falaram mal de “Warcraft”, estava esperando um dos piores filmes dos últimos anos. Felizmente — não muito — o resultado não é tão péssimo como foi dito por aí. A obra tem vários erros crassos que barram este longa de ser uma adaptação de um jogo digna, se posso dizer, especialmente no elemento mais importante: o roteiro. Outros probleminhas aqui e ali podem incomodar, mas acredito que estes sejam mais digeríveis que a história simplificada e até emburrecida que é entregue.