Em pleno 2016, cerca de 129 anos após a primeira aparição de Sherlock Holmes no mundo, o personagem de Sir Arthur Conan Doyle mostra sua imortalidade ao continuar popular entre o público em geral, além dos fãs de clássicos. Desde 2010, fãs de seriados de televisão se satisfazem com a aclamada adaptação da BBC, que coloca os conhecidos personagens num contexto moderno. Enquanto o personagem teve destaque no Cinema em dois longas estrelados por Robert Downey Jr. Mas voltando para 1985, Barrry Levinson já havia tentado mudar o clássico personagem com “Young Sherlock Holmes”.
O título já é bem explicativo e ilustra a idéia principal deste longa metragem. Essencialmente, são os mesmos personagens na mesma época, só que um tanto mais jovens que suas contrapartes originais. Demorei um bom tempo para ver este filme, por mais que tivesse sido recomendado por um colega. Por quê? Talvez por ter achado a idéia de um Sherlock jovem meio boba, mas fico feliz por eventualmente ter dado uma chance e visto que estava enganado. Não é uma reimaginação gratuita, que se apoia em gigantes da literatura para chamar a atenção, e sim um trabalho que realmente parece ter sido feito por paixão. Como algumas vinhetas do próprio longa sugerem, esta é a revisão de um universo tradicional que procura demonstrar a afeição da produção por todo o trabalho de Conan Doyle.
Ao contrário do que é sugerido em “Um Estudo em Vermelho”, a primeira história do detetive, o filme mostra como as coisas teriam sido se Sherlock Holmes tivesse conhecido John Watson em seu tempo de escola. O jovem Watson (Alan Cox) é um garoto que quer seguir carreira médica, assim como seu pai, e se vê mudando de escola quando a instituição em que ele estudava fecha as portas. Quase imediatamente após colocar os pés na escola, ele encontra um rapaz frustrado com seu violino por não dominá-lo depois de longos três dias desde que começou a tocar. Este cara estranho é ninguém menos que Sherlock Holmes (Nicholas Rowe). Em meio à rotina escolar, uma série de mortes sob circunstâncias bizarras chamam a atenção de Sherlock, que já é bem conhecido na escola por sua inteligência. As mortes por si não têm nada demais, com exceção de algumas incoerências que deixam a intuição de Holmes inquieta e o levam a investigar junto de seu novo parceiro.
Embora a trama gire em torno de um mistério e trate da juventude de um grande detetive, este não é um filme de Suspense ou focado em mistério. A dinâmica dos eventos está muito mais para um filme de Aventura com adolescentes nos papéis principais, uma mistura de “Os Goonies” com o Indiana Jones jovem de “Indiana Jones and the Last Crusade“. Em mais de uma ocasião falam que aquela é uma aventura para uma vida toda e tinham razão! O roteiro não está preocupado em exaltar a inteligência de Holmes através de embates intelectuais ou de uma investigação complexa; é uma grande aventura traduzida em termos mais simples, um mistério a altura do intelecto ainda não polido de Sherlock. Não daria para ter algo muito sério num filme como esse, então usa-se essa genialidade espontânea — se posso chamar assim — em uma história cujos problemas são mais curiosos que complexos. Todos são feitos para serem resolvidos de maneira esperta em vez de intelectual.
Nada amaciado a ponto de ficar simplista, apenas uma trama sólida e aberta para a diversão. Os efeitos especiais, que misturam perfeitamente efeitos práticos com digitais, ajudam a criar este clima fantástico e, de bônus, são o perfeito exemplo de como uma técnica bem aplicada mantém seu charme com os anos. Não só bonitos, eles chamam a atenção por serem usados de maneira realmente criativa. São situações únicas por serem absurdas na medida certa e que contam com a trilha sonora para dar um toque épico. Assim, morre qualquer chance de momentos bizarros — como um vitral ganhar vida e atormentar uma vítima — serem considerados bobalhões demais.
No entanto, o mesmo toque “Indiana Jones” que tornou as coisas interessantes em outro momento traz um lado ruim ao jogo: assim como em “Raiders of the Lost Ark“, é difícil levar a sério muito do que é coadjuvante. Claro, não digo sério num sentido de seriedade literal. Quero dizer que até um conteúdo leve deve ser bem executado se quiser funcionar de verdade. A entonação de “Young Sherlock Holmes” é clara no sentido de não se prender muito a detalhes, ou seja, não se apoia na dedução mirabolante do protagonista para resolver problemas. Sendo assim, muita coisa acaba solucionada de forma simples; revelações simplesmente acontecem sem incomodar porque faz sentido dentro daquela história. Por outro lado, senti que em alguns momentos “Young Sherlock Holmes” perde o controle e se torna um tanto bobalhão. Assim como alguns oponentes de Indiana jones, os antagonistas daqui não são a definição de figuras fortes ou ameaçadoras. Eles mais parecem um bando de não atores contratados para não atuar num filme que precisava de gente. Isso quebra um pouco do tal clima leve bem estabelecido até então, podendo fazer o espectador repensar algumas colheres de chá dadas antes.
Se não fosse isso, acho que “Young Sherlock Holmes” seria melhor visto pela audiência. Nem na época, nem hoje ela mantém o filme em uma estima exatamente boa. Particularmente, gostei do que vi. É a reinterpretação de um material com mais de 100 anos, que funciona bem não apenas por si, mas também por respeitar suas raízes e não estragar o legado de seu material-base.